Fábio Alves: a montanha-russa nas falas do banco Central
10:58 18/05/2025
Tomara que até a próxima reunião do Copom, nos dias 17 e 18 de junho, a comunicação do Banco Central seja menos confusa e problemática do que foi entre março e maio, quando analistas e investidores experimentaram uma verdadeira montanha-russa, com sinalizações até contraditórias por parte dos diretores da instituição.
Em um dado momento, entre as reuniões de março e maio do Copom, chegou-se a falar num "pivot" para uma postura "dovish" da política monetária, turbinando até as apostas de um início de um ciclo de corte da taxa Selic já neste ano.
Isso aconteceu, em particular, logo após os discursos dos diretores Nilton David (de Política Monetária) e Diogo Guillen (de Política Econômica) durante os eventos paralelos da reunião anual do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Washington, em meados de abril.
Mas a interpretação "dovish" do mercado foi corrigida em seguida pelo presidente do BC, Gabriel Galípolo, que fez discurso mais duro, destacando o desconforto da autoridade monetária com expectativas de inflação ainda desancoradas e que o "guidance" dado em março ainda estava válido para maio.
Tanto que, na véspera da última reunião do Copom, eu perguntei a um renomado economista qual era o sentimento com que o mercado estava chegando àquela decisão depois das falas de Nilton, Guillen e Galípolo.
A resposta dessa fonte foi algo na linha: chegamos ao mesmo lugar que estávamos antes de todas as falas, logo após o Copom de março, mas com muito ruído no meio. E a fonte rematou esse sentimento assim: "Muito barulho para nada".
Porém, o mais preocupante é que o tom do comunicado que acompanhou a decisão de elevar a Selic para 14,75% foi considerado muito "dovish" por uma parcela grande dos analistas. Muitos no mercado passaram até a considerar que o ciclo de aperto monetário já acabou.
E esse tom "dovish" do mercado não foi nada condizente com o tom mais duro de Galípolo antes do início do período de silêncio que antecedeu à última decisão do Copom. Em outras palavras: o comunicado desdisse o discurso duro de Galípolo na véspera do Copom.
A impressão que muitos analistas ficaram foi a de que os diretores do BC bateram cabeça nesse último ciclo de comunicação entre reuniões. E acabaram turvando a visão do mercado, mais do que guiaram as expectativas sobre os próximos passos do Copom - esse, aliás, um dos princípios da boa comunicação da política monetária.
Por outro lado, é preciso debater se a culpa pela grande dispersão nas interpretações dos passos adiante da política monetária é somente dos diretores do Banco Central.
Isto é, qual a parte nesse latifúndio que cabe ao mercado?
Explico-me.
De que eu me lembre, o BC nunca disse explicitamente ao mercado que o termo "assimétrico", para descrever o balanço de risco, passou a ser parte integrante do seu "forward guidance", como o é os parágrafos finais do comunicado do Copom.
Todavia, desde que o BC acabou com aquele "choque de juros" da virada do ano, contratando três altas seguidas de 1 ponto na Selic, o mercado passou a se deter na qualificação do balanço de risco no comunicado do Copom para nortear sua aposta de fim do ciclo de aperto, uma vez que, compreensivelmente, o BC precisou contratar mais flexibilidade ao sinalizar seus próximos passos. E querer ter essa flexibilidade é totalmente normal para quando o fim de um ciclo se aproxima.
Se, de um lado, o mercado pecou ao colocar o balanço de risco como parte integrante do "forward guidance", com a retirada ou não do termo "assimétrico", de outro, o BC também errou ao não corrigir essa obsessão do mercado pela avaliação do balanço de risco como parte do "guidance".
Dito tudo isso, a impressão é que entramos, há algum tempo, num período em que um diretor do BC fala alguma coisa numa direção na parte da manhã, para ser corrigido por outro diretor numa fala na parte da tarde.
Quem dá conta de acompanhar tanta reviravolta?
O que se quer é um pouco mais de consistência. Daí, toda a atenção à palestra que Galípolo irá proferir nesta segunda-feira, a partir das 10 horas, em uma conferência do banco Goldman Sachs, em São Paulo. (fabio.alves@estadao.com)
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