domingo, 21 de dezembro de 2025

EMBRAER ENCARANDO AIRBUS E BOEING

 *O QUE É PRECISO PARA A EMBRAER CRIAR UM AVIÃO QUE CONCORRA DIRETAMENTE COM BOEING E AIRBUS?*


Por Luciana Dyniewicz, do Estadão


 São Paulo, 21/12/2025 - Especulada há aproximadamente um ano, a possibilidade de a Embraer desenvolver um avião de cerca de 200 lugares, que possa competir diretamente com as gigantes Boeing e Airbus, ganhou força neste mês em meio a comentários do CEO global da Lufthansa, Carsten Spohr. Em visita ao Brasil, o executivo alemão afirmou querer que a fabricante brasileira produza aeronaves maiores e disse que discutiria isso com a direção da Embraer. O apoio - e a encomenda - de companhias aéreas é chave para que o projeto se torne realidade.


 Hoje, a Embraer produz aviões de no máximo 146 lugares e um alcance de 5.556 quilômetros. Assim, o maior jato da brasileira compete apenas com os A220, da Airbus, cuja capacidade é de até 160 passageiros.


 Se passar a fabricar aeronaves maiores, a Embraer poderia brigar diretamente com a família do A320, da Airbus, cujos aviões têm de 120 a 244 lugares, e com a do 737, da Boeing, que tem jatos com 126 a 220 lugares. Aeronaves com capacidade para 150 a 180 passageiros são as mais demandadas na história da aviação comercial.


 Procurada para comentar o assunto, a Embraer afirmou, em nota, ter "produtos novos e competitivos em todos os segmentos" e estar focada em aumentar as vendas do portfólio atual. "Em paralelo, continuamos investindo em novas tecnologias, com o objetivo de estarmos prontos para o próximo ciclo de desenvolvimento de produtos no futuro, independentemente do segmento (aviação comercial, executiva ou de defesa). No entanto, não podemos fornecer uma data específica para essa decisão."


 O presidente da empresa, Francisco Gomes Neto, já admitiu que a companhia planeja desenvolver um produto novo, mas ainda não definiu qual será. Em julho, o executivo afirmou ao Estadão que o projeto de criar um novo jato ainda está em fase embrionária.


 "Estamos fazendo estudos para outros produtos para o futuro. Pode ser um avião executivo, um avião comercial, mas são estudos ainda. Não temos resposta sobre o produto que vai ser ou como vamos construir isso."


 Gomes Neto disse ainda que não tinha pressa para desenvolver um novo projeto, dado que quase 25% de seus 4 mil engenheiros estão trabalhando na criação do eVTOL (o carro voador que vem sendo desenvolvido pela subsidiária Eve) e outra parte importante desse time está focada em melhorias do portfólio atual.


 O desenvolvimento de um avião de cerca de 200 lugares demandaria entre US$ 8 bilhões (R$ 43,4 bilhões) e US$ 10 bilhões (R$ 55 bilhões), de acordo com o analista do setor Alberto Valerio, do UBS BB. Se o custo alcançar US$ 10 bilhões, ficaria próximo ao valor atual da companhia no mercado (R$ 59,5 bilhões). "A empresa tem competência para desenvolver um avião como esse. Mas tem um risco", diz Valerio.


 O analista acrescenta que, para desenvolver uma nova aeronave, a Embraer precisaria levantar capital no mercado emitindo ações e dívida, além de fechar parcerias com clientes e fornecedores de peças como motores e GPS. "Também precisaria de garantias de que terá um volume robusto de encomendas por parte das companhias aéreas." Valerio afirma que o ideal seria que "umas três" companhias do porte da Lufthansa fizessem encomendas de cerca de 300 aeronaves cada uma.


 Também analista do setor, André Mazini, do Citi, é outro a afirmar que a Embraer tem capacidade de engenharia para criar um novo avião. "A questão é mais fechar a parte financeira e garantir a capacidade de manutenção no pós-venda. Hoje, essa capacidade é boa, mas precisa continuar avançando", diz ele.


 Mazini afirma ainda que as companhias aéreas "claramente querem sair do duopólio". Como apenas Boeing e Airbus fabricam hoje jatos de 200 lugares, a entrada de uma terceira competidora no mercado poderia pressionar os preços das aeronaves para baixo. Em sua visita ao Brasil neste mês, o CEO da Lufthansa destacou que, se houvesse três fabricantes no segmento, a velocidade de inovação aumentaria. Afirmou também ver espaço no mercado para aviões de melhor qualidade e mais baratos.


 O analista do Citi lembra que executivos da Embraer já sinalizaram que a empresa não assumiria um projeto dessa magnitude sozinha e que gostaria que as companhias aéreas apoiassem o desenvolvimento da aeronave com encomendas. "Um modo para viabilizar o avião seria que as aéreas entrassem com uns US$ 3 bilhões (em encomendas), ajudando a custear o projeto. As fabricantes de motores, como GE, com mais US$ 3 bilhões. O BNDES, com outros US$ 2 bilhões, e a Embraer, com uns US$ 2 bilhões. Aí ficaria mais palatável", diz.


 Os dois analistas dizem acreditar que a companhia não vai tomar uma decisão no curto prazo. Para Valerio, nada será definido até 2027. "Antes de começar algo novo, a Embraer quer amadurecer a Eve." Subsidiária da Embraer que desenvolve um "carro voador", a Eve deve concluir o desenvolvimento e a certificação de sua aeronave no fim de 2027. "A equipe de engenharia está focada nisso", destaca o analista.


 Mazini também afirma que a Embraer pretende fazer com que a Eve "ande com as próprias pernas" antes de assumir um novo desafio. "Eles (a direção da fabricante brasileira) não querem estressar o balanço da empresa com muita coisa ao mesmo tempo."


 O analista pondera que hoje a Eve tem praticamente apenas cartas de intenção de compras. Essas cartas precisam virar pedidos firmes para a empresa receber pré-pagamentos. "Quando isso acontecer, vai entrar dinheiro no caixa. Aí as coisas podem começar a avançar."


 Para Mazini, a Embraer também vai aguardar uma nova geração de motores de aviões ser desenvolvida. O desenho dessa tecnologia deverá ser definido em 2027, e nenhuma fabricante de aeronaves desenvolverá um jato agora usando os motores antigos - daí a necessidade de aguardar. "Não dá para dissociar um novo avião de um novo motor. Não haverá anúncios (por parte da Embraer) agora, porque a empresa precisa de detalhes desse motor."


 Além de um anúncio não ser esperado para breve, o desenvolvimento do avião também não será rápido. As aeronaves colocadas mais rapidamente no mercado levaram cerca de quatro anos desde o momento do anúncio até o primeiro voo. Quando as fabricantes anunciam a realização do novo projeto, porém, elas costumam já estar há algum tempo trabalhando previamente nele.

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