*O retrato de Dorian Gray: a economia americana*
Nesta semana, dados de atividade econômica nos Estados Unidos, combinados com a retomada das discussões tarifárias, pressionaram os ativos de risco globais. Os números de pedidos de seguro-desemprego e outros indicadores de atividade vieram levemente abaixo das expectativas. Paralelamente, pesquisas de confiança entre os agentes privados apontaram para uma retomada do otimismo, mas esse sentimento foi ofuscado pelas novas sinalizações do governo americano em relação ao comércio internacional.
Destaca-se a aprovação inicial do plano de isenção de impostos proposto por Donald Trump, ainda pendente de votação no Senado. A medida adiciona pressão ao já deteriorado quadro fiscal americano, principalmente por ter sido apresentada logo após o rebaixamento da nota de crédito dos EUA, sem uma contrapartida clara no lado das despesas. Essa combinação levou à elevação das taxas de juros de longo prazo, que atingiram os maiores patamares desde 2023.
A movimentação do presidente pode ser interpretada como uma tentativa de reverter a queda recente em sua popularidade, mas o impacto fiscal relevante aumentou os juros futuros e, consequentemente, o custo de financiamento da dívida — fator ao qual Trump demonstrou sensibilidade em ocasiões anteriores. Diante disso, observou-se uma retomada do foco do governo em medidas alternativas que possam mitigar os efeitos do pacote de isenção.
Nesse contexto, foi anunciada a imposição de tarifas de 50% sobre produtos da União Europeia, com vigência a partir de 1º de junho. Adicionalmente, foi comunicada a aplicação de uma tarifa de 25% sobre celulares da Apple não produzidos nos EUA, o que levou a ação da companhia a recuar 7,6% na semana. As pressões repercutiram de forma ampla nos mercados: o S&P 500 e o Russell 2000 caíram 2,6% e 3,5%, respectivamente, enquanto o Nasdaq recuou 2,4% e o Dow Jones, 2,5%.
Um dos principais pontos de atenção segue sendo o comportamento da curva longa de juros nos EUA. As taxas dos títulos públicos de 10 e 30 anos subiram 1,4% e 2,6%, respectivamente, alcançando 4,5% e 5,0% ao ano. Como resultado, os preços dos títulos de longo prazo caíram 2,0%. Essa parte da curva é especialmente sensível à percepção de risco fiscal e à credibilidade das políticas públicas. O destaque é que esse movimento ocorreu em conjunto com a queda de 1,9% do dólar globalmente, sugerindo saída de capitais dos EUA — um padrão típico de países emergentes. Já os juros de dois anos permaneceram estáveis em 4,0%.
Normalmente, o aumento das taxas longas em países desenvolvidos tende a fortalecer suas moedas. O movimento contrário observado nesta semana reforça a percepção de vulnerabilidade institucional. Além disso, após a perda do rating AAA na semana anterior, fundos de pensão asiáticos, cuja regulação restringe investimentos a ativos de nota máxima, começaram a discutir a possibilidade de vendas forçadas de títulos do Tesouro americano. Estima-se que esse movimento possa alcançar até 215 bilhões de dólares.
Ainda que seja cedo para afirmar uma mudança estrutural, os fatores recentes reforçam a tese de que os EUA podem estar entrando em um ciclo prolongado de perda de fluxo de capitais para outras regiões, o que beneficiaria países emergentes.
O ambiente internacional foi predominantemente negativo: o DAX caiu 0,6%, o Nikkei recuou 3,0% e os mercados emergentes tiveram variação praticamente estável, com alta de apenas 0,1%. A bolsa de tecnologia da China caiu 1,4%, enquanto o índice tradicional subiu 0,7%. O ouro se valorizou 5,3% diante do aumento do risco global, enquanto o petróleo recuou 1,0% com a perspectiva de desaceleração da atividade econômica.
*Os Miseráveis versão política brasileira*
Localmente, o principal destaque da semana foi o aumento do IOF anunciado na quinta-feira pelo ministro Fernando Haddad, seguido por um recuo parcial das medidas na sexta-feira. O anúncio inicial previa a elevação do IOF para todas as modalidades, atingindo 3,5%, o que gerou forte reação negativa por parte dos investidores. A notícia impactou imediatamente os mercados, com o EWZ (ETF da bolsa brasileira negociado nos EUA) recuando mais de 4,0% antes da abertura do mercado local.
O maior estresse se deu em torno da taxação de remessas ao exterior para fins de investimento, tanto por pessoas físicas quanto por fundos, também sujeitas à alíquota de 3,5%. A medida foi interpretada por parte dos agentes de mercado como um primeiro passo em direção a um controle mais rígido da conta de capitais. Diante da reação negativa, o governo voltou atrás e anunciou a exclusão dessa categoria da mudança antes da abertura dos mercados na sexta-feira.
A elevação do IOF foi apresentada em conjunto com o congelamento de mais de R$ 30 bilhões em despesas públicas, como parte do esforço para adequar o orçamento às regras do novo arcabouço fiscal. Haddad também indicou que houve superestimação nas receitas projetadas anteriormente, justificando a necessidade de ajustes adicionais. Apesar da volatilidade provocada, alguns técnicos em finanças públicas consideraram as medidas como o primeiro movimento concreto em direção a um cenário fiscal mais crível e estruturado.
Vale destacar que o IOF é o único imposto que pode ser alterado por decreto, sem necessidade de aprovação do Congresso Nacional. O uso dessa prerrogativa levanta questionamentos sobre a capacidade de articulação política do governo e reforça a percepção de fragilidade institucional no atual cenário.
Nesse contexto, o Ibovespa recuou 1,0% na semana, enquanto o dólar teve leve queda de 0,3%, acompanhando o movimento global. As taxas dos títulos públicos com vencimento em 2030 foram pressionadas pela aversão ao risco nos mercados internacionais e pelas incertezas fiscais internas: a taxa do prefixado subiu 0,4%, encerrando a semana em 13,7% ao ano, enquanto a NTN-B de mesmo vencimento avançou 0,9%, sendo negociada a IPCA + 7,4%.
O episódio reforça a base do nosso conservadorismo no atual patamar de preços. À medida que as eleições de 2026 se aproximam, é provável que medidas fiscais expansionistas ganhem força — como vimos recentemente com a proposta de isenção nas contas de luz —, o que pode pressionar ainda mais o equilíbrio fiscal ou exigir novas medidas arrecadatórias. Ainda que o valuation dos ativos brasileiros nos pareça atrativo no horizonte de médio e longo prazo, optamos por manter um posicionamento mais cauteloso, especialmente diante das dificuldades estruturais na dinâmica orçamentária e da balança comercial no segundo semestre.
Qualquer necessidade estou à disposição.
um abraço, Breno - Rubik capital.
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