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NEWS - 26.12
PF investigará se houve peculato e desobediência à ordem judicial na liberação de R$ 4,2 bi em emendas / Um dos alvos da apuração deve ser o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL)- Valor 25/12
Isadora Peron / Andrea Jubé / Marcelo Ribeiro
A Polícia Federal (PF) vai investigar se houve crimes de peculato e desobediência à ordem judicial na decisão de liberar o pagamento de R$ 4,2 bilhões de emendas de comissão. Um dos alvos da apuração deve ser o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).
O inquérito foi aberto, na terça-feira (24), a pedido do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou também a suspensão do pagamento desse tipo de emenda.
O crime de peculato acontece quando um funcionário público rouba ou desvia bens ou dinheiro públicos. Já o desobediência é quando alguém desrespeita uma ordem de uma autoridade legal, como um policial ou juiz.
No ofício que encaminhou ao Supremo para comunicar a abertura do inquérito, o delegado da PF Tiago Adão Coutinho não citou o nome de Lira, mas afirmou “que as práticas criminosas a serem depuradas teriam sido cometidas por membros do Congresso Nacional”.
Também disse que o contexto narrado por Dino aponta para a existência de “elementos indiciários da prática do delito de desobediência, face ao aparente descumprimento deliberado de algumas determinações contidas de decisões”.
Segundo ele, as denúncias feitas por parlamentares levantam suspeitas sobre “irregularidades tanto no que tange ao rito interno de processamento das emendas, quanto na destinação e execução dos recursos”.
Como primeira diligência, a Polícia Federal vai colher os depoimentos do senador Cleitinho Azevedo (Republicanos-MG) e dos deputados José Rocha (União-BA), Adriana Ventura (Novo-SP) e Glauber Braga (Psol-RJ), que teriam criticado a manobra para liberar os recursos.
A investigação também vai mirar se o processo para permitir o pagamento das emendas estaria “recebendo influência ímproba de pessoas não parlamentares”, como lobistas.
Na decisão, o ministro do STF apontou que Lira enviou ao governo um ofício assinado por 17 líderes partidários solicitando o pagamento de 5.449 emendas de comissão sem identificar os respectivos autores dessas emendas. No mesmo dia, a Mesa Diretora suspendeu o funcionamento das Comissões Permanentes da Casa.
Além de ser apontado como o avalista da manobra, o Estado de Lira, Alagoas, teria sido o maior beneficiado da destinação dos R$ 4,2 bilhões, com quase R$ 500 milhões em emendas.
A nova decisão de Dino e a abertura do inquérito pela PF representam um novo capítulo da disputa sobre a distribuição dos recurso do orçamento que se estende há meses no STF.
Para parlamentares do centrão, o “timing” da decisão do ministro foi calculado, já que ele aguardou a votação dos projetos de contenção de gastos para suspender os pagamentos. Isso também sustenta as desconfianças de uma ala do Legislativo de que a iniciativa de Dino foi orquestrada com o governo, já que ele é próximo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O grupo defende que o Congresso recorra da decisão e já desenha algumas retaliações à medida, que incluem um atraso ainda maior da votação da Lei Orçamentária Anual (LOA) — o texto não foi apreciado no fim do ano legislativo e ficou para a retomada dos trabalhos em 2025, que acontece só em fevereiro.
Outra reação que está no radar é ampliar a pressão para que o próximo presidente da Câmara, que possivelmente será Hugo Motta (Republicanos-PB), dê andamento à proposta de emenda constitucional (PEC) para transformar as emendas de comissão ao Orçamento em emendas parlamentares individuais, com execução obrigatória pelo governo federal.
A proposição é de autoria do líder do PL na Câmara, Altineu Cortês (RJ), e já contabiliza 152 assinaturas, menos do que as 171 assinaturas necessárias para que medida seja protocolada e passe a tramitar.
Procurado por meio da sua assessoria, Lira não quis se manifestar.
Isenção do IR até R$ 5 mil mensais terá impacto de R$ 51 bilhões por ano, diz Unafisco / Atualmente, a isenção do IR vale apenas para que ganha até R$ 2.824 mensais- Valor 25/12
Estevão Taiar
A isenção do Imposto de Renda (IR) para pessoas físicas que ganham até R$ 5 mil mensais terá impacto fiscal de R$ 51 bilhões por ano para o governo federal, de acordo com levantamento divulgado nesta quarta-feira pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco).
A proposta de isentar quem ganha até R$ 5 mil da cobrança do IR foi apresentada em novembro pelo governo federal. O projeto de lei que tratará do tema ainda não foi, no entanto, enviado para o Congresso Nacional.
Atualmente, a isenção do IR vale apenas para que ganha até R$ 2.824 mensais. Segundo a Unafisco, a proposta do governo federal “beneficiaria aproximadamente 9,6 milhões de brasileiros, elevando o total de isentos para cerca de 26 milhões de contribuintes”.
A estimativa de impacto fiscal realizada pela associação dos auditores fiscais é maior do que a do governo federal, que projeta que a medida terá impacto fiscal de aproximadamente R$ 35 bilhões por ano.
A Unafisco lembra, no entanto, que “o governo busca formas de compensar a renúncia fiscal, incluindo a possibilidade de aumentar a tributação sobre rendas mais altas”.
A proposta da União é estabelecer uma alíquota efetiva mínima de imposto de 10% sobre os rendimentos de todas as pessoas físicas que ganham mais de R$ 50 mil mensais, incluindo rendimentos sobre os quais atualmente não incide tributação ou incide uma tributação menor do que a do IR, como lucros e dividendos.
Ano termina sob a dúvida de como será a atividade em 2025 / Economistas se dividem sobre tamanho do impacto da deterioração do cenário interno nas últimas semanas sobre desempenho do setor privado- Valor 26/12
Por Lu Aiko Otta — De Brasília
O ano de 2024 foi ruim em termos de expectativas, mas ótimo em termos produtivos. O resumo foi feito pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em almoço da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), no início de dezembro. Mas para 2025, a pergunta é: quanto o clima ruim na economia neste final de ano, que já se reflete em juros mais elevados, afetará a economia privada?
Os mais pessimistas falam em recessão. É o caso do economista André Perfeito. “Ninguém está calculando a segunda derivada das próprias projeções”, disse, referindo-se aos colegas economistas. Ele acredita que o nível de juros sinalizado pelo Banco Central (BC) em novembro “necessariamente” aponta para um encolhimento da economia.
No café da manhã com a imprensa ocorrido na sexta-feira (20), Haddad foi questionado com insistência sobre o cenário para 2025, diante da alta de juros e seus impactos na redução do crédito e do investimento.
Deixou de ser evasivo na terceira vez, e foi econômico em seus comentários. “Acredito que esse ciclo de alta dos juros vai fazer efeito rápido na economia”, avaliou. “Se a trajetória da inflação começar a ser de queda, o Banco Central vai calibrar trajetória da taxa de juros”, disse. Ele acrescentou que o Ministério da Fazenda já projetava um crescimento menor no ano que vem: 2,5%, ante possíveis 3,5% este ano.
Mas essa projeção foi feita em meados de novembro, antes de o BC anunciar, no último dia 11, uma alta de um ponto percentual na taxa de juros Selic e dizer que haverá mais dois aumentos da mesma magnitude em 2025, de forma que em março do ano que vem a taxa em março deverá chegar a 14,25%.
O dólar acima de R$ 6 no fim de 2024, o choque nos juros e a corrida do BC para estabilizar a cotação da moeda americana, marcas do mês de dezembro, ofuscaram os bons resultados que a economia alcançou no ano: crescimento estimado em 3,5% no ano; taxa de desemprego em 6,2%, menor nível da série; rendimento real mensal em nível recorde; e concessões de crédito avançando 26,6% no ano.
No campo social, a extrema pobreza caiu abaixo de 5% pela primeira vez na história. No comércio exterior, foi fechado um pré-acordo entre Mercosul e União Europeia, com chances de encerrar um processo negociador que se arrasta há 25 anos. Foi ainda aprovada a regulamentação da reforma tributária, abrindo o caminho para o início de sua implementação.
A economia privada em boa forma trava um cabo de guerra com as expectativas ruins, na visão do economista-chefe da Tullett Prebon Brasil, Fernando Montero. A situação seria diferente se a política fiscal não tivesse sido tão decepcionante. Um ajuste crível nas contas públicas teria poupado a economia do choque de juros, avalia.
Há cautela mesmo num setor menos sensível às turbulências de curto prazo da economia, que é o de infraestrutura. “Os aumentos de juros programados dão um breque na economia, não há dúvida”, comentou Roberto Figueiredo Guimarães, diretor da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).
Os projetos em infraestrutura que estão em andamento e cuja estrutura de financiamento já foi definida serão menos impactados. Porém, o juro elevado encarecerá aqueles que estão em fase de estruturação, tornando-os menos atraentes, avaliou. De acordo com o Livro Azul da Infraestrutura, são cerca de 500 projetos que somam R$ 750 bilhões.
A própria estimativa oficial diz que 2025 será um ano de desaceleração. A reação do governo a esse ambiente de menor crescimento, menos emprego, menos crédito, menos investimentos é uma incógnita na cabeça dos economistas. Assim, entrou no radar uma possível alteração no arcabouço fiscal, para abrir espaço para mais despesas e contrapor o ciclo de baixa.
Essa ideia é negada na área econômica, que, afinal, acabou de sair de uma dura batalha com a ala política do governo para produzir medidas de ajuste destinadas a dar sustentabilidade ao arcabouço. Porém, a própria dificuldade enfrentada por Fazenda e Planejamento na formatação do pacote de ajuste indica que a ideia de afrouxar a regra fiscal poderá ganhar força em 2025 e, principalmente, no ano eleitoral de 2026.
O embate entre modelos de desenvolvimento dentro da equipe de governo não foi resolvido em 2024 e deverá marcar os próximos dois anos.
A política fiscal frouxa, que tolera crescimento da dívida pública no curto prazo, esteve no centro das atenções do mercado financeiro no ano que se encerra. O contínuo aumento dos juros de mercado reflete como a confiança foi se deteriorando a cada sinal de dificuldade do governo em conter o avanço das despesas.
Do ponto de vista da política fiscal, o ano de 2024 teve três fases. Ao longo do primeiro semestre do ano, o arcabouço fiscal foi colocado em xeque pela ala política do governo e pelo cenário externo. Internamente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ficar “irritado” com a discussão sobre a meta de zerar o déficit nas contas públicas.
No campo externo, os cortes nas taxas de juros dos Estados Unidos não ocorreram nem no prazo, nem na magnitude esperados, o que levou a um cenário negativo para economias emergentes como o Brasil.
O governo foi derrotado, também, em seu plano de acabar de imediato com o Perse, programa de apoio ao setor de eventos, e com a desoneração da folha salarial de 17 setores intensivos em mão de obra, programa de substituição tributária defendido por empresas e trabalhadores para manter empregos formais. Não fosse por isso, repete Haddad, as contas deste ano fechariam com déficit zero.
Diante desse cenário, a opção foi reduzir as metas de resultado das contas públicas. Passaram a ser de zero em 2024, zero em 2025 e 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2026. Quando o arcabouço foi anunciado, as metas eram zero este ano, 0,5% do PIB em 2025 e 1% do PIB em 2026. Na época, a cotação do dólar saltou de R$ 5,00 para R$ 5,40.
A crise teve algum alívio em julho, quando Haddad arrancou de Lula três autorizações: congelar algumas despesas do orçamento de 2024, cortar despesas em 2025 por meio do pente-fino e estudar medidas de ajuste estrutural para 2026 em diante. Começou aí uma segunda fase do ano.
Junto, veio a pacificação das relações com o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, até então uma espécie de líder da ala desenvolvimentista do governo. Ele aderiu ao pente-fino para conseguir mais verbas para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Em outubro, a agência de classificação de riscos Moody’s elevou a nota do Brasil, deixando-a a um degrau do “grau de investimento”. Indicou que uma nova alta poderia ocorrer em breve, a depender da confirmação da trilha de crescimento econômico e da adoção de novas medidas de ajuste que dessem solidez ao arcabouço.
O pacote estudado pela área econômica era bem mais duro do que o que foi anunciado. Por exemplo, estava sobre a mesa uma possível desindexação de benefícios sociais (exceto aposentadorias) em relação ao salário mínimo. Alterações nos pisos de gastos com saúde e educação também foram analisadas, assim como a redução de gastos com o Fundeb e o seguro-desemprego.
As dificuldades políticas em avançar com as medidas ficaram evidentes quando o pacote não saiu imediatamente após o segundo turno eleitoral, como havia sido sinalizado.
A terceira fase do ano veio com o anúncio do pacote de gastos. Além de pré-desidratado, veio acompanhado de uma medida que sinalizou na direção oposta: a proposta de elevar o limite de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para R$ 5 mil. No final da manhã de 27 de novembro, o Valor Pro, serviço de informações em tempo real do Valor, informou que os dois conjuntos poderiam ser anunciados simultaneamente. Pela primeira vez, a cotação do dólar chegou aos R$ 6,00.
Haddad era contra juntar as duas coisas, mas foi voto vencido. Ainda coube a ele fazer o duplo anúncio, em cadeia de rádio e TV.
Mesmo aquém do esperado, o pacote poderia ter funcionado, se conseguisse ser visto como algo capaz de minimamente ajustar as contas públicas. “A expectativa do ajuste faz 90% do ajuste”, diz Montero. Isso, somado à economia privada que está “um brinco”, poderia colocar a economia brasileira em um ciclo positivo, avalia.
A virada na expectativa em relação à política fiscal e seu reflexo nos juros são a marca da economia brasileira, avalia a economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena Veronese. “Eu acho que foi um ano de muita surpresa, especialmente na política monetária”, avalia. A expectativa era uma taxa Selic na casa dos 8% ou 9%, quando veio a revisão das metas e, depois, um pacote de ajuste “vem, não vem”. A “reviravolta fiscal” foi uma surpresa, acredita. “Parece que o mercado deixou de dar o benefício da dúvida para o governo.”
É baixa a probabilidade de haver um sinal mais assertivo em direção ao ajuste. “Temer era o teto de gastos, Bolsonaro era o Paulo Guedes e o Lula é o Lula”, diz Montero.
Em seu encontro de fim de ano com a imprensa, Haddad reconheceu que há uma disputa em torno do ajuste fiscal. Acrescentou que o consenso em torno de sua necessidade “é maior do que um ano atrás”. Porém, persiste a pressão da direita, que não quer aumento nos impostos, e da esquerda, que não quer redução das despesas. “Como fecha as contas?”, questionou.
O ministro parecia cansado. Porém, se mostrou satisfeito com a aprovação do pacote de ajuste fiscal, após um esforço concentrado do Congresso Nacional, que se encerrou naquele dia. Ele se comparou a um corredor ao final de uma maratona, para quem importa ter chegado ao final, e nem tanto se vai ou não subir no pódio.
Crédito alimenta atividade, mas tem fôlego curto – Valor 26/12
O mercado de crédito no Brasil descolou das condições financeiras gerais e tem gerado um importante impulso para a atividade econômica em 2024. Olhando à frente, porém, com a forte e rápida deterioração de componentes das condições financeiras, como câmbio e juros, é improvável que esse impulso se sustente por muito tempo ao longo de 2025, dizem economistas, contribuindo para a esperada desaceleração da atividade no ano que vem.
Estudo do Santander mostra que o impulso de crédito no Brasil está em aproximadamente 4% do PIB. O indicador é medido pela diferença entre novas concessões e pagamentos (juros e amortizações) em 12 meses, como porcentagem do PIB. Ele representa quanto de dinheiro está saindo do sistema financeiro em direção ao “sistema real”. “É quanto, de fato, o sistema financeiro está impulsionando a economia”, diz o economista Henrique Danyi, autor do estudo.
O exercício parte de metodologia divulgada pelo Banco Central em 2021 e de uma estimativa própria para a série de pagamentos de créditos. O estudo apresenta duas abordagens para o impulso de crédito: “top-down”, que considera a análise agregada dos principais segmentos (crédito para pessoa física e jurídica, livre e direcionado) e “bottom-up”, que detalha cada modalidade com dados disponíveis, como rotativo e para veículos.
“Na metodologia ‘top-down’, o impulso está nas máximas históricas da série, que a gente consegue estimar desde 2012”, diz Danyi. “Na metodologia ‘bottom-up’, e ainda está atrás do fim de 2017 e início de 2018”, acrescenta.
Apenas pela análise agregada, a impressão é que o impulso de crédito vem sendo puxado pelas categorias livres, com peso mais ou menos igualmente distribuído entre pessoa física e jurídica. Com análise mais detalhada, porém, o Santander observou que o impulso do crédito livre à pessoa física ainda está negativo. Isso não é, segundo Danyi, necessariamente ruim, porque tem havido alto volume de pagamentos de cheque especial por parte das famílias.
“O impulso de crédito de outras modalidades da pessoa física está forte. O de cheque especial não está forte, está tendo muito pagamento, porque há renda disponível nas famílias”, afirma. “Parece que está saindo dinheiro do sistema real para o financeiro, mas o impulso do crédito livre da pessoa física sem considerar o cheque especial estaria positivo em mais de 1% do PIB. Então, parece negativo, mas a qualidade é muito boa, porque há pagamento elevado de uma modalidade caracterizada por muito risco e juro no teto”, diz.
A análise detalhada mostra que a contribuição positiva do impulso de crédito da pessoa jurídica não tem uma qualidade tão boa assim, porque boa parte é explicada pela antecipação de fatura de cartão para as empresas. “É um impulso 100% dependente de demanda. Enquanto tiver demanda, ele vai ser forte. Mas, se a demanda sumir por algum motivo, se desacelerar o consumo via cartão de crédito na economia, esse impulso vai acabar caindo rápido”, afirma.
A expectativa é que o crédito em geral pudesse ter desacelerado já no segundo semestre deste ano, o que não aconteceu, observa Bruno Martins, economista do BTG Pactual. “Houve piora grande das condições financeiras desde abril, mas a parte associada ao crédito não sofreu tanto quanto outros indicadores, o que foi surpresa”, afirma.
Para ele, houve certo “otimismo” no crédito à pessoa física do lado da oferta, com indicadores como prazos, taxas de juro e garantias de exigência de entrada (no financiamento de bens) sem acompanhar a piora das condições financeiras. “Em veículos, por exemplo, os bancos aceitam financiar cada vez mais parcelas maiores. Hoje, pouco mais de 40% das operações novas de veículos têm bancos financiando mais de 80% do valor do automóvel”, afirma.
Essas “idiossincrasias”, diz, indicam que a oferta de crédito tem se expandido, apoiada no avanço da renda das famílias, que, por sua vez, se sustenta pela expansão fiscal e pelo mercado de trabalho aquecido.
No estudo do Santander, ambas as métricas de impulso vinham caindo até o fim de 2023. Depois começaram a acelerar. “Essa volta coincidiu com o início da queda das inadimplências. A intuição é que a atividade estava forte, a renda estava alta, havia disposição para fornecer linhas de crédito, mas a inadimplência também estava elevada, por isso, não davam. Quando começou a cair a inadimplência, o impulso de crédito se recuperou bem”, diz Danyi.
O problema é que uma inadimplência ao redor de 5,5% como no crédito livre às famílias, ainda é considerada historicamente alta pelos economistas, mesmo que tenha arrefecido em 2023. “Teve melhora da inadimplência desde o ano passado, mas a gente já esperava que ela fosse andar de lado neste ano, foi o que aconteceu. É um ponto a observar”, afirma Danyi.
Diante do forte crescimento da renda e da taxa de desemprego em mínimas históricas, era para a inadimplência da pessoa física estar menor, diz Martins, do BTG. “O que significa que ainda tem muito endividamento das famílias. É um risco relevante”, afirma. “Isso, aliado à questão de que alguns linhas estão com menores garantias, é um ponto de muita atenção.”
Além disso, diz Danyi, costuma haver relação entre a taxa de juros e a inadimplência: quanto mais alta uma, maior a outra. Dado o aperto monetário esperado para o ano que vem, a “intuição” é que o impulso de crédito à atividade não deve sustentar os níveis atuais, afirma. “ É muito difícil sustentar esse nível de concessões e de pagamentos extraordinários para a frente.”
Soma-se a isso a piora nas expectativas de inflação, que também sinalizam risco para a dinâmica da renda disponível das famílias, diz Martins. “Se continuar nessa toada, com inflação de alimentos muito alta, a renda tende a cair. Então, podemos ter um efeito no mercado de crédito que vai desacelerar por causa da Selic mais alta e ainda uma renda caindo, porque a inflação está subindo. Fico preocupado, mas vejo os bancos também começando a segurar a euforia”, afirma.
Segundo ele, dada a piora de fatores que compõem as condições financeiras, como câmbio e juros, nas últimas semanas, já é possível observar alguns movimentos iniciais de bancos no sentido de revisar parâmetros de concessão de crédito e pisar no freio. “A expectativa é que, em algum momento, isso vai chegar no crédito em 2025.”
Quanto mais demorar para o crédito sentir os efeitos da política monetária mais restritiva, pior será para a atividade, diz Martins. “Quando acontece, pode ser um solavanco grande. A ideia é que seja de forma suave. Por enquanto, o cenário-base é esse. Os bancos estão com folga, não há risco sistêmico. A expectativa é que o crédito vá desacelerar, o que é saudável. É o que todo mundo está esperando para que possa haver, depois, queda de juros e resposta dos investimentos, para a gente não ficar com uma economia muito impulsionada por expansão fiscal e crédito, o que para o crescimento sustentável é ruim”, afirma.
Risco Brasil supera os 200 pontos e sobe à máxima desde maio de 2023 / Deterioração de expectativas na seara fiscal faz do país destaque negativo entre os principais mercados emergentes- Valor 26/12
Victor Rezende / Arthur Cagliari
O risco Brasil medido pelo spread dos contratos de cinco anos de Credit Default Swap (CDS) superou a marca simbólica dos 200 pontos e atingiu os maiores níveis desde maio de 2023, afetado por uma piora relevante na percepção de risco doméstico. De acordo com dados da S&P Global, o CDS de cinco anos do Brasil ficou em 200 pontos na segunda-feira (23), após ter subido a 219 pontos na última quinta-feira, 19 de dezembro.
No movimento mais recente, o Brasil é destaque de piora entre os principais mercados emergentes. Desde o início de dezembro, houve um salto de 21,9% do CDS de cinco anos do Brasil, uma disparada que não se verificou em outros mercados, como México (+5,4%), Colômbia (+4,4%), África do Sul (+3,8%) e Turquia (+2,1%).
“O CDS estava muito tranquilo, mas começou a ‘andar’ agora, diante de uma persistência na piora da percepção de risco que temos visto”, nota o economista Marco Antonio Caruso, do Santander.
Para combater os efeitos do risco fiscal, o mercado tem embutido nos preços dos ativos a chance de uma política monetária muito mais restritiva à frente, o que levou a taxa de juros real ex-ante a encostar no nível de 10%, no maior patamar desde outubro de 2008. Nos cálculos do Valor Data a partir do swap de juro de 360 dias e das expectativas de inflação de um ano extraídas do boletim Focus, o juro real chegou a 10,2% e fechou a semana passada em 9,52%.
“No atual ambiente de desancoragem das expectativas, com o câmbio pegando nos preços de ‘tradables’, até os preços mais inerciais vão sentir pressão. E, juntando isso com a sinalização do BC, vemos um pico de 15,5% nos juros”, projeta Caruso. Na visão do Santander, após duas altas de 1 ponto na Selic em janeiro e março, o BC deve entregar um aumento de 0,75 ponto, seguido de mais um de 0,5 ponto.
“Não acredito que as condições macroeconômicas para parar de subir os juros vão estar dadas. Não sei se o Focus vai ter melhorado, mas o gatilho para essa pausa pode ser a ‘sensação térmica’ de que a atividade vai sofrer uma boa piorada”, avalia Caruso. Nos cálculos do Santander, o PIB deve crescer 1,8% no próximo ano, em um cenário que contempla uma forte desaceleração no segundo semestre.
Para o banco, o aperto das condições financeiras - evidenciado pela taxa de juro real bastante elevada - se soma, ainda, a um impulso fiscal que deve passar a ser negativo no próximo ano e a um impulso de crédito que deve diminuir. “O crédito está a todo vapor e as famílias não se desalavancaram ainda, o que pode ser um fator de preocupação à frente. Por uma mudança na resolução do CMN, talvez vejamos uma mudança relevante no impulso de crédito, já que as provisões para devedores dos bancos devem ser bem mais apertadas”, diz Caruso.
Na avaliação do economista-chefe para Brasil do Barclays, Roberto Secemski, embora a poeira ainda não tenha baixado, a espiral recente no sentimento do mercado “pode ser interrompida pela aprovação de projetos de lei no Congresso na semana passada, combinados com a pesada intervenção cambial pelo Banco Central e comentários do futuro presidente da autarquia, Gabriel Galípolo, de que vê uma barra alta para modificar a prescrição futura do Copom para duas altas adicionais de 1 ponto”.
Secemski, contudo, alerta que um real mais fraco por um período sustentado, e em meio a preocupações fiscais persistentes, “deve levar a inflação para cima nos próximos meses e trimestres”. O Barclays elevou sua estimativa para a Selic no fim do ciclo de aperto monetário de 14,25% para 15,25% e espera alguma flexibilização na política monetária somente em 2026.
O economista alerta, porém, que uma melhora significativa no sentimento do mercado “dependeria do anúncio de novas medidas fiscais críveis para reduzir os níveis totais de gastos e efetivamente restaurar o superávit primário”. Secemski acredita que ações adicionais do governo são “improváveis” no curtíssimo prazo, mas dá destaque ao vídeo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) divulgado na semana passada, em que ele apontou que o governo continuará atento à necessidade de novas medidas fiscais.
Problemas de Lula com mercado e Congresso adiaram para 2025 promessa de colher resultados- O Globo 26/12
Malu Gaspar
O horizonte parecia limpo para o governo ao final de 2023. O Congresso tinha aprovado a reforma tributária, e o Brasil recebido um upgrade na classificação da agência de risco S&P. O dólar, em queda, valia R$ 4,86. A Bolsa estava em alta. Os parlamentares aprovaram o Orçamento com valor recorde para emendas.
O Supremo, que ainda não havia tentado dar um freio nessa ousadia, ajudou o Executivo em temas cruciais. Entre outras coisas, manteve o drible na Lei das Estatais para que políticos ocupassem cargos de confiança e abriu uma arbitragem empurrando com a barriga a briga entre União e Eletrobras que poderia desfazer parte do contrato de privatização — mas causar estrago na imagem do governo no mercado.
Com o inquérito da trama golpista caminhando para um desfecho, Bolsonaro parecia encurralado, política e juridicamente. Aliviado, Lula celebrou numa amena confraternização com os comandantes das Forças Armadas.
Na primeira oportunidade, o presidente lançou um bordão que repetiria várias vezes nos meses seguintes. Chamando 2024 de “o ano da colheita”, ele disse: “Vamos colher o que nós plantamos em 2023 e vamos plantar novas coisas para 2024, que vamos colher em 2025”.
O cenário com que se termina 2024, porém, é bem diferente do previsto.
O ajuste fiscal prometido ao longo do ano não veio, os juros voltaram a subir, o dólar passou dos R$ 6, e a Bolsa caiu. A relação dívida/PIB subiu de 74,3% para 78%.
As estatais anunciaram prejuízo recorde, mas, segundo a ministra da Gestão, Esther Dweck, foi só porque têm investido muito. O Supremo tentou conter a farra das emendas — mas, desta vez, o governo se uniu ao Congresso para dar uma rasteira nos ministros e liberar o que fosse possível para aprovar o pacote desidratado de Haddad. Ele, que em 2023 impôs sua agenda, encerra 2024 como um ministro fraco.
O inquérito do golpe avançou com a prisão de oficiais do Exército que, no limite, consideravam sequestrar Alexandre de Moraes e matar Lula e Alckmin. Braga Netto, símbolo do golpismo, está na prisão. E, com tudo isso, os militares escaparam dos poucos cortes que o governo conseguiu aprovar no Congresso.
Bolsonaro continua na berlinda, mas o desempenho da direita nas eleições municipais passou um duro recado ao lulismo: economia crescendo, desemprego caindo e ganhos reais no salário mínimo não são mais suficientes para assegurar a vitória nas urnas.
Para além da polarização ideológica, ficou claro que o governo não sabe dialogar com o novo trabalhador brasileiro, sua aspiração empreendedora e sua lógica anti-Estado. A última tentativa, anunciar uma isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, não passou de miragem que só serviu para causar estresse no mercado.
O último Datafolha mostrou que a aprovação de Lula é semelhante à que Bolsonaro tinha nesta mesma altura de seu governo, em plena pandemia. Ainda assim, Lula disse ao Fantásticoque “tudo o que foi planejado a gente fazer até agora está cumprido. Tudo. Tudo”.
Irritado com uma pergunta sobre o ceticismo do mercado quanto ao pacote fiscal de Haddad e a alta do dólar, chamou as preocupações do mercado de “bobagem” e disse que “ninguém neste país, do mercado, tem mais pontos de habilidade fiscal do que eu”.
Afirmou também que o Brasil não tem problema fiscal, e “a única coisa errada neste país é a taxa de juros estar acima de 12%”. Dias depois, ele mesmo recuou numa live à Bolsonaro na biblioteca do Palácio da Alvorada, garantindo que não intervirá no Banco Central na gestão do presidente nomeado por ele, Gabriel Galípolo.
Era tarde. Como presidente de terceiro mandato, Lula está cansado de saber que, nesse negócio de administrar um país, as expectativas contam muito. Ninguém precisa dizer a ele que o problema no mercado não é propriamente a inflação ou o crescimento do PIB, e sim o temor de que seu governo aumente demais o endividamento e sacrifique as contas públicas em nome de alguma gastança ineficiente.
Claro que a missão hoje é diferente e talvez mais difícil. A herança bolsonarista foi pesada, o país está mais complexo, a extrema direita é forte, o antipetismo também. Mas terminar dessa forma um ano que era para ter sido de fartura surpreende e desanima.
Lula, porém, agora promete que a esperada colheita virá em 2025. Diante do que se viu em 2024, convém manter o pé atrás.
Tarcísio prevê 2025 difícil na economia e quer reforçar ajuste fiscal em SP / Governador diz a aliados que inflação alta deve levar a desaceleração no segundo semestre, o que pode afetar investimentos- Painel – Folha SP 26/12
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), tem feito previsões de que 2025 será um ano difícil na economia, que poderá ter impacto negativo nos investimentos do estado.
Nos relatos, o governador tem mostrado preocupação com a disparada do dólar, mesmo com intervenções no câmbio pelo Banco Central. Isso, avalia, seria reflexo da perda de credibilidade do governo Lula na questão fiscal, que estaria fora de controle.
O resultado, nas previsões do chefe do Executivo paulista, seria inflação em alta no ano que vem, o que em um primeiro momento até geraria uma ampliação artificial das receitas do estado.
Numa segunda etapa, no entanto, a economia deve sofrer uma desaceleração forte, provocada pela alta dos juros, o que geraria pressão sobre o caixa do estado e desestimularia investimentos privados.
Apontado como possível candidato da direita à Presidência em 2026, Tarcísio tem reforçado que a manutenção da saúde fiscal do estado é uma prioridade de seu governo. É provável que seja necessário segurar investimentos e gastos, especialmente na segunda metade do ano.
Por essa razão, ele pretende reduzir renúncias fiscais, o que gera resistência de setores afetados. Um exemplo atual é a pressão de bares, hotéis e restaurantes contra o fim da redução de ICMS a partir de janeiro.
Renegociação da dívida leva Romeu Zema a mudar de tom sobre antigas promessas de privatizar companhias públicas / A aprovação de um projeto de seu adversário político — o presidente do senado, Rodrigo Pacheco (PSD) — mudou drasticamente o discurso do governador, que agora fala em federalização- O Globo 26/12
Luísa Marzullo
No apagar das luzes da primeira metade de seu segundo mandato em Minas Gerais, o governador Romeu Zema (Novo) dá sinais de que pode abandonar uma das suas pautas prioritárias: as privatizações. A aprovação de um projeto de seu adversário político — o presidente do senado, Rodrigo Pacheco (PSD) — mudou drasticamente o discurso do governador.
Na última terça-feira, o Senado aprovou, por unanimidade, o projeto que trata da renegociação das dívidas públicas dos estados com a União. Hoje no Regime de Recuperação Fiscal (RRF), devendo cerca de R$ 165 bilhões, Minas Gerais deve aderir ao plano que zera os juros.
Entre as possibilidades de abatimento de juros, o projeto prevê que a entrega de ativos pode melhorar as condições de renegociação. Por este motivo, Zema avalia a possibilidade de transferir três companhias — Cemig (Energia), Copasa (Saneamento) e Codemig (Desenvolvimento Econômico) — em troca de 42% da dívida.
— O que nós queremos é que a União considere os ativos do estado, que serão transferidos à mesma, e o valor abatido. No caso de Copasa e Cemig, esse valor é de mais fácil definição, porque são empresas abertas, cotadas em bolsa de valor, você tem um valor muito mais objetivo. E nós temos ainda a Codemig, que queremos também colocar no pacote — disse Zema, após acompanhar a aprovação do texto em Brasília.
Propostas na Assembleia
O discurso em favor da federalização entra em rota de colisão com posições recentes do governador. Há um mês, em 14 de novembro, Zema enviou dois projetos à Assembleia Legislativa para privatizar a Cemig e a Copasa. Na ocasião, interlocutores de sua gestão colocaram as propostas na lista de prioridades para 2025. Associado a isso, seu secretário de Governo, Gustavo Valadares, teve reuniões com os parlamentares sobre o tema.
Esses dois textos se somaram a outras tentativas de acenos a essa pauta enviadas ao Legislativo. Desde o ano passado, o governo tenta retirar a necessidade de um referendo popular antes das privatizações. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC), contudo, está parada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Já no mandato passado, o projeto que previa a privatização da Codemig terminou arquivado pela Casa.
Nos corredores da Assembleia Legislativa, deputados da base e da oposição ouvidos pelo GLOBO interpretam este sinal trocado de duas formas: o governador pode ter percebido que as privatizações não seriam aprovadas e, por isso, trocou de rota, ou irá utilizar este aceno político para legitimar seu plano original, sob a alegação de que houve desinteresse por parte do governo federal.
Há uma avaliação interna de que as privatizações seriam impopulares, o que foi inclusive atestado por uma pesquisa Quaest deste mês, no caso da Copasa. Segundo a amostra, 51% dos mineiros seriam contrários à desestatização.
Já a federalização encontrou mais coro dentro e fora do Parlamento. Um projeto do deputado oposicionista Professor Cleiton (PV) que previa o repasse da Cemig e da Copasa recebeu elogios, até mesmo, do líder de governo, João Magalhães (MDB).
— Eu não sei se o governador vai aceitar a proposta, inclusive fui o primeiro a colocá-la em evidência em uma entrevista na TV ALMG. Acho que seria plenamente viável e (Zema) conseguiria uma arrecadação bem superior do que passar para a iniciativa privada — disse Magalhães no ano passado. Momentos depois, voltou atrás. Em nota, afirmou não ter se expressado bem .
Além da Cemig e Copasa, Professor Cleiton apresentou uma proposta paralela que contemplava a Codemig junto a uma PEC que possibilita a cessão das lavras, caso a companhia seja federalizada. Ao GLOBO, o parlamentar relatou que o governo nunca apresentou interesse em suas propostas, de fevereiro de 2023.
AGU aciona BC para que Google preste esclarecimentos sobre cotação do dólar / Busca exibia cotação de R$ 6,38 no início da tarde desta quarta-feira, acima do registrado no fechamento da última sessão- Valor 25/12
Isadora Peron / Estevão Taiar / Arthur Cagliari
A Advocacia-Geral da União (AGU) acionou nesta quarta-feira (25) o Banco Central (BC) para que o Google preste esclarecimentos sobre por que exibiu a cotação do dólar hoje com um valor diferente do registrado no fechamento da última sessão.
Durante o dia, a página do buscador chegou a mostrar a cotação em R$ 6,38, mas o mercado à vista no Brasil não opera hoje devido ao recesso de Natal.
Segundo a AGU, os dados enviados pelo BC irão subsidiar eventual atuação da Procuradoria-Geral da União em relação à empresa. “A atuação da Advocacia-Geral da União tem como objetivo combater a desinformação de dados econômicos de grande relevância para a sociedade brasileira”, afirmou o advogado-geral da União, Jorge Messias.
Ele lembrou que essa não é a primeira que vez que isso acontece. Em novembro, o Google mostrou de maneira incorreta que o dólar havia chegado a R$ 6,18, enquanto o câmbio girava em um valor abaixo de R$ 6.
Segundo o órgão, o objetivo é esclarecer eventuais inconsistências no valor apresentado na plataforma digital, pois o último fechamento registrou o dólar cotado a R$ 6,18. Além disso, destacou que o câmbio Ptax, que é a cotação oficial no Brasil, não foi definido nesta quarta-feira devido ao feriado. “De fato, causa estranheza que, em pleno feriado de 25/12, data sem Ptax, ocorra uma disparidade de informações relacionadas à cotação da referida moeda”, afirma o documento enviado ao BC.
A AGU solicitou ao Banco Central informações sobre a cotação do dólar no Brasil nesta quarta-feira; valor da moeda americana em outros países na mesma data; bem como se a cotação em outros países pode impactar o valor da moeda brasileira no feriado.
Segundo uma fonte do órgão, o Google já tirou a informação do ar, mas, mesmo assim, eles terão que explicar o aconteceu. A principal suspeita é que a empresa esteja usando uma fonte não confiável para gerar o valor da cotação.
Fontes que acompanham as discussões destacam que, em casos semelhantes, o BC costuma apresentar uma resposta “padrão”, destacando que a taxa oficial de câmbio é a Ptax, que por sua vez não foi calculada hoje por causa do feriado. Procurado, o BC afirmou que não comenta o tema.
Em nota, o Google afirmou que trabalha para garantir “precisão” aos valores exibidos em seu site. “Os dados em tempo real exibidos na Busca vêm de provedores globais terceirizados de dados financeiros. Trabalhamos com nossos parceiros para garantir a precisão e investigar e solucionar quaisquer preocupações.”
O dólar tem subido desde meados de novembro, passando pela primeira vez em termos nominais da barreira dos R$ 6. Diversos agentes de mercado e especialistas em contas públicas vêm atribuindo o movimento à elevação das incertezas fiscais.
Conforme divulgado na segunda-feira (23) pelo BC, o fluxo cambial está negativo em US$ 14,699 bilhões em dezembro, nos dados parciais até o dia 19. Na semana passada, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse que a autoridade monetária vinha observando neste mês a “saída [sazonal] de recursos de dividendos e [também de] pessoas físicas em valor menor”, nesse último caso por meio de plataformas de investimento.
ESTADÃO: 'PRECISAMOS DE UM CHOQUE DE CREDIBILIDADE', DIZ ESTRATEGISTA DO ITAÚ- 26/12
Nicholas McCarthy entrou no Itaú Unibanco em outubro de 2016 para ser diretor de investimentos do Private Bank. Em 2022, passou a comandar a área de investimentos do segmento de Wealth Management and Services do banco privado, o maior do Brasil, onde permanece até hoje.
Nesses oito anos e três meses, atravessou o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), a queda colossal dos mercados com a pandemia da covid-19, assim como a recuperação mesmo que parcial das Bolsas após a crise sanitária. Com uma postura otimista em relação ao mercado brasileiro e pragmática com o restante do mundo, ele não caiu, por exemplo, no conto da “recessão nos EUA”, cogitado entre 2022 e 2023. Mas desta vez é diferente.
“Estamos com a menor exposição em Bolsa (brasileira) dos últimos oito anos”, afirma McCarthy. A recomendação atual para investidores moderados é de que até 5% da carteira seja voltada a ações brasileiras, equivalente a posição “-2” na escala da instituição. O próximo passo, “-3”, equivale a zerar a indicação para a classe de ativos. O que, por ora, não é uma opção, pois a Bolsa está “barata”, ainda que não haja sinal de grande recuperação. “Precisamos de um choque de credibilidade”, afirma.
A cautela de McCarthy acontece em função da deterioração rápida e profunda dos ativos brasileiros, em especial nos últimos 30 dias. No fim de novembro, o governo apresentou as medidas que fariam parte do pacote de corte de gastos, ansiosamente esperado pelo mercado, que já via com preocupação o aumento da dívida pública.
O anúncio decepcionou e não exatamente pelas medidas. Junto às iniciativas para contenção fiscal, o ministro Fernando Haddad (PT) incluiu a apresentação de uma proposta que vai na contramão e eleva os gastos da União: a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil. A contraparte, aumento da tributação para aqueles que recebem acima de R$ 50 mil, não fechou a conta.
A partir desse momento, a credibilidade do Executivo foi colocada em dúvida e há pouca confiança de que haverá uma mudança de trajetória. E sem controle da dívida, as expectativas para os juros e para a inflação sobem. Até qual patamar? “Não temos visibilidade sobre a inflação de 2025”, diz McCarthy.
DÓLAR. Sem isso, diz o diretor do Itaú, os grandes investidores estrangeiros e locais levam seus dólares para outros países, o que impulsiona a cotação da moeda, em alta globalmente.
Na segunda-feira, a divisa estrangeira voltou a subir. A moeda americana fechou com alta de 1,86%, cotada em R$ 6,18. Diferentemente do que aconteceu na semana passada, na segunda-feira, o Banco Central (BC) não realizou leilões para segurar a alta. Só neste mês, o BC injetou US$ 27,7 bilhões no mercado para tentar conter a valorização da divisa. Após o fechamento do mercado, porém, a autoridade monetária anunciou um leilão à vista de até US$ 3 bilhões para quinta-feira, 26.
“Precisa ter visão para os investimentos voltarem, para controlar a inflação e cair os juros. O Brasil está fora do radar”, diz o diretor de estratégia, que se diz “triste” com a situação, mas não vê irracionalidade no comportamento do mercado.
Para ele, o salto dos juros futuros para até 16% ao ano, o que seria o maior patamar desde 2006, é uma tentativa dos investidores precificarem uma inflação bastante acima da meta, de 3%. Um cálculo feito às cegas, afirma ele, pois não há clareza sobre o cenário fiscal.
Para McCarthy, a conjuntura atual é parecida com o segundo mandato da ex-presidente Dilma. Segundo ele, porém, houve alguns avanços, como as reformas, mas a relação dívida/PIB é muito pior.
Hoje, além da menor fatia em Bolsa brasileira em oito anos, o Itaú também reduziu a exposição a prefixados para “-1”, o que significa uma recomendação de 10% para o investidor moderado e 14% para o arrojado. Os títulos públicos estão desvalorizando devido aos aumentos sucessivos das rentabilidades dos novos papéis emitidos pelo Tesouro Nacional.
EFEITO TRUMP. Para McCarthy, apostar no dólar versus real também não é a recomendação. O novo mandato de Donald Trump gera incertezas e pode vir a fortalecer a moeda americana caso o candidato leve à frente suas promessas. O que seria o maior risco para os mercados globais em 2025 e, inclusive, poderia desembocar em uma recessão. Não é o cenário-base de McCarthy, que diz acreditar que Trump será moderado.
A visão mais otimista dele fica com os títulos IPCA+, que pagam a variação da inflação mais uma taxa prefixada. Ainda que também estejam sofrendo desvalorizações com os sequenciais aumentos dos juros reais dos novos títulos, são uma forma de manter o poder de compra no longo prazo. Contudo, ele diz que não é o IPCA+ a grande estrela do momento. “Os investidores me perguntam onde investir. E o que eu posso falar?”, diz. “Eu falo: aplica no CDI.”
McCarthy, porém, não perde a confiança. Ele afirma que com uma sinalização mais forte de compromisso fiscal a Bolsa poderia subir “30% em uma semana”. (Jenne Andrade, E-Investidor)
Solange Srour- 2025 começa como se esperava terminar / Cenário volátil gerado por incertezas fiscais de ano pré-eleitoral já se materializou- Folha SP 26/12
Escrevo minha última coluna do ano com o tema que imaginei abordar em dezembro de 2025. É de esperar que, no ano que antecede as eleições presidenciais, as incertezas fiscais —amplificadas por um aumento expressivo dos gastos públicos— gerem um cenário altamente volátil, levando investidores a tomar decisões, ou adiá-las, com base nas possíveis trajetórias da política econômica futura. A surpresa, no entanto, é que esse cenário se materializou já em 2024. Dois anos de incertezas são muito tempo para qualquer economia.
Na realidade, o arcabouço fiscal criado em 2023 —projetado para funcionar como uma âncora mais flexível a fim de substituir o teto de gastos— trouxe consigo regras que o tornariam incapaz de garantir sua própria sustentabilidade. Portanto, não deveria ser surpreendente a crise de confiança a que estamos assistindo. A verdadeira surpresa reside na falta de percepção política de que a resistência em adotar, neste momento, medidas rigorosas de contenção de gastos comprometerá as condições mínimas de estabilidade econômica até as eleições de 2026.
Estamos prestes a encerrar o ano com um dólar acima de R$ 6, um ciclo de alta das taxas de juros projetado pelo mercado acima de 16,5%, e as empresas listadas no mercado extremamente descontadas. Sob tais condições, será difícil evitar um ano marcado por alta da inflação, desaceleração do crédito, aumento do desemprego e queda na confiança de empresários e consumidores. Nossa taxa de investimento, atualmente em um dos menores níveis históricos, tende a contrair-se ainda mais nos próximos dois anos.
Com preços dos ativos tão deteriorados, caso o atual arcabouço seja reforçado e preservado até pelo menos 2026, poderíamos ao menos atravessar esse período de forma menos turbulenta. Contudo, para que isso aconteça, seriam necessárias medidas mais robustas do que as anunciadas e diluídas pelo Congresso, como mudanças estruturais no desenho do BPC, no seguro-desemprego e nas regras de desindexação dos gastos obrigatórios. Somente o presidente tem liderança política para levar essa agenda adiante, que é de responsabilidade do Executivo.
As recentes intervenções do BC no mercado cambial e do Tesouro recomprando títulos públicos trouxeram algum alívio, mas não alteram o fundamento subjacente dessa crise. Atualmente, o nível de nossas reservas não é tão confortável quanto em 2013 e 2014, quando realizamos intervenções significativas. Por parte do Tesouro, o colchão de liquidez é limitado, e os vencimentos das dívidas se aproximam.
Enquanto o meio político, incluindo o Congresso, não se atenta ao prognóstico para nossa economia, o cenário internacional se agrava. Recentemente, o Federal Reserve sinalizou que reduzirá as taxas de juros de forma mais moderada do que o esperado no início do ciclo, consolidando a expectativa de que o dólar continuará forte e impondo um limite maior para os juros globais.
O BC está ciente da adversidade do cenário, ao destacar seu compromisso com a meta de inflação, utilizando o único instrumento à sua disposição: a taxa de juros. Contudo, não há cenário em que o BC consiga cumprir sua função de maneira eficaz sem âncora fiscal.
Sem ações vigorosas no controle dos gastos, colheremos os frutos de uma crise de confiança que se desenhava para 2026. E a grande pergunta que se coloca é: como atravessaremos os próximos dois longos anos?
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