News 03 0411
NEWS - 04.11
Lula se reúne hoje com Haddad e Rui Costa para discutir corte de gastos; veja medidas / Previdência deve ficar fora de limite para crescimento de despesas obrigatórias. Ministro cancelou viagem para trabalhar em pacote, após disparada do dólar - Um dos pontos que será discutido é uma forma de enquadrar certas despesas obrigatórias no limite de crescimento de gastos previsto no arcabouço fiscal, de até 2,5% acima da inflação. Segundo fontes, porém, despesas com Previdência devem ficar fora desse limite. O presidente Lula ainda avalia se o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, entrará nessa conta.- O Globo 4/11
Eliane Oliveira / Bruno Rosa / Manoel Ventura
Após pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diante da disparada do dólar, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, cancelou a viagem que faria à Europa e vai se dedicar à agenda de corte de gastos. Ele se reúne hoje com Lula e com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, e deve tratar do assunto.
Um dos pontos que será discutido é uma forma de enquadrar certas despesas obrigatórias no limite de crescimento de gastos previsto no arcabouço fiscal, de até 2,5% acima da inflação. Segundo fontes, porém, despesas com Previdência devem ficar fora desse limite. O presidente Lula ainda avalia se o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, entrará nessa conta.
Mesmo que o benefício não seja enquadrado no limite de despesas, um projeto com novas regras para sua concessão e manutenção está sendo elaborado, com exigências de prova de vida, reconhecimento facial e biometria. O objetivo é evitar fraudes. Também está sob análise aumentar de 30% para 60% a parcela do Fundeb que conta para o piso de gastos com educação. Devem entrar no piso emendas parlamentares para o setor e o programa Pé-de-Meia.
Como O GLOBO mostrou na semana passada, na lista de alívio nas despesas obrigatórias também está a desobrigação de execução dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que chegarão a R$ 10 bilhões em 2025. ProAgro e seguro-defeso também deixariam de ser despesas obrigatórias. Além disso, mudanças no seguro-desemprego e no abono salarial do PIS/Pasep estão sendo considerada.
Haddad tinha embarque marcado para a Europa na tarde de hoje e voltaria apenas no sábado. Ele passaria por Paris (França), Londres (Reino Unido), Berlim (Alemanha) e Bruxelas (Bélgica), onde se reuniria com autoridades e conversaria com investidores.
Há duas semanas, a equipe econômica vem intensificando as discussões sobre o pacote de corte de gastos, depois de sinalizar que ele seria anunciado após as eleições de outubro. Por conta da incerteza quanto às propostas e a própria ida do ministro para a Europa, o dólar encerrou a sexta-feira valendo quase R$ 5,87, maior patamar desde maio de 2020. No ano, a moeda acumula valorização de 21%.
Volatilidade do câmbio
O ministro já vem buscando apoio de parlamentares para aprovação do pacote de gastos. Em encontro com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e senadores, na última quinta-feira, defendeu medidas para facilitar a gestão das despesas do governo de forma a estabilizar a dívida e fortalecer o arcabouço fiscal.
Haddad já disse que será necessária uma proposta de Emenda à Constituição (PEC) para avançar com as propostas. Para isso, o governo deve aproveitar uma PEC que prorroga um mecanismo chamado de Desvinculação de Receitas da União (DRU), já em tramitação, para “acoplar” as ações de corte de gastos.
Em seu formato atual, a DRU permite que o governo gaste livremente 30% das receitas com contribuições e taxas vinculadas a despesas e órgãos. O mecanismo existe há décadas e vem sendo prorrogado porque ajuda na gestão do caixa do governo — embora não seja, hoje, um instrumento para cortar gastos.
Ontem, após visitar a sala de monitoramento do Enem, Lula foi perguntado sobre o corte de gastos e o cancelamento da viagem de Haddad, mas se negou a responder:
— Não vou discutir nenhum assunto que não seja educação (...). Nem mais nada. Nem EUA, nem Venezuela, nem Nicarágua, nem Rússia, nem China — disse Lula, que também foi indagado sobre a crise entre Brasil e Venezuela.
Para especialistas, o cancelamento da viagem de Haddad representa uma sinalização positiva sobre a preocupação do governo com o corte de gastos, mas coloca pressão para que o ministro entregue um pacote fiscal coerente com as necessidades do país.
— Não adianta nada ter cancelado a viagem e não apresentar nada. O mercado está sedento por informações sobre a questão fiscal, até porque ele precisa dessa previsibilidade. É importante que o corte de gastos seja alinhado com as expectativas e que tenha coerência com 2024 e, principalmente, com 2025. Sem isso, o mercado pode se estressar ainda mais. Não dá para descartar a possibilidade de um dólar a R$ 6 — afirma Jefferson Laatus, estrategista-chefe do Grupo Laatus.
Os analistas se dividem quanto ao comportamento do dólar no curto prazo, em meio às eleições americanas. Para o economista Istvan Kasznar, da Fundação Getulio Vargas, pode haver mais volatilidade.
— O dólar pode subir, e já está em alta não apenas por este motivo (adiamento do corte de gastos), mas pela insegurança institucional e pelas evidências de um governo que se fragilizou demais com as últimas eleições. É provável que o mercado interprete essa sinalização como instabilidade, e a volatilidade cambial deverá continuar.
Ele reconhece que o cancelamento da viagem de Haddad indica mudança de prioridade, mas ressalta que é preciso ter clareza sobre a reforma fiscal. Já para Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio, um compromisso concreto do governo com a agenda de corte de gastos pode aliviar a pressão sobre a moeda americana.
— Ao permanecer no Brasil, Haddad transmite sinal de prioridade para temas econômicos domésticos, o que pode gerar um efeito positivo imediato sobre o dólar, reduzindo a volatilidade da moeda.
Veja quais as medidas em estudo pela equipe econômica para cortar gastos / Governo prepara PEC para poder remanejar o orçamento, acalmar o mercado e conter dívida pública- Folha SP 3/11
Adriana Fernandes
Para acalmar o mercado e investidores externos, o governo federal prepara uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) com medidas de cortes de gastos. O assunto não é consenso entre os apoiadores do presidente Lula, contrários a ideias de redução de investimentos e pessoal.
Parte dos analistas vê resistência do próprio Lula a esta agenda. Em visita ao Inep (Instituto Nacional de Pesquisa Educacionais) neste domingo (3), ele se recusou a comentar o assunto.
Na última sexta-feira (1º), o dólar chegou a R$ 5,869, o maior patamar desde maio de 2020, nos primeiros meses da pandemia de Covid-19.
Em encontro com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad buscou apoio para à PEC que ainda está em elaboração. Haddad defendeu a necessidade de uma medida que autorizasse o remanejo do orçamento para estabilizar a trajetória da dívida pública e mostrar ao mercado o compromisso do governo com a questão fiscal.
O ministro cancelou viagem à Europa para se concentrar nas medidas a serem anunciadas.
Veja abaixo as medidas em estudo pela equipe econômica:
LIMITE E GATILHO
Um limite global para as despesas obrigatórias, que seguiria o mesmo índice de correção do arcabouço fiscal (expansão de até 2,5% acima da inflação ao ano) com gatilhos de correção, como revelou a Folha. Caso os gastos obrigatórios (exceto benefícios da previdência) avancem acima desse patamar, os gatilhos seriam acionados para ajudar a manter a trajetória de despesas sob controle. As medidas de ajuste em estudo pelo governo poderiam compor a lista de gatilhos ou ser implementadas de forma avulsa. É possível também combinar ambos os formatos. Não está previsto gatilho para a política de salário mínimo, que hoje garante uma correção acima da inflação.
FUNDEB
Aumento de 30% para 60% da parcela dos recursos do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) que é contabilizada no piso constitucional da Educação. A chamada complementação ao Fundeb –abastecido por uma combinação de recursos federais, estaduais e municipais– é uma obrigação da União quando os demais entes não atingem determinados indicadores financeiros estabelecidos, que incluem um valor anual por aluno. Contabilizar um valor maior para esse fim poderia, em tese, reduzir a pressão para atingir o piso da educação com o espaço das despesas discricionárias. A Fazenda quer incorporar os gastos do programa pé-de-meia na complementação do Fundeb.
FNDCT
Desobrigar a execução dos recursos do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), hoje obrigatória. Pela regra atual, os recursos do fundo não podem ser bloqueados. Para 2025, o orçamento é de R$ 10,3 bilhões —R$ 4 bilhões a mais que o previsto para este ano. Sem a obrigação, o governo teria espaço para reduzir despesas.
SEGURO-DESEMPREGO
É uma das principais medidas estudadas. Uma das propostas prevê descontar das parcelas do benefício o valor da multa sobre o FGTS. A avaliação é que, quanto maior o salário do trabalhador, maior tende a ser seu saldo no fundo de garantia e, consequentemente, o valor da multa —que seria abatido das parcelas, segundo a proposta.
SUPERSALÁRIOS
A ideia é buscar um acordo no Congresso para aprovação do projeto de lei que regulamenta os supersalários para limitar a poucas exceções (conhecidos como penduricalhos) o pagamento fora do teto remuneratório do funcionalismo, que tem como base o salário dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), atualmente em R$ 44 mil. O projeto que tramita no Senado contém 32 exceções, o que pode tornar a proposta inócua. Os penduricalhos se somam aos vencimentos dos servidores e acabam permitindo o pagamento dos salários em valores muitos superiores ao teto.
ABONO SALARIAL
Redesenhar o abono salarial (espécie de 14º salário concedido ao trabalhador com carteira assinada que ganha até dois salários mínimos). A proposta é fazer com que a regra de concessão seja a renda familiar per capita e limitar o benefício a um por família.
BPC E AUXÍLIO-DOENÇA
Novas medidas de aperto nas regras de acesso ao BPC (Benefício de Prestação Continuada), concedidos à pessoas com deficiência e idosos com mais de 65 anos de baixa renda, e do auxílio-doença.
SEGURO-DEFESO
Criação de um limite para os gastos com o seguro-defeso, benefício pago a pescadores artesanais durante o período em que a atividade é proibida para preservar a reprodução dos peixes. Em seu formato atual, a política é uma despesa obrigatória, vinculada ao salário mínimo (hoje em R$ 1.412), e quaisquer pessoas que preencham os requisitos têm o benefício concedido. A ideia é propor uma lógica semelhante à do Bolsa Família: o programa tem um orçamento definido, e se o número de pedidos for maior que o espaço fiscal, forma-se uma fila de espera. Novas concessões só são feitas quando há recursos disponíveis.
PROAGRO E SUBSÍDIOS
Medidas para diminuir subsídios com custos previstos no Orçamento. Entre eles está o Proagro, seguro rural voltado a pequenos e médios produtores. O aperto recente feito nas regras é considerado insuficiente. A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, defende uma nova regra para cortar por ano uma parcela dos chamados gastos tributários (incentivos tributários).
PISOS DE SAÚDE E EDUCAÇÃO
O presidente Lula é resistente à mudança nos pisos constitucionais de saúde e educação, que impõem uma aplicação mínima de recursos nas duas áreas. Mas uma ala da equipe econômica ainda vê uma janela para aprovação da medida, com apoio dos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (AL-PP). Por outro lado, outra ala do governo considera essa mudança mais difícil, já que ela tem pouco impacto no curto prazo e elevado custo político para sua aprovação. Gatilhos de desindexação, que imponham uma correção menor (apenas pela inflação) a políticas hoje vinculadas ao salário mínimo, também são considerados difíceis de avançar.
DRU
Prorrogar a DRU (Desvinculação de Receitas da União). O instrumento, que hoje permite ao governo usar livremente 30% das receitas com impostos e taxas vinculados a despesas, acaba no final deste ano. Há uma discussão no governo para fazer uma DRU transitória sob novos termos, que permita remanejar os recursos carimbados para a área de saúde e educação, que hoje estão blindados.
Lula pediu a Haddad que cancelasse viagem para evitar “mundo da especulação” / Avaliação do governo veio após dólar renovar máximas e chegar a maior patamar desde pandemia, fechando em R$ 5,87 na última sexta-feira (1º)- CnnBrasil 3/44
Cristiane Noberto / João Nakamura
O pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ficasse em Brasília foi para evitar “o mundo da especulação”, segundo um ministro próximo ao chefe do Executivo, ouvido pela CNN.
Haddad estava com viagem marcada para a Europa durante toda a próxima semana e só retornaria a Brasília no dia 11 de novembro.
O roteiro do ministro aconteceria em meio à volatilidade no mercado, que espera por um pacote de cortes de gastos robusto e eficiente desde o meio do ano. A avaliação do governo veio após o dólar renovar as máximas e chegar ao maior patamar desde a pandemia, fechando em R$ 5,87 na última sexta-feira (1º).
Segundo o auxiliar do presidente, a prioridade é fechar essa proposta, “se não fica o mundo da especulação”.
Embora tenha dado a ordem para manter o ministro da Fazenda em Brasília, debruçado sobre o texto, Lula não quis comentar a decisão.
Após visitar as instalações da sala de monitoramento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) neste domingo (3), o presidente foi questionado sobre o pacote e se limitou a dizer que não comentaria nenhum assunto além de educação.
“Eu não vou discutir nenhum assunto que não seja educação. Mais nada. Nem Estados Unidos, nem Venezuela, nem Nicarágua, nem Rússia, nem China. Hoje é Enem”, disse.
A pressão dos agentes de mercado e investidores começou a ser intensificada em agosto, quando Haddad e a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, passaram a dizer que apresentariam um projeto para dar sustentabilidade ao arcabouço fiscal.
Na época, Tebet disse que Haddad teria planos de “A a Z” para endereçar o assunto e que seriam apresentados em momentos oportunos.
Naquele mês, a equipe econômica chegou a apresentar um projeto de revisão de gastos para 2025, que mira especialmente a Previdência Social, Bolsa Família e remanejamentos orçamentários em ministérios, cuja expectativa de retorno é de R$ 25,9 bilhões. Mas para o mercado, não é suficiente para mostrar o compromisso do governo com a regra das contas públicas em vigor.
Em entrevista à imprensa na semana passada, Haddad chegou a dizer que “entende a inquietação do mercado”, mas que “tem gente especulando em torno de coisas”.
Em outro momento, após reunião da Junta de Execução Orçamentária (JEO), que reúne ministros que tomam decisões sobre o orçamento, Haddad disse que já estava uma “forçação boba” a quantidade de questionamentos da imprensa sobre a questão.
Haddad busca apoio
A primeira reunião oficial para apresentar as novas medidas para o presidente Lula aconteceu na semana passada e contou com Haddad e seus secretários, além do ministro da Casa Civil, Rui Costa e do futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo.
Na ocasião, o ministro afirmou que foi possível chegar a uma “convergência” com a Casa Civil, no intuito de apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com as medidas estruturais. Segundo ele, também há “consenso” no governo sobre o crescimento das despesas.
“A dinâmica das despesas obrigatórias tem que caber dentro do arcabouço. A ideia é fazer com que as partes não comprometam o todo que o arcabouço tem, a sustentabilidade de médio e longo prazo”, disse na ocasião.
Agora, além de redigir o texto, Haddad também precisa do cálculo político com o Congresso Nacional, já que parte das medidas que estão sendo pensadas também afetam emendas parlamentares.
Na última quinta-feira (31), o ministro foi à Residência Oficial do Senado para conversar com o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e outros senadores sobre a regulamentação do mercado de carbono, que deve ser votada essa semana.
Segundo interlocutores presentes na ocasião, Haddad aproveitou o momento para falar aos parlamentares sobre a proposta do governo que será encaminhada.
O senador Efraim Filho (União-PB) disse que os parlamentares presentes disseram ao ministro que o corte de gastos é “um tema importante para endereçar a preocupação com a responsabilidade fiscal e as ações do governo” e que Haddad vai “avançar em uma alternativa nesse sentido”.
Já a própria articulação do governo com os parlamentares só deve começar quando a proposta estiver “concreta”.
Com Haddad em Brasília, equipe econômica deve “acelerar” pacote de cortes de gastos nesta semana / O ministro ainda deve apresentar a proposta final do presidente Lula antes delas serem, de fato, confirmadas- CnnBrasil 4/11
Cristiane Noberto / João Nakamura
O cancelamento da viagem do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, à Europa nos próximos dias vai dar uma pressão adicional para que a equipe econômica “acelere” a proposta do pacote de cortes de gastos nesta semana, segundo interlocutores do chefe da pasta.
Apesar de se manter cauteloso quanto às medidas e, por vezes, não confirmar o que vem sendo ventilado em bastidores, a expectativa é de que o chefe da equipe econômica comece a dar mais pistas do que está por vir.
O ministro ainda deve apresentar a proposta final de Lula antes dela ser, de fato, confirmada. Nesta segunda-feira (4), Haddad também se encontra com o presidente no Palácio do Planalto, às 9h, e o assunto tende a estar na mesa.
Ainda assim, a notícia de que Haddad vai ficar em Brasília debruçado nas propostas fiscais dividiu economistas ouvidos pela CNN.
Para o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, a decisão de evitar uma viagem internacional em um momento sensível para as contas públicas foi acertada.
À CNN, ele reforçou que, nesse contexto, a presença do ministro da Fazenda ao lado do presidente da República é essencial para discutir medidas que promovam a estabilidade econômica. Para ele, a decisão era esperada e se alinha ao bom-senso, dado o cenário desafiador.
“Desde a Constituição de 88, todas as medidas de ajuste fiscal foram de natureza temporária. À medida que a rigidez piora, demanda medidas que ataquem a causa. Mas nunca há ambiente para isso. Apenas há suspensão de alguns gastos, mas nada definitivo. Acho meritório o trabalho da equipe econômica, as coisas só não avançam nesse sentido estrutural por conta de resistências no PT e no governo. A ausência do ministro nesse momento seria equivocada. O mercado vinha criando esperança.”
Segundo o estrategista-chefe do grupo Laatus, Jefferson Laatus, o cancelamento da viagem foi uma resposta ao “recado do mercado”, mas que isso deve vir com ações concretas para ter o alívio esperado e duradouro.
“O mercado está sedento por informações sobre a questão fiscal. O mercado precisa dessa previsibilidade para fazer preço. Não adianta nada cancelar a viagem sem apresentar nada concreto. Se o pacote fiscal não vier com o rigor esperado e com coerência a longo prazo, a situação pode piorar. O dólar pode até chegar a seis reais”, afirmou.
Porém, o recuo teria vindo tarde demais para José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.
Em meio a esse cenário de expectativa do mercado pelas medidas de contenção, Camargo aponta para uma “total desconsideração com a economia brasileira” por parte do ministro da Fazenda.
“Quanto ao pacote, melhor esperar para ver o que vai sair. Não estou otimista. Seria necessário algo como controle de gastos sociais ou mudança na política do salário mínimo. Algo realmente forte. Mas, minha avaliação é bem negativa”, pontua o economista-chefe da Genial Investimentos.
Na terça-feira (29), Haddad havia sinalizado que o prazo de envio para as medidas estava em aberto, e que a definição do pacote dependia do aval de Lula.
Sem dar detalhamentos sobre o que está por vir, o ministro voltou a ser questionado no dia seguinte sobre a contenção de gastos, ao que criticou ser uma insistência “boba” do mercado e da imprensa.
Mesmo com o cancelamento da viagem, o mercado segue no escuro e vivendo essa tensão pré-revisão de despesas.
Desse modo, apesar de ter algum alívio com a decisão de Haddad ficar no Brasil, nada muda entre os investidores, que seguem em alerta até “o anúncio de fato do pacote”, segundo Paulo Gala, professor da Fundação Getúlio Vargas e economista-chefe do Banco Master.
Viagem cancelada de Haddad não basta para tranquilizar mercado e frear dólar, dizem analistas / Economistas consideram que permanência do ministro até traz sinal positivo, mas cenário ainda depende de anúncio de ajuste fiscal- Folha SP 4/11
Leonardo Vieceli
O cancelamento da viagem do ministro Fernando Haddad (Fazenda) à Europa não deve ser suficiente para acalmar sozinho o mercado financeiro e provocar uma grande queda do dólar nos próximos dias, dizem economistas consultados pela Folha.
Segundo eles, a permanência de Haddad no país até traz uma sinalização positiva para o andamento do pacote de ajuste fiscal, mas a melhora do humor do mercado ainda depende do anúncio de medidas concretas que possam promover a redução de gastos.
Parte dos analistas ainda vê resistência no entorno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em levar adiante essa agenda.
Os economistas também afirmam que a desvalorização do real ante o dólar está atrelada em grande parte a incertezas das eleições presidenciais nos Estados Unidos, algo fora da alçada do governo brasileiro.
Na sexta (1º), a moeda americana disparou a R$ 5,869, o maior patamar desde maio de 2020, período marcado pela pandemia de Covid-19.
"Depois de quase dois anos de uma situação fiscal muito mal-encaminhada, é difícil imaginar que o mercado vai se acalmar porque o presidente [Lula] pediu para o ministro [Haddad] ficar aqui", diz Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.
"Acalmar o mercado é algo que vai acontecer se vierem medidas realmente importantes do ponto de vista fiscal", acrescenta.
Haddad iria para a Europa nesta segunda (4) e retornaria ao Brasil no sábado (9). Porém, com o cancelamento da viagem, a expectativa é de que o ministro se dedique a medidas do pacote de corte de gastos.
A assessoria do Ministério da Fazenda informou neste domingo (3) que Lula pediu para o ministro permanecer em Brasília.
"Havia uma certa clareza de que o Palácio do Planalto tinha uma resistência muito grande em fazer alguma coisa mais consolidada do ponto de vista fiscal", afirma Vale.
"Então, simplesmente o Haddad ficar aqui para continuar as conversas não significa que o presidente vai ceder", completa.
Lula se recusou a falar sobre a definição das medidas do pacote de corte de gastos neste domingo, em visita ao Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais).
Questionado sobre o tema, o presidente disse que não iria discutir nenhum assunto que não fosse sobre educação, referindo-se à prova do Enem 2024, que tem a primeira parte neste domingo.
Alex Agostini, economista-chefe da agência classificadora de risco Austin Rating, considera que a permanência do ministro não é suficiente para afastar toda a preocupação do mercado financeiro, porque o foco neste momento é a incerteza com as eleições nos Estados Unidos.
"Só demonstra que de fato é uma preocupação que o governo começa a ter com maior foco, coisa que aparentemente não tinha, até porque o Lula sempre ficava ali desdenhando do controle fiscal. Era meio que uma seara em que o ministro Haddad estava tentando brigar quase sozinho", diz Agostini.
"Parece que caiu a ficha no governo federal de que, de fato, a gente vai sofrer muito se tiver essa desvalorização contínua [do real]. Agora é esperar para ver quais são as medidas", acrescenta.
A economista Juliana Inhasz, professora do Insper, também ressalta que a pressão na taxa de câmbio está associada em parte a questões fora do alcance do governo brasileiro, como as eleições americanas.
Pesquisas de intenção de voto indicavam empate técnico entre Donald Trump e Kamala Harris na corrida eleitoral dos Estados Unidos. No mercado de apostas, porém, as chances de um retorno do republicano à Casa Branca marcavam 66%, segundo a plataforma Polymarket.
As promessas econômicas de Trump incluem aumento tarifário sobre importações, especialmente chinesas, e um possível corte de impostos —medidas que são vistas como inflacionárias e que podem influenciar o Fed (Federal Reserve) a manter juros elevados por mais tempo, o que fortaleceria o dólar.
"Ainda que o mercado entenda que pode ficar mais calmo com essa tentativa dele [Haddad] de mostrar, de sinalizar, que está à frente dessa gestão, existem outros fatores que vão pressionar", diz Juliana.
"Nesse aspecto, vai ser imprescindível o auxílio do Banco Central para conseguir segurar o dólar", acrescenta.
"Dada a magnitude da deterioração, que é diária e ininterrupta, nada mais racional e lúcido do que [Haddad] ficar no país e endereçar algo estrutural e efetivo, que no mínimo interrompa a profunda piora dos fundamentos", avalia Gabriel Barros, economista-chefe da ARX Investimentos e ex-diretor da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado.
Segundo ele, o tempo para procrastinação é inexistente diante da piora do perfil da dívida pública. "Estamos com 55% da dívida bruta selicada [atrelada à variação da taxa Selic] e cada vez mais curta", alerta.
O especialista em contas públicas lembra que o colchão de liquidez do Tesouro Nacional está sendo consumido em meio a ausência de medidas críveis e estruturais do lado fiscal.
"A incerteza fiscal é tão aguda que os prêmios na curva de juros não param de subir. É preciso ter senso de urgência, não conseguiremos empurrar o problema por mais seis meses", afirma.
O economista Alexandre Espirito Santo, da Way Investimentos, avalia que a permanência de Haddad no Brasil pode ser positiva porque os mercados estavam "muito tensos" com a possibilidade de o pacote fiscal ser adiado em razão da viagem.
"Pelo menos tem uma expectativa de que possa vir alguma coisa essa semana. Mas não adianta [a permanência] se não vier nada, aí vai ser uma decepção ainda maior", pondera Espirito Santo, que também é coordenador de Economia e Finanças na ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).
Colaborou Adriana Fernandes, de Brasília
HADDAD NO BRASIL TENDE A ALIVIAR ABERTURA DO MERCADO, MAS COBRANÇA POR MEDIDAS SEGUIRÁ FIRME- Broadcast 3/11
Por Bruna Camargo e Maria Regina Silva
São Paulo, 03/11/2024 - A decisão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de cancelar a viagem que faria à Europa ao longo desta semana é bem vista por especialistas consultados pelo Broadcast, que esperam uma reação positiva dos mercados amanhã. Segundo nota divulgada pela Fazenda nesta manhã, o ministro permanecerá em Brasília para tratar de "temas domésticos" a pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A expectativa agora é de que haja um anúncio de medidas fiscais em breve.
O cancelamento da viagem foi uma surpresa "bem" positiva, segundo Bruno Takeo, estrategista da Potenza Capital. Ao mesmo tempo, indica que o governo se sensibilizou, dado o recente estresse dos mercados financeiros no Brasil em meio ao anúncio da ida do ministro ao continente europeu. "O dólar superou R$ 5,80 e os juros explodiram. O cancelamento mostra que o governo se sensibilizou, indica um senso de urgência", afirma Takeo.
Por conta da indefinição com o fiscal, na sexta-feira, dia 1º, o dólar à vista fechou no segundo maior nível da história, a R$ 5,8694, em alta de 1,53%, com avanço forte dos juros futuros. O Ibovespa recuou 1,23%, aos 128.120,75 pontos, o menor nível de fechamento desde 7 de agosto, então aos 127,5 mil pontos.
"De forma geral é uma sinalização positiva para o mercado e para o Brasil. Visto que a situação está mais delicada, ver o governo focado em trazer uma resposta concreta e rápida é importante", concorda o economista da Manchester Investimentos, Thiago Lourenço. "Essa sinalização de Lula pedindo para o Haddad ficar vem num bom momento. O mercado precisa ter a presença dele aqui voltada para controlar os gastos", diz Gustavo Riess, sócio e assessor da Ável Investimentos.
Para Gabriel De Biase Berenguer, presidente executivo (CEO) da RJ+ Asset, o governo priorizou os desafios econômicos internos e evitou um possível estresse adicional aos mercados. Ele diz que a reação dos mercados na abertura de amanhã pode ser favorável, mas as ações concretas dos próximos dias seguem no radar. "Se efetivamente essa postergação da viagem se dá para ter algum anúncio em relação ao fiscal, isso é bastante positivo", reforça Rodrigo Moliterno, head de Renda Variável da Veedha Investimentos.
Na mesma linha, Pedro Moreira, sócio da One Investimentos, afirma que o cancelamento da viagem em si não deve trazer grande alívio. "[O mercado] quer resoluções práticas e concretas, anúncios, não mais promessas. Isso controlaria a parte de especulação que estamos tendo, as pressões em cima do câmbio e da inflação", afirma. "Só remarcar [a viagem] não muda nada, dado a calamidade que está", observa Gabriel Meira, especialista e sócio da Valor Investimentos. E, para Gustavo Jesus, sócio da RGW Investimentos, "cada vez que o governo adia a questão, menos paciência o mercado tem".
Mas a expectativa de Takeo, da Potenza, é de que a abertura dos ativos brasileiros amanhã seja atenuada, pois o governo pode anunciar o pacote de corte de despesas nos próximos dias, em vez de fazer isso apenas na semana seguinte. Ele pondera, no entanto, que os ativos ainda podem não devolver todo o prêmio de risco, uma vez que os investidores e os agentes querem algo concreto.
De acordo com o economista-chefe do BV, Roberto Padovani, com o cancelamento da viagem, o governo anunciará alguma medida fiscal para reduzir as despesas da máquina pública. E, segundo o analista da Empiricus Research, Matheus Spiess, esse anúncio pode vir logo, talvez até o dia 8 ou 9. O estrategista-chefe do Grupo Laatus, Jefferson Laatus, por sua vez, vê chance de algo sair já amanhã. "Imagine a pressão que não ficou em cima do Haddad, que teve de cancelar a viagem. Provavelmente terá de fazer algum anúncio nesta segunda-feira", estima. Mas, se o anúncio não agradar, Laatus decreta: "É dólar a R$ 6,00".
O economista-sênior da Tendências Consultoria, Silvio Campos Neto, afirma que só mesmo um anúncio de medidas que levem à percepção de responsabilidade fiscal mudará a dinâmica dos ativos brasileiros. "Se houver, é o que realmente vai mudar, mesmo que de forma tardia", afirma.
Em meio a tensão nos mercados, economistas pedem um pacote de corte de gastos estruturante / Economistas defendem que pacote vá além de medidas pontuais para que se crie uma narrativa mais construtiva / O volume de propostas que vêm sendo aventadas nos últimos dias, bem como os desmentidos da equipe econômica, dificulta a projeção do que pode surgir no anúncio final. Apesar das incertezas, no entanto, um pacote que gire em torno de R$ 30 bilhões passou a ser tratado como o patamar mínimo ou "ponto focal" das expectativas de analistas, embora o próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já tenha dito desconhecer como esse número projeção chegou ao noticiário. Valor 3/11
Marcelo Osakabe
As incertezas sobre o pacote de revisão de gastos prometido pela equipe econômica têm elevado a tensão nos mercados locais, e economistas afirmam que o governo precisa ir além de medidas pontuais para virar o jogo e trazer uma narrativa mais construtiva para 2025 e os próximos anos.
O volume de propostas que vêm sendo aventadas nos últimos dias, bem como os desmentidos da equipe econômica, dificulta a projeção do que pode surgir no anúncio final. Apesar das incertezas, no entanto, um pacote que gire em torno de R$ 30 bilhões passou a ser tratado como o patamar mínimo ou "ponto focal" das expectativas de analistas, embora o próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já tenha dito desconhecer como esse número projeção chegou ao noticiário.
Ainda que os cortes venham a se aproximar dos R$ 30 bilhões, o anúncio pode decepcionar a depender da composição das medidas, segundo o economista do Itaú Unibanco Pedro Schneider. Em sua avaliação, se o anúncio for, essencialmente, um reempacotamento de anúncios já feitos, como o combate a fraudes em programas como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a contabilização de emendas parlamentares para fins do mínimo da saúde, a recepção dos investidores pode ser ruim.
"São medidas que estão mais relacionadas aos R$ 26 bilhões em cortes para 2025 já prometidos pela equipe econômica em julho. Não é um esforço novo.”
Ele considera, porém, que para chegar a esses R$ 30 bilhões, o governo precisará lançar mão de novas medidas, de caráter pontual. Entre elas, mudanças nas regras do seguro-desemprego e da multa do FGTS, dos critérios de enquadramento do abono salarial e também o aumento do porcentual da complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais de Educação Básica (Fundeb) para fins de cumprimento do piso da educação.
"Para surpreender o mercado, o ideal é trazer algo estrutural, na linha do que o ministro Haddad tem apontado", continua Schneider. "A questão é que mesmo isso está aberto a interpretação. Um teto de crescimento igual ao do arcabouço fiscal [de 2,5%, descontada a inflação] para despesas significativas, como saúde, educação e benefícios, eu acho positivo. Para linhas como a despesa do funcionalismo, por outro lado, é negativo, porque ela cresce menos do que 2,5% normalmente."
O economista no entanto, se coloca no grupo que espera um pacote contendo propostas já anunciadas e algumas de caráter pontual. "A gente acha difícil vir medidas estruturais, embora reconheça que o ministro tem sinalizado esforço nesse sentido."
Roberto Secemski, economista-chefe para o Brasil do Barclays, também foca na qualidade das medidas anunciadas, mais do que o valor do pacote em si. "É compreensível que se procure um número como forma sucinta de representar o tamanho do esforço. Mas ele também precisa ser analisado em relação ao que representa em termos de corte de gasto ou somente de diminuição da velocidade de crescimento da despesa obrigatória.”
No primeiro grupo, explica, estão propostas como a redução do abono salarial e aperto das regras do BPC, mas também desindexação de aposentadorias e outros benefícios ao salário mínimo — medida que foi vetada pelo presidente Lula. No segundo, alternativas como mudanças na contabilização do Fundeb e também nas emendas parlamentares para o piso da saúde.
Dobrar a parcela que a União contabiliza para fins do mínimo da educação de 30% para 60% liberaria cerca de R$ 17 bilhões em gastos obrigatórios em 2025, exemplifica Secemski. Este espaço, no entanto, tenderia a ser ocupado por outras despesas discricionárias, já que o limite global para o crescimento das despesas vem do arcabouço fiscal.
"Medidas desse tipo representam uma reorganização que diminui a pressão do aumento do gasto obrigatório. Essa racionalização é bem-vinda, mas reforça apenas a primeira perna do arcabouço, que é o limite de gastos. A segunda é a meta de resultado primário e, quando se pensa no objetivo final da política fiscal, que é chegar à estabilização da dívida e, com isso, conquistar credibilidade, apenas a primeira perna não atinge, sozinha, esse objetivo", resume.
Para Secemski, é um raciocínio que pode ser transportado para o momento do bloqueio ou contingenciamento de gastos. "Propostas como a que envolve o Fundeb reduzem o ritmo de crescimento das despesas obrigatórias e, com isso, a necessidade de bloqueios. Mas não garantem a redução da despesa total do governo, então não diminuem a necessidade de contingenciamentos, que visam atender a meta de resultado primário", diz. "E esses contingenciamentos continuarão sendo decididos a cada bimestre, no relatório de receitas e despesas, e sujeitos à vontade e à capacidade política de cada momento."
Essa é uma crítica, segundo ele, que também pode ser dirigida à proposta de criar um limite de crescimento de 2,5% sobre todas as despesas, outra ideia que passou a circular recentemente. "Criar gatilhos de teto sobre os gastos obrigatórios sem enfrentar as causas desse crescimento é como criar um arcabouço dentro do arcabouço. Isso não resulta em ganho imediato de credibilidade, porque no fundo permanece o aumento inexorável dos gastos com salário mínimo e benefícios indexados", afirma. "O ideal seriam medidas mais perenes, como desindexar benefícios do mínimo."
Ítalo Franca, chefe de política fiscal e estudos especiais do Santander, tem uma avaliação um pouco diferente. Em sua opinião, medidas estruturais que visam o médio prazo são importantes, mas o foco, neste momento, é dar mais segurança de que a regra de despesa será cumprida já no ano que vem.
Ele pondera que alterações de caráter mais estrutural, como um teto de 2,5% para a valorização do salário mínimo, certamente melhoram a perspectiva no médio prazo, mas a economia imediata não é tão relevante, algo como R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões no próximo ano. Da mesma forma, aplicar o teto para os mínimos de saúde e educação também não gera grande economia no curtíssimo prazo, abaixo de R$ 5 bilhões.
"O ideal é que medidas de curto e médio/longo prazo caminhem juntas, mas a gente sabe que medidas mais estruturantes levam seu tempo", ressalta o economista. Ele acrescenta que o encaminhamento do pacote via Proposta de Emenda Constitucional (PEC), como o governo já indicou que fará, constitui um desafio adicional e eleva o risco de torná-la efetiva apenas em 2026.
O Santander defende a aprovação de um pacote de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões para 2025 e 2026, mas Ítalo considera imprescindível a sinalização de uma economia de ao menos R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões somente no próximo ano. "É um valor mínimo que traria visibilidade sobre o tema. Mas é preciso mais, algo entre R$ 15 bilhões e R$ 30 bilhões apenas para 2025.”
"Estamos em um ponto de inflexão. Quanto maior o pacote, mais significativa a ancoragem que o governo vai conseguir fazer em relação ao fiscal e maior o efeito sobre o prêmio de risco que se vê no mercado hoje", resume Franca.
Economista-chefe a AZ Quest, Alexandre Manoel avalia que o único gatilho para uma melhora da percepção dos mercados sobre a situação fiscal do Brasil é o governo sinalizar um horizonte para do déficit fiscal.
"A despesa primária como proporção do PIB saiu de 18% no governo Jair Bolsonaro, está perto de 20% por causa de despesas extraordinárias, como os gastos no Rio Grande do Sul, mas o atual governo deve entregar perto de 19%. Já a receita líquida, descontadas transferências, saiu de 17% do PIB e chegou hoje a 18,5%. Então existe, estruturalmente, um déficit primário de 0,5% do PIB. O que o governo precisa fazer é fechar esse déficit", resume.
Até pela quantidade de opções aventadas nas últimas semanas, o ex-secretário dos ministérios da Fazenda e da Economia entre 2018 e 2020 prefere não apontar quais medidas poderiam ser adotadas para atingir o objetivo. Ele salienta, no entanto, que o importante é que o governo comece a fazer escolhas de política pública.
"O problema é que desde 2023, o atual governo não deu sinais de respeito à restrição orçamentária. O ministro Haddad reclama que assumiu várias receitas obrigatórias que vieram sem indicação de fonte, como Fundeb e Bolsa Família, mas o governo anterior, a despeito disso, compensava esse maior gasto com escolhas como a não valorização real do salário mínimo e a suspensão dos mínimos da saúde e educação.”
Em relatório a clientes, o HSBC sugere que alterações em abono salarial, seguro-desemprego e auxílio doença, BPC e Fundeb podem garantir uma economia de até R$ 40 bilhões. "Um anúncio do tipo seria positivo para o mercado, não por causa do valor em si, mas porque teriam caráter duradouro, impactando os orçamentos de 2026 em diante", diz o relatório assinado pelo economista Daniel Lavarda.
O economista ressalta que um corte desse tamanho não altera o cenário "pouco construtivo" do banco para a dinâmica da dívida brasileira, mas assegura que o crescimento real da despesa não exceda o limite de 2,5% até pelo menos 2026.
Por outro lado, segue, "um resultado negativo seria um conjunto de medidas opacas, cujos impactos são difíceis de medir. Neste caso, o pacote seria recebido com ceticismo pelos mercados mesmo que chegue a R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões."
Após aprovação de Galípolo, BC deve aumentar ritmo de alta de juros, diante de dúvidas fiscais e dólar alto / Copom se reúne nesta semana. Em setembro, o comitê retomou o ciclo de alta com um aumento de 0,25 pp- O Globo 4/11
Thaís Barcellos
O Banco Central deve pisar no acelerador e aumentar o ritmo de alta de juros na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) desta semana, a primeira reunião após a aprovação de Gabriel Galípolo para comandar a instituição em 2025. Com preocupações fiscais e o dólar nas alturas, a expectativa é de que Copom eleve a taxa Selic em 0,50 ponto percentual, de 10,75% para 11,25% ao ano, nesta quarta-feira, de acordo com as expectativas do mercado. A decisão deve unir os nove diretores, inclusive Galípolo e o atual presidente, Roberto Campos Neto.
Em setembro, o comitê retomou o ciclo de alta com um aumento de 0,25 pp. De lá para cá, o cenário é de inflação mais acentuada, com a alta do dólar, e há mais ceticismo com o ajuste fiscal. No último encontro do Copom, o câmbio considerado foi de R$ 5,60, mas a moeda americana fechou em quase R$ 5,87 na sexta-feira passada, o segundo maior valor nominal da história.
A fraqueza do real é resultado de aspectos externos e locais. No âmbito internacional, pesam as dúvidas sobre o resultado das eleições americanas, especialmente devido ao crescimento das chances de vitória do republicano Donald Trump. Aqui, sem novidades sobre um pacote de medidas para conter a expansão dos gastos públicas, aumentaram os temores em relação à sustentabilidade do arcabouço fiscal e da dívida.
Além disso, dados no Brasil reforçaram um cenário de economia sobreaquecida, o que tende a elevar os preços. As expectativas de inflação se distanciaram ainda mais da meta de 3,0%. Para 2024, o mercado financeiro passou a prever estouro do limite superior da meta, de 4,5%. Para 2025, subiu de 3,95% para 4,0%. Já para o final de 2026, a mediana é de 3,60%.
Economia aquecida
Na Tendências Consultoria, a expectativa é de aumento da Selic a 11,25% nesta semana, seguido de mais duas altas de 0,50 ponto percentual e uma de 0,25 pp, encerrando o ciclo de aperto monetário em 12,50%.
— Com essa piora adicional de ambiente na margem e a renovação dos números fortes do mercado de trabalho, o Copom precisa dar uma resposta mais firme. Ou seja, acelerar o ritmo de aperto é o que deve ser feito agora — explica o sócio da consultoria Silvio Campos Neto.
Para o economista, além do mercado de trabalho, o Copom deve destacar a deterioração dos ativos brasileiros, principalmente do câmbio.
— Lá fora, o mês de outubro foi mais negativo, com os temores de um Fed mais cauteloso e o "Trump trade". No mínimo, o BC deve alertar para estas maiores incertezas externas, que voltaram a pesar. O câmbio pressionado com economia aquecida e expectativas desancoradas é sempre mais perigoso para a inflação.
Nesse contexto, Silvio Campos Neto avalia que o comitê deve dar algum sinal de que é mais provável seguir no ritmo de 0,50 pp nos encontros seguintes, mas evitando um maior comprometimento.
A Terra Investimentos também espera que Selic atinja 11,25% nesta quarta, mas passou a prever um aumento para 13,00% até o fim do ciclo diante da economia sobreaquecida, do "persistente" descolamento das expectativas de inflação e "da falta de visibilidade em relação à política fiscal".
A instituição também pontua que a nova composição do Copom anda precisa ser testada. Na prática, nesta reunião, o BC terá dois presidentes aprovados, embora só um empossado — algo inédito.
Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Galípolo recebeu o aval do Senado para comandar a autoridade monetária, mas só vai assumir o cargo após o fim do mandato de Campos Neto, em 31 de dezembro. Em janeiro, também devem chegar ao BC três novos diretores, e as indicações de Lula ao órgão serão maioria.
Para o economista-chefe da Terra Investimentos, João Mauricio Rosal, a conjuntura atual indica uma unanimidade da decisão sobre a Selic, o que trará pouca informação sobre a nova diretoria.
— Minha preocupação maior é quando esses novos passarem a ter maioria, no inicio do próxima ano --— disse, sobre possível interferência de Lula.
O economista da Tendências afirma que todos os membros do Copom devem estar igualmente preocupados com o cenário atual:
— A responsabilidade é de todos e até aqui o Galípolo demonstra estar ciente disso. Mas claro que incertezas sobre o comportamento do BC ao longo do tempo ainda persistem.
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