Especial: Renegociações e calotes de incorporadoras no mercado de capitais disparam
Por Circe Bonatelli * Colaboração de Cynthia Decloedt
São Paulo, 18/07/2025 - Há uma disparada nos casos de inadimplência e renegociação de dívidas de incorporadoras que acessaram o mercado de capitais nos últimos anos para tomada de empréstimos via emissões de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs). O quadro indica que as empresas estão enfrentando dificuldades crescentes para efetivar as vendas de imóveis após a elevação dos juros no País.
Os CRIs são instrumentos que cumprem um papel importante para apoiar o crescimento das empresas, especialmente quando elas não conseguem tomar o financiamento bancário tradicional. Eles respondem por 10% dos recursos destinados ao crédito imobiliário no País, o que representa uma montanha de R$ 240 bilhões. Por meio desses instrumentos, as incorporadoras recebem uma antecipação do dinheiro esperado com a comercialização de casas, apartamentos, lotes e quartos de hotéis, entre outros. O grande problema é quando as vendas não saem como planejado.
O estoque de CRIs em situação de "estresse" chegou a 191 casos em maio. Isso quer dizer que as incorporadoras descumpriram obrigações até a data de vencimento das dívidas e passaram a renegociar os termos com seus credores. O número é 89% maior do que no mesmo mês de 2024, quando havia 101 casos assim; e 247% acima de igual período de 2023, com 55 casos. Ao todo, os 191 CRIs ?estressados? correspondem a R$ 9,6 bilhões em dívidas considerando o valor de face no momento das emissões.
Os dados foram compilados para o Broadcast pela plataforma CR Data, do Clube dos FIIs, que monitora a base de dados públicos de CRIs no Brasil. O levantamento também aponta que houve crescimento em termos proporcionais. O estoque de CRIs "estressados" neste ano representa 4,6% de todas as séries em circulação, contra 2,8% em 2024 e 1,9% em 2023. A parcela de CRIs problemáticos não é desprezível. A título de comparação, a inadimplência da carteira de financiamento imobiliário dos bancos é bem menor, na faixa de 1%, e segue estável nos últimos trimestres, de acordo com o Banco Central.
Quantidade de CRIs "estressados" em alta
2023
2024
2025
CRIs em fluxo regular
2826
3519
4115
CRIs vencidos e não repactuados
55
101
191
Porcentual de vencidos e não repactuados
1,9%
2,8%
4,6%
Fonte: CR Data, plataforma de monitoramento de CRIs do Clube dos FIIs
Raiz dos problemas
O sócio-diretor de investimentos alternativos do Clube dos FIIs, Felipe Ribeiro, aponta que o problema está concentrado nos fundos de investimento imobiliário "high yield", que miram retornos mais altos para os cotistas, mas para isso têm de lidar com riscos maiores. Muitos fundos desse tipo adquiriram CRIs em que as empresas estão pagando caro pelo dinheiro, com taxas anuais acima de IPCA + 10% a 15%, ou CDI + 4% a 5% (o equivalente a um juro nominal na ordem de 20% ao ano, um patamar pesado para financiar a produção).
"Todos os CRIs que deram pau de 2024 para 2025 são ?high yield?", apontou Ribeiro. "Quando a taxa de juro sobe no País, os empresários ficam mais apertados, as obras ficam mais caras, cai a velocidade de vendas e o fluxo de caixa seca. Os primeiros a abrir o bico são os ?high yield?".
O risco/retorno desses CRIs é maior porque as operações envolvem incorporadoras pequenas, com governança mais simples, mais endividadas e/ou com menor capacidade de obter capital de giro em caso de urgência, o que eleva o risco de uma eventual inadimplência. Em outros casos, o risco tem mais a ver com o empreendimento em si e as chances de as vendas falharem. Boa parte dos CRIs problemáticos vêm do setor de multipropriedades - em que o direito de uso de cada apartamento é vendido para vários proprietários, que se revezam na ocupação. Esses imóveis são um bem de mero lazer, e o comprador desiste do negócio na primeira dificuldade que surgir, ao contrário da aquisição da casa própria.
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