segunda-feira, 29 de dezembro de 2025

BDM Matinal RISCALA

 *Rosa Riscala:  Agenda forte na semana do Ano Novo*


Ata do Fed e emprego no Brasil no radar


… As conversas deste domingo entre Trump e Zelensky para um cessar-fogo entre a Rússia e a Ucrânia ainda não conseguiram evoluir para um acordo de paz, pressionando o petróleo, mas as negociações continuam. No ambiente de liquidez esvaziada, a B3 não abre quarta-feira, mas as bolsas em NY funcionam normalmente. Só os Treasuries fecham mais cedo dia 31. Antes da virada para 2026, ainda tem agenda importante para sair aqui e lá fora, com a ata do Fed e os indicadores fiscais e de emprego no Brasil, que vêm sendo monitorados de perto pelos investidores para projetar a política monetária. Também a acareação de Vorcaro com o BC deve movimentar o recesso de final de ano.


RETA FINAL – A atividade econômica tem dados sinais de desaquecimento, mas o mercado de trabalho ainda se mantém como um desafio para o alívio da Selic, diante do menor nível de desemprego da série histórica do IBGE.


… Antes de o ano acabar, saem amanhã dois indicadores da mão de obra: a Pnad Contínua (9h), que deve apontar manutenção da taxa de desemprego em 5,4% no trimestre encerrado em novembro, e os dados do Caged (14h).


… As vagas com carteira assinada devem perder fôlego, com a mediana no Broadcast indicando 79.120 postos de trabalho formal, desacelerando na comparação com outubro, quando houve saldo positivo de 85.147 vagas.


… Parecem cada vez mais remotas as chances de o Copom iniciar o ciclo de corte do juro em janeiro. Mas uma perda de ritmo do emprego pode favorecer a aposta de queda da Selic ainda no primeiro trimestre, na reunião de março.


… Neste fim de ano, também o fiscal está no radar. O Tesouro divulga hoje (14h30) as contas do Governo Central. A previsão é de déficit primário de R$ 13,250 bilhões, depois de um superávit de R$ 36,527 bilhões em outubro.


… O intervalo das projeções varia de um déficit de R$ 35,9 bilhões até um saldo positivo de R$ 262 milhões.


… Amanhã, o BC solta o resultado do setor público consolidado de novembro. O avanço das despesas e a perda de força da arrecadação devem contribuir para o déficit de R$ 13,3 bi, após saldo positivo de R$ 32,392 bi em outubro.


… Ainda no noticiário fiscal, o Estadão trouxe na sexta-feira que o Congresso cortou R$ 11,3 bi de despesas obrigatórias no Orçamento/26 aprovado dia 19 para elevar o valor das emendas parlamentares e do fundo eleitoral.


… O relator-geral, Isnaldo Bulhões, tirou R$ 6,2 bi de benefícios previdenciários e R$ 391 mi do seguro-desemprego.


… No ano que vem, o governo federal ainda terá de lidar com um calendário de pagamento de emendas parlamentares aprovado pelo Congresso que exige repasse de recursos no primeiro semestre, antes das eleições.


… No final de semana, o Diário Oficial publicou a sanção ao projeto de lei complementar que reduz em 10% os benefícios tributários e amplia a tributação sobre as bets, as fintechs e os Juros sobre Capital Próprio (JCP).


… Lula vetou o artigo que recriava o orçamento secreto e permitia o pagamento de R$ 1,9 bi em emendas não executadas entre 2019 e 2023, que já estava suspenso por Dino, reforçando o clima de atrito entre os Poderes.


… A boa notícia é que Lula e Alcolumbre estão retomando as relações, após a ruptura desencadeada pela indicação de Messias ao STF. Na Folha, os dois conversaram duas vezes nos últimos dias, depois de semanas afastados.


… Apesar de eles estarem distensionando as diferenças, Lula sondou o clima no Senado e ouviu nova negativa sobre a chance de candidatura de Pacheco ao governo de Minas Gerais, que cobiçava a vaga no Supremo.


A OUTRA POLÊMICA – O escândalo do Master arrasta o STF para o centro da crise e eleva a tensão institucional.


… O contrato de R$ 129 milhões do escritório de advocacia de Viviane de Moraes, mulher do ministro, com o Banco Master, por um trabalho ainda não esclarecido, movimenta os bastidores políticos durante o recesso de fim de ano.


… Deputados de oposição devem protocolar hoje um pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes.


… Está marcada para amanhã (14h) a audiência de acareação determinada pelo ministro Dias Toffoli (STF) entre Daniel Vorcaro, o ex-presidente do BRB Paulo Henrique Costa e o diretor de Fiscalização do BC, Ailton de Aquino.


… Interlocutores do Supremo disseram que Toffoli quer esclarecer quando o BC tomou conhecimento das suspeitas. O ministro negou recurso do BC, que questionava a necessidade de um encontro direto de Aquino com Vorcaro.


… O magistrado justificou a urgência de realizar o procedimento, mesmo durante o recesso do Judiciário, devido ao grande impacto que o caso tem no sistema financeiro brasileiro e às provas já reunidas no processo.


… A Folha apurou que o BC planeja recorrer ao STF com mandado de segurança para impedir a participação de Aquino, argumentando que a acareação é inadequada, porque o diretor não é alvo da investigação.


CORREIOS – Será divulgado hoje o plano de reestruturação. O Valor apurou que, além do contrato de empréstimo de R$ 12 bilhões firmado com cinco bancos, haverá um aporte de pelo menos R$ 6 bilhões pela União até 2027.


… Itaú Unibanco, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal assinaram o empréstimo.


MAIS AGENDA – Hoje, além das contas do Governo Central, sai o IGP-M de dezembro (8h), que deve desacelerar para 0,17%, após alta de 0,27% em novembro. As projeções para esta leitura, todas de alta, vão de 0,04% a 0,30%.


… No Focus (8h25), o mercado pode seguir ajustando as expectativa para a Selic e IPCA de 2026. Na onda de revisões em baixa, o Daycoval reduziu a estimativa para a inflação deste ano de 4,5% para 4,3% (abaixo do teto da meta).


… Amanhã à tarde, o Tesouro divulga o Resultado Mensal da Dívida Pública referente ao mês passado.


LÁ FORA – A ata do Fed sai amanhã, em meio às apostas mais conservadoras para os juros, de pausa em janeiro e cortes de, no máximo, 50 pontos na taxa básica em 2026, de acordo com a plataforma do CME Group.


… O mercado também tem para conferir a pesquisa semanal ADP e o auxílio-desemprego, na quarta-feira. Hoje, saem as vendas pendentes de imóveis em novembro (12h) e os estoques de petróleo do DoE, às 12h30.


… Amanhã, sai o PMI medido pelo ISM de Chicago em dezembro. No primeiro dia útil de 2026 (sexta-feira), a leitura final de dezembro do PMI/S&P Global industrial será divulgada nos EUA, zona do euro, Alemanha e Reino Unido.


… Na quarta-feira, véspera do Ano Novo, os Treasuries encerram às 16h, mas as bolsas em NY operam normalmente. Os mercados financeiros em Portugal e na Espanha fecham mais cedo e não abrem na Alemanha e Itália.  


CHINA – O PMI industrial de dezembro oficial e também o medido pelo setor privado saem amanhã à noite.


JAPÃO HOJE – O resumo das opiniões da última reunião do BoJ apontou para novos aumentos de juros no futuro. “A economia não está mais enfrentando um crescimento lento, reduzindo a chance de estagnação dos preços.”


RÚSSIA X UCRÂNIA – Após reunião presencial neste domingo com Zelensky no resort de luxo Mar-a-Lago (Flórida), Trump afirmou que “um acordo de paz está muito próximo, mas se demorar algumas semanas, não vai acontecer”.


… O presidente americano mencionou o território de Donbass, ocupado pela Rússia, entre os temas espinhosos. “Dissemos que a Ucrânia terá que ceder Donbass, mas eles sempre quiseram isso”, declarou o republicano.


… De seu lado, Zelensky disse que as equipes de negociação estão perto de um acordo sobre Donbass, mas não é em uma semana ou um mês que será resolvido. Ainda assim, afirmou que uma desmilitarização na região será discutida.


… O presidente ucraniano disse que se o plano de 20 pontos sobre um eventual acordo de paz com a Rússia for muito difícil para ser absorvido pela sociedade da Ucrânia, o governo de Kiev pode optar por realizar um referendo.


… Zelensky disse que irá se encontrar novamente com Trump nas próximas semanas para finalizar pontos discutidos.


… Pouco antes de receber Zelensky, Trump teve uma ligação telefônica com Putin, que durou mais de 1 hora.


… O Kremlin afirmou que o presidente russo e o americano não apoiam uma iniciativa conjunta europeia e ucraniana para um cessar-fogo temporário antes de uma solução definitiva para o conflito entre os dois países.


… Hoje, Trump encontrará o premiê de Israel, Benjamin Netanyahu, na Flórida.


PASSO CURTO – A carta de Bolsonaro, reafirmando o apoio à pré-candidatura do filho Flávio, reforçou o clima de cautela no mercado doméstico na 6ªF, em meio à liquidez restrita.


… Em uma sessão sem maiores novidades no noticiário local e com muitos investidores aproveitando as folgas de fim de ano, a ordem nas mesas foi dar passos curtos.


… Depois de uma abertura negativa, o Ibovespa passou boa parte do dia de lado, mas reagiu à tarde e fechou em leve alta de 0,27%, aos 160.896,64 pontos, com giro de apenas R$ 15 bilhões. Na semana curta, o índice subiu 1,53%.


… Entre as blue chips, Petrobras oscilou bastante, mas terminou com alta modesta (PN +0,33%, a R$ 30,41; e ON +0,31%, a R$ 32,12), na contramão do tombo do petróleo. Vale seguiu o minério e subiu 0,30%, a R$ 73,12.


… Os bancos tiveram mais uma sessão mista: Itaú PN ficou de lado (+0,03%, a R$ 39,10), assim como Bradesco PN (-0,05%, a R$ 18,40); BB ON ganhou 0,46%, a R$ 21,85; e Santander Unit subiu 0,53%, a R$ 34,28.


… Braskem PNA (+4,25%, a R$ 7,85) ficou no topo, após o IG4 Capital submeter ao Cade um acordo para assumir o controle da companhia. Em seguida, ficaram CPFL Energia (+3,38%, a R$ 53,23) e Hapvida ON (+2,83%, a R$ 14,55).


… Na ponta negativa do índice figuraram GPA ON (-4,26%, a R$ 3,60), Cury ON (-0,96%, a R$ 31,88) e Vivara ON (-0,93%, a R$ 33,02).


PERNAS PRA QUE TE QUERO – Depois do respiro de 3ªF passada, quando interrompeu sequência de sete sessões em alta, o dólar voltou a subir na 6ªF, mas de forma moderada, graças à nova atuação do Banco Central.


… A moeda americana fechou em alta de 0,24%, a R$ 5,5446. Na semana, acumulou valorização de apenas 0,27%, mas caminha para fechar dezembro com ganho próximo de 4%.


… O BC vendeu toda a oferta de US$ 2 bilhões em dois leilões de linha. Na 3ªF, a autoridade já havia injetado mais US$ 500 milhões de dinheiro novo, já que as operações não estavam vinculadas à rolagem de vencimentos.


… As operações tiveram como objetivo atender à demanda sazonal de remessas de lucros e dividendos neste fim de ano. Mas ajudaram também a conter o “calor” provocado pelo noticiário político nas últimas semanas.


… Os dados de fluxo cambial da semana de 15 a 19/12, divulgados na 6ªF pelo BC, mostraram forte saída de recursos pela conta financeira (US$ 8,085 bilhões). O fluxo total ficou negativo em US$ 6,472 bilhões na semana.


… Segundo operadores, o volume elevado de remessas ao exterior neste fim de ano foi intensificado pela mudança na legislação sobre dividendos, que prevê a tributação de 10% de imposto de renda a partir de 2026.


… A pedido da CNI, o STF adiou para o dia 31 de janeiro o prazo para que as empresas aprovem a distribuição de dividendos isentos de IR. Texto original previa a próxima 4ªF como limite para distribuir valores sem pagar imposto.


… No mercado de juros, a liquidez enxuta após o Natal e a ausência da dados macro relevantes levaram a ajustes apenas pontuais nas posições.


… Os vencimentos mais curtos devolveram um pouco mais de prêmio, na esteira da decisão divulgada pela Aneel de adotar a bandeira verde nas contas de luz em janeiro, medida que tem efeito deflacionário.


… No fechamento, o DI para janeiro de 2027 marcava 13,730% (de 13,828% no ajuste anterior); Jan/29, 13,220% (contra 13,317%); Jan/31, 13,530% (de 13,608%); e Jan/33, 13,640% (de 13,713%).


PAUSA – Depois de bater recorde de fechamento por dois dias seguidos, o S&P 500 chegou a renovar sua máxima histórica intradia (6.945,77) na 6ªF, mas perdeu fôlego e fechou de lado (-0,03%, aos 6.929,94 pontos).


… A liquidez reduzida pelo fim de ano e a falta de novidades no noticiário também levaram o Dow Jones (-0,04%, aos 48.710,97 pontos) e o Nasdaq (-0,09%, aos 23.593,10 pontos) a encerrarem quase no zero a zero.


… No acumulado semanal, os índices registraram ganhos de 1,20% (Dow), 1,40% (S&P) e 1,22% (Nasdaq).


… As mineradoras voltaram a brilhar, de carona nos sucessivos recordes do ouro (+1,11%, a US$ 4.552,7 por onça-troy) e outros metais. Freeport-McMoRan subiu 2,16%, enquanto Newmont ganhou 1,00%.


… Entre as techs, Nvidia avançou 1,02% com a compra da licença de tecnologia da startup Groq, especializada em chips de inteligência artificial, por US$ 20 bilhões.


… Já a Tesla caiu 2,10%, após notícia de que reguladores americanos estão investigando denúncias de que o mecanismo de abertura mecânica das portas do Tesla Model 3 2022 é difícil de localizar em caso de emergência.


… No mercado de moedas, os movimentos foram contidos nesta reta final de 2025. O índice DXY marcou leve alta de 0,07%, aos 97,995 pontos. O euro caiu 0,04%, a US$ 1,1777, e a libra recuou 0,10%, a US$ 1,3504.


… Já o petróleo registrou intensa volatilidade, mas terminou em forte queda, com os investidores se antecipando a um possível avanço nas negociações de paz entre Ucrânia e Rússia durante o fim de semana.


… O Brent para março recuou 2,52%, a US$ 60,24 o barril, enquanto o WTI para fevereiro caiu 2,76%, a US$ 56,74. Na semana, o Brent cedeu 0,38%, mas o WTI subiu 0,38%.


CIAS ABERTAS NO AFTER – CSN MINERAÇÃO aprovou a distribuição de R$ 423,7 milhões em proventos, a título de antecipação do dividendo mínimo obrigatório…


… Do total, R$ 259,7 milhões correspondem a dividendos intermediários, o equivalente a R$ 0,0478 por ação; já R$ 164 milhões serão pagos na forma de JCP, o equivalente a R$ 0,0301 por ação…


… Pagamentos serão realizados até 31 de dezembro de 2026; ex em 5 de janeiro.  


GRUPO PÃO DE AÇÚCAR informou que Edison Ticle de Andrade de Melo e Souza Filho apresentou sua renúncia aos cargos de vice-presidente do conselho de administração e de coordenador do Comitê Financeiro da companhia…


… O grupo não informou quem assume as posições.

Bankinter Matinal Portugal

 Análise Bankinter Portugal 


NY -0,03%, US TECH -0,05%, US SEMIS +0,05%, VIX 11,6% +0,8pb. BUND 2,86%, T-NOTE 4,13%, SPREAD 2A-10A USA=+64,5PB O10A, ESP 3,28%, ITA 3,55%. EURIBOR 12M 2,26% (FUT.12M 2,42%). USD 1,177. JPY 183.8. OURO 4.462$. BRENT 61,3$. WTI 57,3$. BITCOIN +2,2% (89.533$). ETHER +2,7% (3.016$).


SESSÃO: Inicia-se uma nova semana curta e com escassas referências económicas. Na quarta-feira (Passagem de Ano), a Europa encerra às 13h, e na quinta-feira (Ano Novo) os mercados estarão fechados. Destacam-se as Atas da Fed da reunião de 9/10 de dezembro na terça-feira e pouco mais, pois na sexta-feira há PMIs finais, sem expectativas de alterações significativas. As Atas não deverão trazer grandes novidades após o corte de taxas em -25pb para 3,50%[3,75%], conforme esperado, e o anúncio da compra de Letras do Tesouro para manter liquidez suficiente no sistema. A revisão em alta das previsões de crescimento para 2025/2028 e em baixa da inflação foi bem recebida pelo mercado, mantendo aberta a porta a novos cortes de taxas em 2026. O ritmo dependerá em parte do sucessor de Powell em maio. O anúncio deste pode ser "a" notícia da semana, embora oficialmente previsto para inícios de ano. K. Hasset, diretor do Conselho Económico da Casa Branca, continua como candidato favorito, mas outros como C. Waller ou K. Warsh mantêm-se nas sondagens. Qualquer um será da ala de Trump e trará um viés dovish mais ou menos assumido ao Conselho da Fed. Outro foco imprevisível é o geopolítico. Enquanto a China continua a desafiar Taiwan com manobras militares, Trump e Zelenski dizem estar mais próximos de um acordo após a reunião de ontem. Isto está a propiciar alguma realização de lucros no ouro (-1,3% até 4.474$).


Em resumo, semana curta e com pouca atividade, embora novidades "fora de agenda" com viés positivo possam animar o rally natalício para fechar um ano muito generoso e que deixa boas bases para um 2026 promissor.

domingo, 28 de dezembro de 2025

Gustavo Franco

 


Lourival Sant` anna

 


A polarização e o sectarismo transformaram a defesa da democracia em licença para o desvio de conduta e a ditadura no preço a pagar pela moralidade. As fontes de legitimidade se deslocaram dos princípios éticos e democráticos para o campo político-ideológico a que pertencem os líderes e autoridades. A concentração de poder mergulhou os dois maiores presidencialismos democráticos, EUA e Brasil, em uma crise de legitimidade e de moralidade. Minha coluna no ESTADÃO deste domingo: https://lnkd.in/dYArKhCx


Estados Unidos e Brasil, as duas maiores democracias presidencialistas, enfrentam uma crise de legitimidade decorrente de concentração e denúncias de abuso de poder – na presidência americana e na Suprema Corte brasileira.
A polarização serve de amortecedor contra as denúncias de malfeitos, ao deslocar o critério de legitimidade dos princípios éticos para o alinhamento político.
Faltam freios e contrapesos robustos o suficiente para conter pessoas que priorizam o dinheiro em detrimento da própria reputação. Como acordo de damas e cavalheiros, o presidencialismo se alicerça na premissa de que autoridades em altas posições da república seriam dotadas de vergonha.
Essa premissa já não é necessariamente válida. Os freios e contrapesos podem e devem ser reforçados. As cortes supremas dos EUA, Canadá e Reino Unido, por exemplo, adotaram códigos de conduta e mecanismos de supervisão ou controle externo. Mas nenhum mecanismo parece suficiente em face do que poderia ser considerado uma degradação moral sistêmica.
Tanto nos EUA quanto no Brasil, o Executivo, Legislativo e Judiciário foram capturados pelo centro gravitacional do poder — no caso americano, o presidente; no brasileiro, o STF. Esse ambiente foi facilitado pelo rebaixamento intelectual do debate político.
As discussões em torno da liberdade e da ética, os dois princípios basilares da civilização, foram contaminadas pelo sectarismo. Segundo essa lógica binária, a fonte de legitimidade não está no respeito às regras democráticas e éticas, mas no campo político-ideológico que uma autoridade ou líder ocupa.
Isso deu a alguns (não todos) integrantes dos três Poderes, tanto no governo quanto na oposição, proteção reputacional para atropelar os limites da democracia e da ética, conspirando para se manter no poder apesar de derrota eleitoral, ou usar o cargo em benefício próprio, ignorando o conflito de interesses.
Os abusos são justificáveis para o grupo ao qual pertence quem os comete, que vê como condenável a sua denúncia.
Criou-se a crença de que é preciso escolher entre democracia e moralidade, como se não houvesse corrupção nas ditaduras, e a defesa do Estado de Direito fosse licença para o desvio de conduta.

Lauro Jardim

 A íntegra: Em mansão, Vorcaro recebeu Alexandre de Moraes e políticos para jantar

Por Lauro Jardim


Em seus tempos de liberdade (muita liberdade, aliás), Daniel Vorcaro recebia políticos e autoridades para jantares numa mansão de R$ 36 milhões e 1,7 mil metros quadrados de área construída no Lago Sul, em Brasília.


Pelo menos em uma dessas noites, Alexandre de Moraes esteve presente — embora sem sua mulher, Viviane, cujo escritório de advocacia tinha o ex-banqueiro como o seu melhor cliente.


Neste jantar, ocorrido no último trimestre do ano passado, quando já vigia o contrato de R$ 129 milhões de Viviane com o Banco Master, Moraes dividiu as conversas com políticos poderosos do Centrão, deputados, ex-ministros do governo Bolsonaro e, naturalmente, com o gentil anfitrião.


Era o único ministro do STF entre os cerca de vinte convidados, todos homens.


Segundo o relato de um dos participantes deste e de outros jantares na casa brasiliense de Vorcaro, eram noites de conversas amenas.


Nem é preciso discutir a possibilidade de algum assunto do Master ter sido conversado naquela noite. Até porque, se fosse o caso, teriam ocasiões mais discretas para isso. Mas parece claro que a simples presença de um integrante da Corte num jantar na casa do melhor cliente de sua mulher pode soar inconveniente.

Aurelio Schommer

 Sílvio Romero, respeitado intelectual na virada do século XIX para o XX, disse: “somos formados pelo pior da África, o pior das Américas, o pior da Europa”. Capistrano de Abreu, mais ou menos na mesma época, desenhou nossos antepassados com as piores injúrias: só defeitos, zero qualidades. Sérgio Buarque de Holanda disse sobre os luso-europeus serem aventureiros, avessos ao trabalho. Sobre os luso-americanos, acrescentou um dito esquecido de Barléu: “não existe pecado abaixo da linha do Equador”. E isso nem é verdade, registre-se. 


Em Pernambuco, Maurício de Nassau é mais mencionado que Vidal de Negreiros, Filipe Camarão e Henrique Dias, os heróis de Guararapes, um filho de portugueses, outro de tupis, outro de africanos. Se viam como brasileiros. Por isso lutaram, evitando que o Brasil se transformasse em um grande Suriname, ou numa Indonésia americana. Registre-se que o capitão pernambucano Luís Barbalho Bezerra, ao enfrentar comandados de Nassau, disse ser difícil atirar em homens de olhos azuis. A beleza está nos olhos de quem vê. 


A tradição autodepreciativa brasileira é antiga e hegemônica. Nelson Rodrigues não inventou. O caso é mais de vergonha. Essa parte da culpa é recente, mas vergonha e culpa andam juntas, se não são a mesma coisa. Eu inventariei essa tradição autodepreciativa em meu livro “História do Brasil vira-lata”. No canal, há o livro completo transcrito em trechos. 


Inventariar é uma coisa. Outra é perguntar: é mesmo? Não temos motivos históricos para a autoestima? Bem, no início do século XIX, nossa renda per capita perdia por pouco para a dos Estados Unidos. De lá para cá, abriu-se um fosso, lenta e continuamente. Devemos ter errado em alguma coisa, erramos mesmo, especialmente por nossa negligência para com o ensino básico. Contudo não há culpados evidentes no registro histórico, pelo menos não de caso pensado, por maldade. E isso vale para governantes e governados. Nossos pecadores eram católicos, logo se supõe tenham pedido perdão de eventuais falhas. Nossos santos eram também pecadores, mas quão pobre será a nação que santifica seus ícones sem nuanças? Não somos nisso tão miseráveis.


Quanto às culpas politicamente corretas, não houve extermínio indígena deliberado, intencional. Estima-se que até metade de nossos ameríndios morreram por doenças trazidas da Europa e da África nos navios. Século e meio antes de 1500, semelhante parcela dos europeus morrera de peste, trazida nos navios. O patógeno era de origem asiática e é notável que não se ponha a culpa nos asiáticos com veemência por isso. O contato era inevitável, questão de tempo, lá e cá, em toda parte. 


O escravismo era mesmo abominável. Ainda mais abominável se constatamos se tratar de prática abjeta universal até o século XVIII pelo menos. Não acabou. Há mais pessoas submetidas a trabalho escravo hoje do que em qualquer data no passado. Tardou a abolição formal no Brasil? Sem dúvida. Tardou ainda mais em alguns países da África. Diga-se em nosso favor que o regime nunca incluiu algo como as leis Jim Crow dos Estados Unidos, de apartheid, vigentes até meados dos anos 1960. Não existe pecado do lado de cima da linha do Equador. 


Culpar os outros é maniqueísmo de quinta categoria, vamos combinar, sim? Primeiro os portugueses, como se brasileiro não fosse rigorosamente igual a luso-americano. Na cultura, que é o que importa. Portanto, é mais autodepreciação. E logo em relação ao português, o pequeno povo que apresentou o mundo ao mundo. Os ingleses? Os americanos? Por que fizeram comércio conosco? Por que investiram aqui? Por que, no caso inglês, nos emprestaram dinheiro? “Ah, nos exploraram”. O uso do verbo explorar nesse caso tem o sentido de viver à custa do outro. São uns preguiçosos mesmo, esses seres de fala inglesa. Vivem do que o mundo dá a eles. Pera. Esses dias não estávamos desesperados para que não parassem de comprar o que produzimos? É mesmo o caso de parar de fazer comércio? Isso iria nos redimir? De quê, afinal? Nacionalismo vitimista é uma vertigem, uma espécie de alienação. 


Harold Bloom perguntou como podia Machado de Assis escrever tão bem tendo vivido o tempo todo nos trópicos, no Brasil, para piorar. Não nos ocorre a pergunta de Bloom, porque nós não sabemos o quão bem escrevia Machado de Assis, um brasileiro mestiço, como a maior parte dos brasileiros. Não o lemos. Não lemos quase nada. Isso deveria afetar negativamente nossa autoestima. Não afeta. Enquanto não afetar, é uma tragédia. Nossa redenção está ao alcance dos nossos olhos e nos distraímos com outras coisas, como com uma autodepreciação assentada não no registro histórico, mas na ignorância do registro histórico.

sábado, 27 de dezembro de 2025

Alvaro Costa e Silva

 Coluna do Alvaro Costa e Silva na Folha de hoje (27 de dezembro), p. A3.


QUARTETO FANTÁSTICO 


O lugar-comum publicitário inventou uma fórmula para atrair o leitor desacostumado aos livros de não ficção: garantir que estes podem ser lidos como um romance. Raramente isso é verdade. "As Cartas do Boom" tem essa mágica, com a vantagem de que o tema central é a arte de escrever romances.


Não quaisquer romances. O livro recém-lançado mostra a gestação e registra o impacto de quatro obras —"A Morte de Artêmio Cruz", "O Jogo da Amarelinha", "A Cidade e os Cachorros", "Cem Anos de Solidão"— que obtiveram êxito de público e alta estima crítica, sacudindo a roseira da literatura na segunda metade do século 20.


É a primeira compilação da correspondência —207 cartas— entre os principais romancistas do movimento que ganhou a etiqueta de "boom": o mexicano Carlos Fuentes, o argentino Julio Cortázar, o peruano Mario Vargas Llosa e o colombiano Gabriel García Márquez. Os dois últimos ganharam o Nobel, e se o tivessem dado aos dois primeiros, tudo bem.


Fruto da amizade, da ambição e da inveja, é um epistolário pleno de vida. A parte mais relevante começa em 1955 e vai até 1976, quando as desavenças pessoais, motivadas pela política, desintegraram o quarteto fantástico.


É curioso notar como a vocação dos escritores esteve ligada ao encantamento pela Revolução Cubana e como, aos poucos, modificaram seu posicionamento em relação a Fidel Castro, até se tornarem irreconciliáveis. Em 1976, Vargas Llosa desferiu o famoso "puñetazo" contra García Márquez, no saguão de um cinema mexicano.


As cartas mostram o Fuentes pragmático, lutando para promover e vedetizar o grupo. Mosqueteiro mais velho, Cortázar é o crítico cruel, mas necessário; a pedido dos confrades, lê os inéditos e não se furta em apontar as falhas. Vargas Llosa é o mais obstinado em se tornar um escritor de sucesso; não à toa, seu apelido é "Grande Chefe Inca". Mesmo nas mensagens mais prosaicas, a música verbal de García Márquez sobressai, ao lado de seu disfarce de indiferença diante do intelectualismo.

Pedro Fernando Nery

 *A economia precisa de menos escândalos?* Instabilidade política pode ser pior para o crescimento do que a própria corrupção Pedro Fernando...