O artigo “O juiz venceu” descreve a naturalização do anormal em Brasília: ministros do STF atuando como protagonistas políticos, “orientando” o Legislativo, chancelando textos, condicionando votações e participando de acordos de bastidor como se isso fosse parte do rito democrático. Na narrativa do cronista, a República vira um tabuleiro em que o juiz deixa de apenas julgar: ele antecipa veto, avaliza projeto, sela pactos e, ao fim, “vence” — porque concentra a palavra final e ainda opera o caminho até ela.
O que pouca gente parece estar dizendo com clareza no caso Master é o seguinte: o “ativo” mais decisivo não era só liquidez; era poder jurídico futuro. Relatos sobre o banco indicam uma exposição gigantesca a precatórios (ativos cuja realização depende de regras, validações, compensações e disputas judiciais), tanto que, no desenho de negociações com o BRB, esses papéis foram explicitamente deixados de fora do negócio, ao lado de fundos/participações — um bloco de ativos remanescentes avaliado em algo como R$ 15 a R$ 23 bilhões, segundo reportagem baseada em Reuters. Além disso, demonstrações financeiras do próprio banco registravam direitos creditórios e precatórios no balanço (com critérios próprios de precificação).
Aí entra a conexão que “não precisa ser Einstein” para enxergar: quando um banco monta uma tese tão dependente de ativos litigiosos e de ambiente decisório em Brasília, o STF não é pano de fundo — é parte relevante do risco/retorno. E, nesse mesmo enredo, veio à tona um contrato de R$ 129 milhões (R$ 3,6 milhões/mês por 36 meses) envolvendo o Banco Master e o escritório da esposa de um ministro do STF, com escopo amplo de atuação em frentes que tangenciam Estado e sistema de Justiça. Mesmo sem afirmar crime automaticamente, o conjunto cria um cheiro institucional intolerável: aposta bilionária em créditos que respiram decisões judiciais + relações financeiras gigantescas orbitando o topo do Judiciário.
Conclusão: isso tem cara de sintoma, não de acaso. Um país em que “negócios” dependem mais de acertos com cúpulas e decisões futuras do que de produtividade e concorrência vira, na prática, um cassino dos poderosos de Brasília — e quem paga a conta, como sempre, é o contribuinte tratado como figurante. Se o Brasil quer parar de ser refém desse teatro, a pergunta é direta: vamos continuar normalizando essas coincidências “cristalinas e documentadas”, ou vamos exigir regras duras de impedimento, transparência total e responsabilização real — sem blindagens, sem privilégios, sem truques de bastidor?
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