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A porta que a inflação baixa abre, por Fernando Montero

O esforço fiscal vem se perdendo numa macro duríssima que a inflação baixa pode reverter. Desinflação, recessão e juros altíssimos é duríssimo ao fiscal. A desinflação, em especial, puxa sobremaneira gastos indexados à inflação passada maior. Uma vez lá, em compensação, a inflação baixa é ótima. Não sugerimos que o crescimento com menos juros fará sozinho o ajuste. Apenas que o PIB e juros que esta inflação baixa permitem ajudará mais que o projetado hoje (muito mais que o projetado ontem...). As contas públicas pioraram, mas suas causas melhoraram: o déficit primário sofre hoje por receitas e não por gastos; sua receita frustra mais por desinflação que pela recessão (sofre pelas duas); e essa recessão é demanda (inflação cai) e não oferta (inflação subiria). O teto constitucional é restrição, cumpra-se ou não; plasmou uma limitação orçamentária onde déficits gigantescos fracassavam; forçando um “crowding in” do setor privado que precisará preencher 7% do hiato do PIB (ciclo) e 5% do primário (estrutural). Idem parafiscal por quantidade (fim das capitalizações) e preço (TLP). A inflação baixa contrata inércia baixa; que se soma a hiato enorme enquanto não crescermos (muito) acima do potencial. Os preços corrigiram, as contas externas são recordes e choveu uma safra histórica. O ano eleitoral incerto terá ciclo, inflação e juros baixos e comida barata. Desde que haja uma âncora política mínima, os juros desta economia podem cair a patamares inéditos.
A demora na retomada de 2017, desde que reflita demanda (a inflação cai) e não oferta (a inflação subiria), deixa à frente mais crescimento (mais hiato) com menos juros (hiato e a demanda fraca). Os juros tem o ciclo e, também, o “crowding in” do teto de gastos, seja das restrições de cumpri-lo ou das sanções de não cumpri-lo: o setor privado precisará preencher 7% do hiato do PIB (ciclo) e 5% do primário do governo (estrutural). Nossa macro desinflacionária atesta a folga do PIB e libera juros, aproximando os dois – variável chave nas dinâmicas de dividas.
A recessão absorveu o choque inflacionário de 2015, Ilan ancorou e uma safra magnífica terminou de quebrar a inércia. Seja porque o atual perfil da crise é desinflacionaria ou -mais provável- porque a desinflação contratada se mostra cada vez maior, os próximos 18 meses terão menos inflação e mais câmbio, menos PIB e mais balança, menos emprego e mais estoques agrícolas, preços ajustados, reservatórios e o menor reajuste do salário mínimo na história. A inércia agora é da inflação baixa. No horizonte relevante da política monetária, dissídios e expectativas verão um IPCA médio de 3,7%; alugueis e contratos pegarão um IGP médio de 2%; e o salário mínimo de 2018 (1/2 do fiscal; “serviços domésticos” no IPCA; mercado trabalho etc.) reajustará o INPC em 3,5% de 2017. As incertezas que alongam a estagnação, no curto prazo, não parecem por enquanto comprometer uma âncora política mínima às reformas no meio e longo prazo.
Pode não ser tão distante a convergência do PIB e juros nominais, comportando melhor dinâmica nas dívidas. A desinflação atesta o hiato e ambos permitem cortar os juros que, na falta dos multiplicadores fiscais e parafiscais do passado, e com gastos privados anêmicos, precisarão puxar a retomada cíclica. Se o crédito continua entupido, corta mais. Temos, claramente, a oferta desimpedida durante uma recuperação cíclica que deve ser prolongada, com uma demanda que persistirá fraca (ociosidade e desemprego privado, teto de gastos, déficits primários) e o hiato, enorme. Se é para ter recessão e desinflação, tenhamos seus juros. Eis o espaço (olhando a oferta) e a necessidade (a demanda) para queda dos juros na retomada cíclica. Acreditarmos podermos ter muito menos juros num cenário em que a economia não responde ou, alternativamente, muito mais PIB num cenário onde a economia sim responde. Juros e PIB nominais convergentes contribuem sobremaneira na dinâmica das dívidas que, em definitiva, ditam os tempos do ajuste.
O perigo é o câmbio; entretanto, chegamos a ter superávit corrente (12 meses até junho), balança de US$ 60 bilhões, investimentos estrangeiros, swaps zerados e US$ 380 bilhões de reservas. O cenário político é risco, mas serão riscos novos porque o PT está enfraquecido (e sua nova matriz envelheceu). A inércia perpetua uma inflação baixa, o hiato continuará puxando para baixo e restará discutir quanto o câmbio poderia puxar para cima com boas contas externas e uma posição fiscal líquida credora em dólar. Neste cenário, a inflação baixa segura o câmbio nominal, enquanto contas externas sólidas deveriam segurar exageros do câmbio real.
Nada do discutido acima refresca o teto, que precisará segurar despesas pelo cumprimento do limite constitucional ou, em sua falta, pelo não cumprimento do limite (as sanções impostas). Será mais difícil tirar o teto constitucional do que foi coloca-lo. O governo que assuma em 2019 terá que: 1) discutir a nova regra de salário mínimo; 2) negociar os próximos anos com o funcionalismo; 3) tocar as reformas etc. Nisto último, o país logrou um consenso (do problema), uma agenda (da solução) e o horizonte da urgência (o teto). Não é pouca coisa. Se o governo não continuar a agenda em 2019, o fará o teto nos anos seguintes.

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