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Amilton Aquino

 E, como previsto, o governo do PT resolveu reciclar seu embolorado discurso divisionista para tentar tapar os buracos do já fracassado arcabouço fiscal. A radicalização ocorre em duas frentes, contra dois dos nossos maiores bodes expiatórios: o Congresso e, claro, os inimigos de sempre — os ricos.


Do ponto de vista da adesão nas redes sociais, a estratégia foi, até aqui, bem-sucedida. Pela primeira vez em muito tempo, a esquerda conseguiu mobilizar-se mais do que a direita. Segundo pesquisa da Quaest divulgada nesta sexta-feira, 61% das menções nas redes sobre o debate do IOF foram negativas ao Congresso, contra apenas 10% negativas ao governo. Isso, claro, após um descarado esforço de mobilização de influenciadores governistas, que chegaram inclusive a recorrer a vídeos produzidos com inteligência artificial com o claro objetivo de combater os “inimigos do povo”.


Virada do governo? Longe disso. Nem mesmo a Globo engoliu o engodo. O tom crítico — até mesmo de alguns dos porta-vozes mais empolgados do governo — lembra um pouco o abandono de Dilma a partir de 2013. O rei está nu. Pode até ganhar um fôlego com a arbitragem do todo-poderoso Alexandre de Moraes na crise do IOF, mas está muito longe de alcançar um equilíbrio mínimo das contas até as eleições. Os debates sobre o lençol curto só tendem a se intensificar. E é aqui que surge uma luz no fim do túnel.


Desde a pandemia, espero por este momento. A reunião de “conciliação” entre os poderes, marcada por Moraes para o dia 15, certamente vai resultar em mais um arranjo criativo de acomodação — combinando nova rodada de aumento de impostos com alguma redução nas emendas parlamentares e, claro, mais flexibilização das metas fiscais, com a retirada de mais um pedaço do tal arcabouço.


O fato, amigos, é que a realidade começa a gritar. O governo pode até continuar jogando para a torcida, mas, na realpolitik, a pressão por redução de gastos vai aumentar — e cada vez mais.


Uma amostra disso tivemos nesta semana, no longo debate entre o líder do governo na Câmara, Lindbergh Farias, e o deputado Kim Kataguiri. Lindbergh tentou de todas as formas reverberar o discurso governista de uma nota só contra a minoria privilegiada, mas foi sempre confrontado pela realidade. Como convencer a população de que se é contra os ricos, quando o PT — que governa o país na maior parte dos últimos 30 anos — foi quem mais ajudou a privilegiar nossos maiores bilionários?


Falar do ente abstrato do 1% mais rico é fácil. Difícil é justificar a ajuda bilionária a empresários amigos, para que estes comprassem concorrentes menores via empréstimos a juros subsidiados — ajuda recompensada por esquemas de corrupção que, quando descobertos (e confessados), resultaram em perdões de dívidas bilionárias pela nossa Justiça “garantista”.


Quem sabe agora nossos iluminados representantes dos três poderes sintam falta das dezenas de bilhões dos acordos de delação premiada — reconhecidos e confessados por alguns dos nossos mais ilustres bilionários — perdoados monocraticamente por Dias Toffoli?


Quem sabe agora o líder do governo, encurralado no debate, cumpra a promessa feita de completar as 15 assinaturas que faltam para pautar o projeto de Kim Kataguiri, que busca eliminar os penduricalhos que aumentam as remunerações de funcionários públicos (especialmente do Judiciário) muito além do teto constitucional?


É briga de cachorro grande, amigos. Lobby por todos os lados, cada um tentando manter seus privilégios. Mas é daí que podemos ter alguma melhora na eficiência dos nossos gastos. O fato é que grande parte do rombo atual resulta de uma armadilha que o próprio governo armou para si: ao retomar a política de valorização do salário mínimo e engessar ainda mais os gastos com saúde e educação, acabou ampliando nossa ineficiência — como demonstrado no debate.


Também como previsto, o governo vai bater na tecla das desonerações, porém, como demonstrado no debate, a maior parte foi concedida pelo próprio governo do PT. 


Por fim, a cereja do bolo: o aumento do IR já aprovado para os poucos milhares mais ricos, com o objetivo de isentar a maioria. Neste ponto, senti falta de uma argumentação mais forte por parte de Kim Kataguiri. O fato é que o movimento deveria ser justamente o contrário: aumentar o número de contribuintes (aumentar a arrecadação pela tributação da renda para poder reduzir no consumo, como nas melhores economias). A justiça tributária, portanto, deveria vir da progressão das alíquotas para os mais ricos — não da isenção da maioria, bancada por uma minoria de alguns milhares que, de um ano para outro, pode simplesmente desistir do Brasil e migrar para outros países. Sim, amigos, corremos o risco de matar nossas galinhas dos ovos de ouro.


Aliás, coincidentemente nesta semana surgiu um ranking mundial que coloca o Brasil na sexta posição entre os países que mais perdem milionários por ano. Ou seja, tal movimento pode se intensificar ainda mais se o governo resolver colocar em prática seu discurso populista.


Paralelamente começa a ficar mais grosso o coro dos descontentes com o aumento da nossa já escorchante carga tributária. Mais uma década de debates, talvez concluamos que quanto mais alta, menor competitividade no mercado internacional temos! 


Curiosamente, nesta semana, nossa Bolsa bateu recorde de valorização. Como explicar? Simples: uma combinação entre a diversificação dos investimentos estrangeiros — que saem dos EUA rumo a países emergentes, movimento intensificado desde as tarifas de Trump — e a perspectiva, cada vez mais real, da eleição de Tarcísio de Freitas em 2026. Ou seja, ironicamente, os efeitos maléficos do atual governo na reta final da campanha eleitoral tendem a ser compensados, de alguma forma, pelo otimismo em relação a uma mudança de rota, mesmo que tardia.


Até lá, apertem os cintos. O piloto ainda não sumiu, mas não tem a menor noção para onde está indo nem quanto combustível tem.

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