Leitura de Sábado:Exportação da China ao Brasil é recorde, guerra tarifária é só um dos motivos
Por Daniel Tozzi Mendes
São Paulo, 11/6/2025 - As exportações da China ao Brasil atingiram US$ 29,5 bilhões no período de janeiro a maio, um recorde na série histórica iniciada em 1997, crescendo mais rápido que a de outros parceiros comerciais do País no mesmo período. No entanto, a expansão está relacionada a mais fatores do que à guerra tarifária lançada pelos Estados Unidos, segundo especialistas ouvidos pelo Broadcast.
Nos cinco primeiros meses de 2025, as importações brasileiras cresceram 9,22% em relação a igual período do ano passado, para US$ 112,5 bilhões, de acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex). A compra de produtos da China, porém, foi a que mais cresceu, com alta de 26,5%. As importações vindas de outros parceiros comerciais, como Estados Unidos (9,9%) e União Europeia (4%) cresceram bem menos, enquanto as de produtos do Mercosul caíram 1,8% no mesmo intervalo.
O crescimento nas importações da China, à primeira vista, corrobora a expectativa de que o país asiático teria de inundar outros mercados com seus produtos para compensar a queda no volume exportado aos Estados Unidos, com quem trava uma guerra tarifária desde fevereiro.
Especialistas, porém, apontam que o efeito do redirecionamento da produção da China ainda vai ganhar força no decorrer do ano, e que por enquanto a expansão reflete fatores como a atividade econômica interna aquecida. Além disso, também houve a compra de uma plataforma de petróleo vinda da China no mês de fevereiro, que custou cerca de US$ 2,7 bilhões e ajudou a inflar o número das transações comerciais entre os dois países no período.
O economista da corretora CM Capital Matheus Pizzani, que acompanha os dados da balança comercial brasileira mensalmente, observa que no início do ano o crescimento das importações chinesas no Brasil foi impulsionado pelos chamados bens de capital - maquinários e equipamentos usados pelas empresas para produzir outros bens e serviços. Os bens finais, como automóveis, eletrodomésticos e eletroeletrônicos, só começaram uma tendência de aumento a partir de abril.
Esse movimento, segundo ele, pode refletir "em alguma medida" o efeito da guerra tarifária e o atrito entre China e Estados Unidos. Pizzani reforça que a continuidade do crescimento das importações dos bens finais dependerá do cenário da economia doméstica. "São bens que, no limite, não são essenciais. A demanda por eles depende diretamente no nível da atividade e da confiança das pessoas em adquiri-los", reforça.
Além da economia doméstica aquecida, a economista da Tendências Consultoria, Gabriela Faria, lembra que o crescimento das importações no ano até aqui foi beneficiado pelo bom momento do setor agropecuário, que demanda itens como adubos e fertilizantes. "A safra de soja foi muito boa e com boa remuneração aos produtores. Eles conseguiram se preparar para fazer novos investimentos", diz ela.
O presidente da Associação da Câmara de Comércio Exterior (AEB), José Augusto de Castro, destaca que a queda no preço de commodities nos últimos meses diminuiu o custo de muitos dos bens produzidos pela China, o que favoreceu a produção e, consequentemente, a exportação para o Brasil. "Era um cenário anterior ao tarifaço dos Estados Unidos. As medidas do Donald Trump vieram apenas consolidar uma tendência que já era imaginada", pontua.
Castro observa ainda que a China tem focado em produtos de alto valor agregado, o que ajuda a turbinar os valores envolvidos nas importações feitas pelo Brasil. "Invariavelmente, mais produtos que eles venderiam para os americanos vão chegar aqui. É claro que o Brasil não tem como substituir os Estados Unidos, afinal de contas nosso mercado é bem menor, mas devemos ficar com alguma coisa", avalia ele.
O presidente da Associação Brasileira de Importadores (Abimp), Michel Platini, considera que parte dos produtos chineses que agora chegam ao Brasil só entrou no País por causa do fechamento do mercado americano em meio à escalada tarifária.
Ele explica que os custos estavam em baixa na China no início do ano, o que incrementou a produção, ao mesmo tempo em que os EUA anunciaram tarifas acima de 100% ao país asiático. "O investimento nessa produção já havia sido feito, mas um mercado importante [os EUA] foi praticamente fechado, houve essa necessidade de redirecionamento", diz ele.
O cenário, acrescenta Platini, "deu fôlego" a um movimento já bastante consolidado dos consumidores brasileiros, de comprar itens do segmento têxtil, utensílios domésticos e de bazar vindos da China a partir de plataformas como Mercado Livre, Amazon e Temu. Ele acrescenta que o aumento da entrada desses itens por aqui só não foi mais forte por conta da greve de servidores da Receita Federal em terminais alfandegários, que perdura desde novembro do ano passado.
Contato: daniel.mendes@estadao.com
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