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José Roberto Mendonça de Barros

 O QUE NOS ESPERA EM 2027? Ótima entrevista do Roberto Mendonça de Barros no Estadão de hoje:


"Quão preocupante é o cenário fiscal brasileiro?


Hoje, há praticamente um consenso de que nós temos um problema significativo de finanças públicas. Isso não era verdade há algum tempo, porque tinha um pedaço dos economistas que não achava isso. Hoje, se olhar pela própria imprensa, é muito impressionante o quão convencidos estão diversos agentes, players e analistas de que nós temos um problema. Tanto é que nem o governo desdiz que tem um problema de finanças públicas. Ele diz que quem fez o problema foi o governo anterior e que eles estão tentando fazer o melhor possível. Ninguém tem coragem de dizer que nós não temos isso. E esse é o primeiro ponto que gostaria de fazer, porque me dá uma certa percepção otimista numa certa medida.


Por quê?


Essa experiência de tantos anos como consultor me fez entender que, no Brasil, os consensos são muito difíceis de serem construídos com esse sistema político muito ruim, que não propicia consensos mínimos em uma sociedade muito diversificada e sofisticada. Em várias áreas, o Brasil só forma consensos quando o problema fica realmente muito grave. E a história está cheia de elementos, a começar pela própria inflação. Teve de haver a hiperinflação para que toda a sociedade dissesse que não tem jogo com a inflação. Nós estamos chegando a um momento em que a ampla maioria dos analistas diz que, com o peso de um grande problema fiscal, não tem jogo de crescimento, tem jogo de andar de lado. E isso é otimista no seguinte sentido: você precisa desse consenso maior para poder afetar a política e a política pública. Eu acho que nós estamos chegando nesse ponto, mas ainda está incompleto.


O que falta para o consenso completo, então?


Esse consenso está mais nos agentes privados de todos os tipos do que nos poderes. Eu acho que ele está mais avançado no Executivo. Mesmo no governo de esquerda, tem muita gente que concorda com a ideia de que não dá para simplesmente arregaçar as contas e nada acontecer. Tem um pouco mais no Executivo e, dependendo de quem for eleito, terá mais ainda. Mas, certamente, nem o Judiciário nem o Legislativo ainda espelham esse consenso. Eles vão ter de ser empurrados para esse consenso. O Judiciário em dois aspectos. Primeiro, no aspecto de que, apesar de estar se desgastando de uma forma gigantesca perante o País, ele insiste em viver numa bolha salarial e remuneratória extraordinária. E o Judiciário ainda tenta defender, com firulas jurídicas, dizendo lá com umas terminologias, que o penduricalho não é salário. Ao lado disso, não em todas, mas em muitas decisões, o Judiciário olha o direito sem olhar quem vai pagar por ele. Há decisões com impactos fiscais que não são pequenos. Nesses anos mais recentes, é justo dizer que, muitas vezes, o Judiciário, especialmente no Supremo, tem olhado isso em alguns casos. Mas o Judiciário, como um todo, em número de decisões judiciais de primeira e segunda instâncias que manda o setor público pagar isso, pagar aquilo, sem a menor consideração sobre qual o sentido disso, é espantoso. Então, seguramente o Judiciário ainda vive num momento em que ele é um ativo contribuidor para a piora da situação fiscal.


E o Legislativo?


O Legislativo, nem se fala. Isso é uma coisa que me incomoda. Toda vez que se fala de ajuste fiscal, a maior parte dos analistas diz: “Olha, isso é um problema do Executivo”. O que é verdade. Certamente é um problema direto do Executivo. A mim incomoda profundamente achar que o Legislativo e o Judiciário não têm grandes ligações com isso ou, se têm, é uma coisa da vida e não há o que fazer. Eu acho que isso é insustentável. No caso do Legislativo, em particular na Câmara dos Deputados, isso está chegando aos limites da paranoia. A gente tem de reconhecer e dizer para os senhores deputados que 95% da sua atenção está nas suas preciosas emendas, nos seus benefícios, nos seus gastos e num particular desejo de atender lobbies e jabutis de todas as naturezas com a maior facilidade. É só olhar o tamanho da influência das bets hoje no Congresso. É uma coisa inacreditável. Eles têm, sim, uma participação decisiva nesse desastre e nessa piora. Mais evidente ainda é votar a despesa que não tem origem na receita.

Na sociedade, eu acho que nós estamos atingindo um certo consenso — e eu falo de imprensa, analistas, empresários e mesmo gente ligada ao movimento trabalhista — de que não dá para continuar dessa forma. Isso impacta os políticos, impacta um pouco o Executivo e vai impactar muito mais quem for eleito. Mas é forçoso reconhecer que ainda há, no Legislativo e no Judiciário, um comportamento que é claramente pró-piora fiscal sistematicamente ou, no mínimo, de se colocarem distantes como se não fosse problema deles. E nós não vamos resolver um ajuste fiscal se não tivermos os três poderes trabalhando, de alguma forma, numa mesma direção. Não é que façam as mesmas coisas e que tenham as mesmas ideias, mas têm de aceitar, pelo menos, o princípio de que não se cria recurso do nada.


Quer dizer, o próximo presidente vai ter de criar um consenso com o Legislativo e Judiciário?


Exatamente. Essa é uma das grandes missões do próximo presidente. Eu acho importante ter essa percepção de que, se ele (Executivo) não é o único responsável, tem um papel especial para ajudar, ao longo do tempo, a desenvolver essas ideias junto ao Congresso. Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto é que nós temos de ter um objetivo de gerar superávits primários consistentes que, primeiro, de alguma forma, sejam críveis. Se não tiver credibilidade, esse jogo não existe. Nós aprendemos isso há muito tempo. E, dois, que sejam persistentes.


Como esse caminho deve ser construído?


É bom ter o primeiro ano com primário, mas ter um bom desempenho no primeiro ano e desandar daí para frente chega no mesmo lugar. Tem, então, de ser consistente e de um tamanho adequado para, pelo menos, estabilizar a dívida. Nós já aprendemos que é de pouca utilidade fazer uma lista de desejos de 100 itens — muita gente já fez isso — do que seria necessário fazer. Uma lista de desejos sem viabilidade política não se materializa e, portanto, não se faz o ajuste fiscal. Não se trata apenas de calcular qual teria de ser o tamanho do ajuste, quais teriam de ser os projetos, mas eles têm de ser ranqueados e elencados numa sequência no tempo que os tornem possíveis politicamente, porque, mesmo um governo comprometido com o ajuste fiscal, não pode qualquer coisa. Ele não tem poder absoluto. Tem o Congresso e o Judiciário. Isso parece uma coisa à toa, mas eu reputo da maior importância."

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