Minha mãe foi casada cinco vezes.
Um jornalista. Um economista. Um baterista do Raul Seixas. Um físico nuclear. Um artista plástico.
Na casa do marido economista, conheci a Conceição Tavares.
Uma vez por semana, ela chegava, sentava no sofá, acendia um cigarro, pegava o copo de uísque e começava a falar. Pelos cotovelos.
Pra mim, aquela portuga falava chinês. Boiava total.
No verão de 1990 eu tinha 17 anos e ainda cursava a oitava série.
Se tinha dificuldades com o bê ao quadrado menos quatro acê, imagina para entender o economês da época.
Uma cena e uma frase naquele sofá nunca saíram da minha cabeça.
A Conceição Tavares com o dedo na cara de uma loira dentuça, gritando:
– Você vai é fuder com os pobres!!
– Você vai é fuder com os pobres!!
E um tiozinho de óculos, tentando evitar que a portuga batesse na dentuça.
Muitos anos depois, me dei conta que a dentuça era ninguém menos que a então Ministra Zélia Cardoso de Mello, responsável pelo pacote econômico batizado de Plano Collor - que, entre outras barbaridades, determinou o bloqueio das cadernetas de poupança.
O tiozinho: João Manuel Cardoso de Mello, primo da ministra da Fazenda e cunhado do meu padrasto.
Passaram-se 35 anos.
Fui entrevistar a portuga do sofá para o Valor, no apartamento dela.
E com quem ela falava, por telefone, aos berros?
Fernando Haddad.
“Ô Bonitão, os brasileiros estão morrendo de fome!!! . Déficit zero de cu é rola! ”
Parece história de pescador, mas não é. Desde que comecei na profissão, com 17 anos, presencio momentos assim.
Foi pra mim, num encontro com um amigi em comum, Marcelo Yuka, que Mariele contou pela primeira vez que estava sendo ameaçado de morte por Carlos Bolsonaro, seu colega de câmera.
Deve ser sorte. Ou azar.
Maria da Conceição Tavares é personagem do meu livro “Vida de Gado - 30 anos pastando no jornalismo”, separado por verbetes de entrevistas que fiz e tentei fazer.
Quem quiser comprar diretamente com o autor é só dar um alô.
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