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ANÁLISE: PIB e venda de dólares ajudaram a conter avanço da dívida bruta
Alex Ribeiro De São Paulo
Há cerca de um ano, os analistas econômicos estimavam que a dívida bruta do governo geral fosse fechar em 78,7% do Produto Interno Bruto (PIB). Hoje, tomou-se conhecimento, pelos dados oficiais do Banco Central, que a dívida ficou em 76,1% do PIB. Onde está o erro?
Dois fatores principais que não estavam nas contas da mediana dos analistas ajudaram a puxar a dívida bruta para baixo: o crescimento mais forte do que o esperado do Produto Interno Bruto (PIB) nominal e as pesadas vendas de dólares feitas pelo Banco Central no ano passado.
No início de 2024, os analistas econômicos esperavam que o PIB crescesse 2% reais e que a inflação pelo IPCA ficasse em 1,55%. Hoje, a estimativa de PIB real está em 3,49% para o ano passado, e a inflação medida pelo IPCA chegou a 4,83%.
Isso faz uma boa diferença no cálculo da relação dívida/PIB. A dívida bruta fechou o ano de 2024 em R$ 9,984 trilhões, uma expansão nominal de 11,2% no ano. Já o PIB cresceu 7,92%, chegando a R$ 11,810 trilhões.
Fazendo uma regra de três entre a dívida bruta e o PIB, chega-se a uma relação entre dívida e PIB de 76,1%. O avanço do PIB nominal teve um efeito baixista de 5,4 pontos percentuais do PIB na dívida bruta. Se o PIB real tivesse crescido menos, como previsto pelo mercado, e se a inflação fosse menor, a dívida teria crescido para mais de 78% do PIB.
Outro fator que teve uma grande influência em segurar o avanço do endividamento foram as vendas de dólares que o Banco Central fez em dezembro - e também ao longo do ano - para lidar com um surto de fuga de capitais estrangeiros do Brasil.
O Banco Central vendeu US$ 36,260 bilhões ao longo de 2024, dos quais US$ 21,260 bilhões de forma definitiva e US$ 15 bilhões em linhas de dólares, que depois voltam às reservas internacionais. Essa venda de dólares possibilitou que o governo reduzisse em R$ 212,477 bilhões a sua dívida bruta, por meio da redução de operações compromissadas. Sem essas operações, a dívida bruta seria 1,8 ponto percentual do PIB maior no fechamento de 2024.
Os analistas econômicos não deixaram de prever apenas fatores que baixaram a dívida, mas também fatores altistas para o endividamento.
O mercado não antecipou as pressões inflacionárias e, portanto, que o Banco Central teria que não só parar o ciclo de redução da Selic, como também aumentá-la. O consenso era que a Selic fosse encerrar 2024 em 9% ao ano, mas, no fim, ficou em 12,25% ao ano.
Isso fez com que os encargos com a dívida pública superassem o antecipado. Pelos dados divulgados hoje pelo Banco Central, somaram R$ 950 bilhões, ou o equivalente a 8,05% do PIB. Pelas previsões dos analistas econômicos no início de 2024, deveriam ter ficado em 6% do PIB.
Uma parte do erro de previsão nas estimativas do gasto com juros está ligada à desvalorização não antecipada do real ante o dólar. No início de 2024, os analistas achavam que o dólar fosse encerrar o ano em R$ 5,00, mas acabou ficando em R$ 6,19.
Essa alta do dólar teve efeito negativo na dívida bruta de cerca de 2 pontos percentuais do PIB. Cerca de 1 ponto do PIB está ligado ao pagamento de R$ 116 bilhões que o Banco Central fez ao mercado em seus swaps cambiais, que integram os encargos da dívida bruta. Houve ainda um impacto altista de 1 ponto percentual no estoque da dívida externa bruta, quando convertida em reais.
Entre todos os erros de previsão, o mais importante, do ponto de vista da dinâmica de longo prazo da dívida, foi o fato de o mercado ter superestimado o déficit primário em 2024. Pelo Boletim Focus, a mediana da projeção era 0,8%, e, no fim das contas, ficou na metade disso.
Esse é o indicador mais importante porque, no fim das contas, é o que os governos podem ajustar para se contrapor a outros fatores que fazem a dívida subir, como ciclos econômicos menos favoráveis, quando a economia cresce menos, quando o BC tem que subir os juros para combater um ciclo inflacionário ou quando o dólar tem que subir para fazer um ajuste de preços relativos.
O erro de previsão do mercado para o déficit primário pode ser explicado por vários fatores. Como a economia e a inflação cresceram acima do esperado, o mercado acabou subestimando a arrecadação. O governo também lançou mão de algumas receitas extraordinárias que não estavam nas contas dos analistas. Os especialistas também estavam céticos, no começo do ano, de que o presidente Lula fosse autorizar que a Fazenda fizesse um contingenciamento de despesas.
O fato de a dívida pública ter subido menos do que se esperava é positivo, porque, neste ano de 2025, o ponto de partida é mais baixo. Mas será mais difícil que os fatores que ajudaram a contê-la se repitam. Com a economia sobreaquecida, há menos espaço para o PIB crescer, e o BC fez um aperto monetário para esfriá-la.
A devolução dos US$ 15 bilhões das linhas de dólares feitas pelo BC deve provocar uma pressão altista de perto de 1 ponto do PIB na dívida bruta. Além disso, o ano começa com juros nominais mais altos. Pode ter surpresas baixistas para a dívida? Sim, uma delas é uma aceleração mais forte do que o esperado da inflação e outro um novo desempenho acima do esperado do PIB. Nesses dois casos, porém, a Selic deve se manter alta.
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