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 NEWS - 06.01


Mesmo de férias, Haddad volta a Brasília nesta segunda e tem agenda com Lula / Ministro fica semana na capital federal e expectativa é de que tenha reuniões com equipe econômica, ministros e parlamentares- CnnBrasil 6/1


Cristiane Noberto


O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, volta a Brasília nesta segunda-feira (6).


O chefe da equipe econômica está de férias, mas já iria interromper o descanso para participar do ato de 8 de janeiro nesta semana. Porém, Haddad antecipou a vinda e tem agenda com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prevista para 10h, no Palácio do Planalto – o assunto não foi divulgado.


As férias de Haddad haviam sido publicadas no Diário Oficial da União (DOU) no fim do ano passado. O ministro afirmou que os dias de descanso, na verdade, seriam para acompanhar o pós cirúrgico de um parente. No caso, sua esposa, Ana Estela Haddad.


O período publicado havia sido de 2 a 21 de janeiro. Mas, logo depois foi registrada uma quebra do dia 7 a 9 de janeiro – para atender a convocação de Lula a participar do ato de 8 de janeiro que ocorrerá no Palácio do Planalto.


O ministro fica em Brasília pela semana e a expectativa é de que tenha reuniões com a equipe econômica, ministros e parlamentares, além de encontros com o presidente da República.


Mesmo de férias, Haddad não se afastará das discussões econômicas, especialmente sobre o pacote fiscal, promulgado pelo Congresso ainda em 2024. Segundo fontes ouvidas pela CNN, há ainda a previsão do ministro usar o escritório da Avenida Paulista para eventuais reuniões.


Pacote fiscal


O Congresso Nacional promulgou em 20 de dezembro a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que compõe o pacote de corte de gastos do governo federal.


Entre outros pontos, o projeto limita o pagamento de supersalários do funcionalismo público, muda regras no pagamento do abono salarial e altera a destinação de parte dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).


Despesas indevidas com BPC chegam a R$ 14,5 bi por ano, calcula ex-presidente do INSS      / Para Leonardo Rolim, apenas envelhecimento da população não explica aumento nas concessões; programa social de um salário mínimo entrou na mira da equipe econômica para ser contido- O Globo 6/1


Geralda Doca


O governo gasta por ano R$ 14,5 bilhões com pagamentos indevidos do Benefício de Prestação Continuada (BPC), que entrou na mira da equipe econômica no pacote fiscal, embora as medidas de contenção envolvendo o programa tenham sido desidratadas pelo Congresso Nacional.


Os pagamentos indevidos representam cerca de 12% do custo estimado do BPC para 2025. O levantamento foi feito por Leonardo Rolim, ex-presidente do INSS — órgão responsável pela operacionalização dos pagamentos do benefício — e um dos mais conceituados especialistas em Previdência e Orçamento do país.


O BPC é um benefício com o valor equivalente a um salário mínimo (hoje de R$ 1.518) e é pago a pessoas com deficiência e idosos de baixa renda.


O modelo de cálculo


O cálculo de Rolim foi feito com base no histórico de concessões entre 2011 e 2024. A conta mostra um aumento que ele considera fora da curva no número de novos beneficiários, sobretudo a partir de 2022, e que não seria justificado pelos números de envelhecimento da população e de pessoas com deficiência — os dois públicos-alvo do programa.


Para chegar a essa conta, Rolim considerou a média móvel de 12 meses de beneficiários do programa. O número de benefícios saltou de 4,71 milhões no período encerrado em junho de 2021 para 6,3 milhões em outubro de 2024 (últimos dados disponíveis). Ele destaca que foi uma elevação de 33,4% entre os dois momentos, muito acima da curva de crescimento do benefício nos anos anteriores.


Rolim calcula que, mantida a curva de crescimento no número de benefícios até fevereiro 2020 (antes da pandemia de Covid-19), seriam cerca de 1,02 milhão de benefícios a menos. Isto significaria uma redução de despesa de R$ 14,5 bilhões em 2024.


— Apesar de não ter ocorrido nenhuma mudança significativa nas regras de acesso ao BPC, verificou-se um elevado aumento no número de requerimentos e no número de benefícios emitidos, especialmente no benefício para pessoas com deficiência. Trata-se de movimento iniciado ainda no governo anterior, em 2022 — disse o especialista.


O governo pretendia atacar o problema no pacote de contenção de despesas anunciado em dezembro e enviado ao Congresso, mas parte das medidas de controle foram “desidratadas” no Legislativo. E também houve veto por parte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após acerto costurado com senadores.


A estimativa para este ano é de que os pagamentos do BPC terão um custo de R$ 118,3 bilhões.


Um decreto que regulamentou a lei que criou o auxílio restringe a concessão a pessoas com deficiência grave e moderada. Entretanto, pessoas com deficiência leve e que têm o benefício recusado pelo INSS recorrem à Justiça e, geralmente, são atendidas.


Um terço por via judicial


Os processos judiciais ficam restritos à perícia médica e não envolvem uma avaliação biopsicossocial, uma análise do indivíduo considerando aspectos médicos, psicológicos e o contexto social em que a pessoa está inserida — procedimento usual no INSS.


Uma possibilidade de restrição prevista na proposta original do pacote do Ministério da Fazenda, e que tinha aval da Câmara dos Deputados, incluía na lei a distinção clara dos conceitos “moderado” e “grave” para a concessão do BPC a pessoas com deficiência. Mas esse ponto foi vetado pelo presidente Lula, após acordo para facilitar a aprovação da proposta no Senado.


Segundo Rolim, a introdução dos conceitos na legislação teria potencial para reduzir gastos do governo com decisões judiciais.


De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), as ordens judiciais representam um terço dos gastos do governo com o BPC. Ou seja, de cada três benefícios, dois são pela via administrativa e um por ordem judicial.


— O que foi proposto pelo governo no projeto de lei atacaria com muita força o aumento indevido e injustificado das despesas do BPC, considerando o perfil da população. O projeto já foi muito desidratado no Congresso. O veto (de Lula) foi uma pena — afirmou Rolim, acrescentando que o BPC pago a pessoas com deficiência leve tem sido um dos principais motivos do aumento das despesas nos últimos anos.


Na avaliação do especialista, outra causa da alta de gastos com o benefício são as irregularidades, sobretudo no critério de renda.


Medidas classificadas como pente-fino, como revisões cadastrais frequentes, uso de biometria e exigência de inscrição no Cadastro Único do MDS na concessão do BPC — que restaram da proposta do governo — são positivas, mas são ações de alcance reduzido, considerando a necessidade atual de reduzir gastos, avalia Rolim.


Para Paulo Tafner, economista especializado em Previdência, os efeitos do pente-fino no BPC são demorados. Ele estima uma economia de R$ 10 bilhões em dois anos e afirma que as projeções de gastos para este ano com pagamentos da Previdência, incluindo o BPC, estão subestimadas. A estimativa dele é de uma despesa adicional entre R$ 20 bilhões e R$ 22 bilhões.


— O veto do presidente Lula foi um ato de irresponsabilidade. Na prática, mostrou que ele não está preocupado com o equilíbrio das contas públicas, não encampou a proposta da Fazenda — afirmou Tafner.


PT contra a Fazenda


Na pandemia, durante o governo Jair Bolsonaro, o Congresso aprovou uma lei que permitiu o pagamento do BPC a mais de um integrante da mesma família, o que já vinha ocorrendo por decisões judiciais.


O projeto da equipe econômica do ministro Fernando Haddad previa revogar essa autorização, mas a medida foi retirada do texto na Câmara dos Deputados, com amplo apoio do partido do governo, o PT.


Também caiu na Câmara a tentativa de mudar o conceito de núcleo familiar para avaliar a composição da renda, entre outras medidas, como impedir o acesso do programa a quem tem terreno (inclusive terra nua) acima do limite de isenção do Imposto de Renda. A ideia era adotar no BPC a mesma composição familiar do Bolsa Família.


— A estimativa de impacto fiscal com mudanças no BPC nos primeiros anos caiu de R$ 2 bilhões para R$ 1 bilhão , pois a proposta inicial de vedação de dois membros da família receberem apenas um benefício era a maior economia e acabou caindo no Congresso — calcula Arnaldo Lima, da Polo Capital.


Segundo ele, o BPC continuará pressionando as contas públicas enquanto estiver indexado ao salário mínimo, seja na regra de acesso ou no valor do benefício, e em meio ao envelhecimento populacional.


Ministro defende medidas


O ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, disse ao GLOBO que as mudanças feitas no programa vão reduzir fraudes e garantir o benefício a quem tem direito sem precisar recorrer ao Judiciário.


A lei sancionada prevê que a concessão do benefício às pessoas com deficiência “fica sujeita a avaliação, nos termos de regulamento”. Porém, não exige que a deficiência seja declarada “moderada” ou “grave” — o trecho que foi vetado por Lula. O governo editará o regulamento citado na lei para avaliação de pessoas com deficiência.


— A mudança aprovada ajuda a fechar duas portas. Uma, contra fraudes diretas por usuários, com sistema de biometria, atualização do cadastro a cada dois anos e cruzamento de dados sobre renda. A outra dará maior transparência no conceito de deficiência, evitando que o Judiciário se torne uma porta de entrada, onde pessoas que não preenchem requisitos da lei ficassem recebendo anos e anos até que se decida que não era devido — afirmou.


As mudanças aprovadas pelo Congresso preveem a obrigatoriedade de biometria, mas não será exigida nas localidades de difícil acesso, ou em razão de dificuldades de deslocamento do requerente, por motivo de idade avançada, estado de saúde ou outras situações excepcionais.


A nova lei também reduziu a necessidade de recadastramento de quatro para dois anos e permitiu que, caso isso não seja feito, o benefício seja suspenso, desde que comprovada a ciência da notificação para o cadastro. Além disso, facilitou o compartilhamento de informações e estabeleceu que na concessão do benefício será obrigatório o registro do código da Classificação Internacional de Doenças (CID), garantida a preservação do sigilo.


Proteção universal


Para a procuradora da República e professora da Universidade Mackenzie, Zélia Pierdoná, o desenho atual do BPC pressiona as contas públicas e vai na contramão do que existe em todo o mundo. Segundo ela, as regras precisam ser reformuladas para que o modelo ofereça uma proteção universal, como o sistema foi originalmente criado na Inglaterra após a Segunda Guerra Mundial.


— O desenho atual do BPC só existe no Brasil e é resultado do populismo do Legislativo e do Judiciário — critica Pierdoná.


Além da concessão a pessoas com deficiência leve — com capacidade laboral e interpessoal — os juízes dão sentenças sem observar o critério de renda de até um quarto do salário mínimo per capita (hoje em R$ 379,50 por pessoa da família). Casos antes específicos, permitindo concessão até meio salário mínimo per capita, viraram regra, diz Pierdoná.


O economista Marcos Mendes, pesquisador do Insper, defende que o valor do BPC passe por mudanças para se tornar mais justo. No caso de um idoso, quem contribuiu durante toda a vida para a Previdência Social recebe o mesmo valor do BPC de quem nunca recolheu ou não tem contribuição em valor suficiente.


Uma das sugestões seria elevar a idade mínima para o BPC idoso, hoje de 65 anos, para acabar com a “concorrência desleal” em relação ao benefício previdenciário.


— O BPC constitui uma transferência de renda não associada à reposição de renda do trabalho, constituindo benefício de valor muito elevado quando comparado com outras transferências de renda, como o Bolsa Família — diz Mendes.


Na reforma da Previdência, em 2019, o governo Bolsonaro incluiu na proposta a redução do valor do BPC para 70% do salário mínimo, mas concedendo o benefício a partir dos 60 anos. A integralidade seria obtida aos 70. O Congresso barrou a medida.


 


Novo perfil com Alcolumbre e relação com Motta: saiba por que governo prevê percalços com futura cúpula do Congresso / Mesmo sem ter colocado obstáculos a favoritos para comandar Câmara e Senado a partir de 2025, Planalto ensaia gestos para driblar possíveis problemas no radar- O Globo 6/1


Sérgio Roxo


Embora tenha evitado movimentos contrários às candidaturas favoritas para assumirem Senado e Câmara em 2025, o Palácio do Planalto antevê percalços na relação com Davi Alcolumbre (União-AP) e Hugo Motta (Republicanos-PB) à frente do Congresso. Para o entorno do presidente Lula (PT), Alcolumbre marca uma mudança de perfil em relação ao atual presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o que pode gerar mais dificuldades em negociações. No caso de Motta, o desafio é de construir relação com o deputado, que, a exemplo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já teve atrito com a articulação política do governo.


No Senado, onde o governo Lula tem base mais azeitada, Pacheco é considerado um aliado de fato do governo. Alcolumbre, por sua vez, é visto por auxiliares do presidente como alguém mais duro para negociar, e que não chega a ser um parceiro de primeira hora da atual administração.


Para mostrar boa vontade com Alcolumbre, o Planalto consultou o senador sobre o preenchimento de 17 vagas em diretorias de agências reguladoras antes de enviar os nomes para serem sabatinados pelo Senado, em dezembro. Mesmo assim, houve tensão em outro episódio no fim do ano, após o favorito para suceder Pacheco se dizer enganado pela demarcação de terras indígenas em Santa Catarina por meio de decretos presidenciais, no momento em que os três Poderes conduziam uma mesa de negociações sobre a questão.


Alcolumbre alega que, por causa dessa mesa, aceitou retirar de pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), da qual é presidente, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o marco temporal, que poderia dificultar novas demarcações.


Busca por diálogo


O governo trabalha para pacificar a relação com Alcolumbre antes da eleição de fevereiro, de olho em manter um cenário mais favorável no Senado. Durante a gestão de Pacheco, apesar de atritos pontuais com o governo, o presidente do Senado chegou a postergar no início de 2024, por exemplo, a convocação de uma sessão do Congresso que analisaria um veto de Lula ao calendário para pagamento de emendas. Com a demora, o Planalto conseguiu costurar a manutenção do veto, que lhe dá maior margem na articulação com o Legislativo ao longo do ano.


No caso de Motta, considerado pelo Planalto um político de bom diálogo, a perspectiva do governo é de melhora na relação comparado a Lira, que rompeu relações com o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais), responsável pela interlocução com o Congresso. Mesmo assim, a avaliação é de que a relação ainda precisará ser trabalhada.


Motta já teve um pequeno entrevero com Padilha no início de 2023, quando demorou a ser atendido pelo ministro e acabou desistindo da audiência. O episódio, porém, foi contornado dias depois. Por outro lado, o favorito a comandar a Câmara mantém contato próximo com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que recorreu a Motta em diversos momentos em que projetos da área econômica estavam emperrados na Casa.


Aceno por precaução


Um ponto de atenção é o impasse entre Congresso e Supremo Tribunal Federal (STF) envolvendo o bloqueio de emendas parlamentares, agravado por decisões do ministro Flávio Dino nos últimos dias do ano. Em um esforço para distensionar a relação com os parlamentares, Lula chegou a se reunir com Motta, no dia 27, em encontro que não estava previsto na agenda, buscando sinalizar ao favorito para comandar a Câmara que não há “jogo combinado” entre governo e STF sobre o tema.


Apesar de todos os prognósticos, não está descartado que Lula, na reforma ministerial que deve fazer em janeiro, troque o comando da articulação política, o que mudaria o cenário com os favoritos a presidir as duas casas Legislativas.


Padilha, atual ministro das Relações Institucionais, diz que tanto Lira quanto Pacheco foram importantes para o governo aprovar projetos nos dois primeiros anos do mandato de Lula, e aposta numa relação harmônica com seus sucessores.


— Alcolumbre e Motta tiveram uma relação muito respeitosa com o governo ao longo destes dois anos. A expectativa que se mantenha e se avance essa relação — disse Padilha.


Provável novo presidente da Câmara, Motta faz promessa a líderes e partidos: previsibilidade na agenda de votações- Globo g1 6/1


Em menos de um mês, a Câmara deve eleger o novo presidente, que vai assumir depois de dois mandatos de Arthur Lira (PP-AL).


Se, no ano passado, chegou a haver muita disputa em torno do nome, 2025 começa com a certeza que o eleito será Hugo Motta (Republicanos-PB).


O nome do parlamentar será apoiado por praticamente todos os partidos. Motta passará a segunda quinzena de janeiro concluindo encontros com bancadas partidárias e estaduais. Em todas, Motta tem feito sua primeira e principal promessa: previsibilidade.


A falta de previsabilidade tem sido uma das maiores queixas, nos bastidores, que deputados e líderes fazem à gestão Lira. A pauta com as votações só costuma ser divulgada no fim da tarde do próprio dia em que os projetos serão analisados.


Na prática, isso dificulta que deputados estudem os temas que serão tratados e se preparem para votações. Bem como impede a mobilização contrária a pautas polêmicas, já que só se toma conhecimento de que determinados temas entraram em pauta horas ou até mesmo instantes antes do início da sessão.


O começo da sessão, inclusive, é outro ponto de reclamação. Um horário é marcado pró-forma e parlamentares ficam se revezando nos discursos sem saber que horas a Ordem do Dia, isto é, a pauta de votações de fato se iniciará. Com frequência, o Plenário é marcado para o começo da tarde, mas Lira só aparecia durante a noite.


Motta tem prometido aos deputados com quem conversa que a pauta da semana será disponibilizada na segunda-feira, com tempo para os temas serem analisados e discutidos. E que as sessões terão horário fixo para começar: por volta das quatro da tarde. Com essa promessa, tem conseguido conquistar e cacifar apoios de opostos.


A Mesa Diretora terá a primeira vice-presidência do PL. O deputado Altineu Cortes (PL-RJ) é o cotado. Já a primeira secretaria, que funciona como a prefeitura da Câmara, ficará com o PT. Jilmar Tatto (PT-SP) é um dos candidatos dentro do partido.


Para um experiente deputado, Motta será eleito "com tranquilidade". Segundo ele, porque o parlamentar tem um "perfil mais leve". Resta saber se cumprirá sua primeira promessa.


Com vendas expressivas de dólares pelo BC, reservas recuam US$ 33,3 bilhões em dezembro / No mês passado, a instituição vendeu US$ 21,574 bilhões no mercado à vista e US$ 11 bilhões em leilões de linha- Valor 5/1


Gabriel Shinohara


As intervenções no mercado de câmbio realizadas pelo Banco Central (BC) em dezembro contribuíram para que o montante de reservas internacionais caísse US$ 33,3 bilhões em um mês e chegasse a US$ 329,7 bilhões no último dia de 2024. No fim de novembro, o nível de reservas estava em US$ 363 bilhões. Apesar da queda, o volume ainda é considerado confortável por especialistas.


O patamar atingido no fim do ano passado é inferior ao nível de reservas registrado no fim de 2023, de US$ 355 bilhões, mas superior aos US$ 324,7 bilhões de 2022. Os valores são nominais. O economista sênior e sócio da Tendências Consultoria, Silvio Campos Neto, aponta que a queda no mês de dezembro foi “bastante expressiva” e que as reservas continuaram em um nível saudável. O economista destaca, no entanto, que essa queda rápida do nível acende um alerta para os próximos meses.


“Você promoveu uma atuação bastante vigorosa no mercado cambial no mês de dezembro e isso não foi suficiente para reverter as pressões, o que evidencia que a fonte desse movimento não está totalmente correlacionada a uma disfuncionalidade do mercado cambial ou mesmo a alguma escassez pontual de dólares, mas é uma questão mais estrutural que remonta a essa maior percepção de risco em relação ao Brasil”, explicou.


Em dezembro, o BC realizou nove leilões de dólar à vista e cinco de linha (com compromisso de recompra) que totalizaram US$ 32,574 bilhões. Foram US$ 21,574 bilhões à vista e US$ 11 bilhões nos leilões de linha colocados no mercado. Ao olhar para o volume de reservas, Danilo Igliori, economista-chefe da Nomad, também ressalta que há bastante conforto. Para o economista, pode haver preocupação se acontecer uma escalada, em 2025, da crise vista em dezembro. “Não acho que é o que tem no cenário. É um cenário em que o Banco Central reagiu muito bem, foi um momento evidente de estresse.”


Silvio Campos Neto, da Tendências, explica que as intervenções foram o principal fator para a redução das reservas, mas destaca também o efeito das altas nas taxas de juros de mercado nos Estados Unidos. “Isso acaba também impactando o valor porque reduz os preços dos papéis, especialmente dos títulos americanos, que compõem a maior parte das reservas.”


Procurado, o BC informou que não há um consenso sobre a melhor métrica para definir o “nível ótimo” das reservas, mas apontou que avaliações internas períodicas “indicam que o Brasil está alinhado à prática de outros países semelhantes”.


Em entrevista coletiva no dia 19 de dezembro, o então presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que a autoridade monetária estava atuando no câmbio da mesma forma de sempre. Ele explicou que o BC atua quando entende que há disfuncionalidade no mercado. Além disso, pontuou que houve um fluxo atípico grande no fim de 2024, com a saída acima da média de dividendos como um dos fatores.


As preocupações com as questões fiscais também influenciaram o movimento do dólar. No fim de novembro, o governo anunciou medidas que não foram bem recebidas pelo mercado. O pacote foi apresentado junto com um projeto para isentar de Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil, o que elevou as preocupações e impactou os juros e o dólar.


O projeto fiscal foi aprovado pelo Congresso Nacional no mês de dezembro e a proposta do IR ainda nem foi enviada pelo Executivo ao Parlamento. O dólar continuou subindo e encerrou 2024 com uma desvalorização de 27,3% frente ao real, a R$ 6,18.


Igliori, da Nomad, aponta que em dezembro sempre há uma saída maior de dólares, mas o tamanho da queda nas reservas está relacionado ao estresse em torno da política fiscal. “Os leilões foram bem expressivos e mesmo assim o câmbio andou bastante. Ficou bem claro que durante o mês de dezembro tivemos uma mini crise de credibilidade e esse impacto nas reservas foi a consequência da gestão do BC nesse período através dos leilões”, disse.


Outro elemento que compôs o cenário do fim do ano foi o tom das críticas sobre a atuação do BC por membros do PT. No mesmo dia da entrevista concedida por Campos Neto, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, publicou em uma rede social que a desvalorização do real que estava acontecendo naquelas semanas era um “ataque especulativo”.


Na coletiva, o então diretor de política monetária e atual presidente do BC, Gabriel Galípolo, foi questionado sobre essa possibilidade. Para ele, a ideia de um “ataque especulativo como algo coordenado” não representaria bem os movimentos do mercado. Galípolo apontou que “não é correto” tratar o mercado como um “bloco monolítico”.


O economista-chefe da Nomad destaca que sempre existe pressão sobre o BC e que não há motivo para pensar que a nova diretoria da autoridade monetária não vai atuar de forma técnica. “Não vejo inclinação de colocar uma incerteza institucional muito grande em torno de algo que foi conquistado a duras penas, que é a autonomia do Banco Central.”


 


ESTADÃO: TENDÊNCIA DO DÓLAR PREOCUPA E MERCADO VÊ POUCO ESPAÇO PARA QUEDA DA COTAÇÃO – 6/1


Depois de avançar mais de 27% e se consolidar num patamar acima de R$ 6,00 em 2024, o comportamento do dólar se tornou uma das grandes preocupações dos analistas diante do cenário econômico de tantas incertezas, internas e externas, neste ano. Apesar das pesadas intervenções do Banco Central no mercado de câmbio em dezembro, a moeda americana acumulou leve alta de 0,03% nos primeiros dois pregões do ano, cotada a R$ 6,18.


“O dólar segue muito valorizado em termos globais. Todos os índices do dólar contra cestas de moedas estão em patamares elevados”, diz Silvio Campos Neto, economista e sócio da consultoria Tendências. “Não vejo margem para um grande alívio (à moeda) na parte externa.”


A principal incerteza na frente internacional vem dos Estados Unidos, onde Donald Trump volta à presidência em 20 de janeiro. Na campanha, o republicano prometeu a adoção de tarifas de importação mais elevadas, medida que traz riscos inflacionários que dificultariam ainda mais a queda da taxa básica de juros pelo Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA).


“As novas políticas de Trump podem afetar as expectativas de inflação e, por consequência, a direção do Fed nos juros”, diz Alexandre Espirito Santo, economista da Way Investimentos e coordenador de economia e finanças da ESPM.


Em sua reunião de dezembro, o Fed cortou os juros em 0,25 ponto porcentual, para a faixa entre 4,25% a 4,50% ao ano, e sinalizou que deve reduzir as taxas apenas duas vezes em 2025. Depois da decisão, Jerome Powell, presidente do Fed, disse estar confiante de que a inflação está numa trajetória de queda no país, embora em um ritmo mais lento. Segundo ele, os EUA podem levar mais um ou dois anos para inflação voltar à meta de 2%.


“O Fed enfrenta um dilema grande. A economia (dos EUA) pode entrar em recessão este ano - e isso piora ainda mais com as políticas que o Trump está sinalizando. Ao mesmo tempo, a inflação segue pressionada e começou a acelerar um pouco nas últimas leituras, o que coloca o Fed num cenário em que o momento pode ser de parar de cortar os juros”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “Mas se a economia entra numa desaceleração ou recessão mais grave, os juros caem com mais intensidade. É um caminho ainda aberto.”


Além das preocupações com os EUA sob Trump, há ainda as tensões geopolíticas no Oriente Médio e na Ucrânia, e as dúvidas sobre a economia da China, que dá sinais de desaceleração e tem tido dificuldade de alcançar a meta de crescimento de 5% do Produto Interno Bruto (PIB).


No cenário local, as atenções se voltam para o rumo das contas públicas. O pacote de contenção de gastos apresentado pelo governo em novembro foi considerado aquém do necessário, na avaliação dos especialistas, antes ainda de ser desidratado em sua tramitação no Congresso. O País precisa acertar a as contas públicas para conter o endividamento público e retomar a confiança dos investidores. Com nível de dívida elevado para uma economia emergente e sem uma clareza sobre o futuro, os investidores vêm retirando seus recursos do País e impulsionando a desvalorização do real.


“O cenário de 2025 segue tenso. O câmbio não tem chance de baixar de R$ 6 e há o risco de subir ainda mais. Aparentemente, está caminhando para se estabilizar em R$ 6,20, mas não dá para descartar que, com o cenário internacional e o fiscal mal encaminhado, ele vá para procurar um patamar de R$ 6,50”, diz Vale, da MB.


SINAL. Desde o anúncio do pacote fiscal, que veio acompanhado da proposta de isenção do Imposto de Renda a quem ganha até R$ 5 mil, o dólar ultrapassou a marca de R$ 6,00 e os juros futuros dispararam, num claro sinal de que o investidor está exigindo um retorno maior para financiar a dívida brasileira. Para conter a escalada do dólar, o BC despejou US$ 21,5 bilhões à vista no mercado - a maior injeção de recursos em um mês da história do regime de câmbio flutuante.


Os analistas também observam com lupa os primeiros passos de Gabriel Galípolo no comando do BC. Galípolo foi uma escolha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que viveu um embate permanente com Roberto Campos Neto, ex-presidente da autarquia. “Estamos numa situação em que já se contratou uma piora econômica para 2025 e 2026. Não apostaria que o governo terá alguma bala de prata para mudar esse ambiente. E se partir para um populismo econômico, aí o dólar fica mais perto de R$ 7 do que de R$ 6”, adverte o economista-chefe da Tendências. (Luiz Guilherme Gerbelli)


 


ESTADÃO: 'COM A VOLTA DE TRUMP, BRASIL ENFRENTA RISCOS CONCRETOS' 6/1


São Paulo, 05/01/2025 - Janeiro marcará um dos principais eventos que vão ditar o rumo dos mercados globais neste ano e nos próximos: dia 20, Donald Trump toma posse pela segunda vez como presidente dos EUA. A volta do republicano ao poder já vem influenciando o humor de investidores globais, em meio à euforia e ao receio com as propostas feitas ao longo da campanha.


Entre essas promessas, estão taxar produtos importados, acirrar guerras comerciais e reprimir a imigração e deportar imigrantes. Apesar de a ideia de “tarifaço” ser discutida inicialmente para produtos chineses, canadenses e mexicanos, o futuro presidente dos EUA já deu indícios de que estenderá a medida a todos os parceiros comerciais em maior ou menor grau. Incluindo ameaças ao Brics, bloco econômico do qual o Brasil faz parte.


Em meio a esse cenário, a avaliação de Thiago de Aragão, CEO da consultoria Arko Advice International, é de que o Brasil enfrenta riscos concretos, especialmente de sanções ou isolamento comercial. “Setores que dependem de exportações, como o agronegócio e mineração, podem ser os mais impactados. Empresas como Vale, JBS e BRF poderiam sofrer com barreiras tarifárias ou maior concorrência de produtos americanos subsidiados”, diz. “Além disso, a adoção de políticas hostis aos Brics pode dificultar acordos bilaterais e reduzir o fluxo de investimentos externos.”


Como o retorno da política “América em primeiro lugar”, de Trump, pode influenciar os mercados?

Provavelmente, trará instabilidade. Historicamente, essa abordagem protecionista busca priorizar os interesses econômicos internos, aumentando tarifas, revisando acordos comerciais e reduzindo a dependência de importações estratégicas. Isso pode gerar volatilidade, especialmente em economias dependentes de exportações para os EUA, como China, México e Brasil. Ao mesmo tempo, a busca de Trump por desregulamentação e estímulo à produção doméstica deve beneficiar setores como energia, defesa e tecnologia nos Estados Unidos, influenciando investidores globais a priorizarem ativos americanos. Isso atrairá investimentos de empresas americanas que estavam destinados ao exterior. Se por um lado beneficiará a indústria americana, abrirá espaço para produtos chineses no mundo e representará uma ótima notícia para a indústria chinesa.


O mercado brasileiro corre algum risco, tendo em vista as ameaças feitas por Trump aos Brics?

O Brasil enfrenta riscos concretos, considerando as ameaças de Trump de enfraquecer os Brics, particularmente por meio de sanções ou isolamento comercial. Setores que dependem de exportações, como o agronegócio e mineração, podem ser os mais impactados. Empresas como Vale, JBS e BRF poderiam sofrer com barreiras tarifárias ou maior concorrência de produtos americanos subsidiados. Além disso, a adoção de políticas hostis aos Brics pode dificultar acordos bilaterais e reduzir o fluxo de investimentos externos. Para o acionista, isso pode significar volatilidade nos papéis dessas empresas e incertezas em relação à rentabilidade de longo prazo.


O dólar disparou no Brasil especialmente pelo risco fiscal, mas, globalmente, a moeda americana também se fortaleceu ante outras divisas. Como a conjuntura geopolítica que se desenha para 2025 vai impactar o câmbio?

O fortalecimento do dólar em 2025 reflete tanto a volta de Trump quanto uma conjuntura geopolítica desafiadora. A desaceleração na China e na Europa, aliada à falta de resoluções para conflitos no Oriente Médio, reforça a percepção do dólar como um porto seguro. Para o Brasil, além do impacto fiscal interno, a volatilidade cambial pode ser intensificada pela relação do País com os Brics e o aumento da aversão global a riscos. Isso pode pressionar ainda mais o câmbio e tornar mais cara a captação de recursos externos.


Como está o sentimento dos fundos que você assessora em relação ao Brasil? Há receio em Wall Street sobre investir no País no momento?

O sentimento em relação ao Brasil é misto. Por um lado, o potencial do mercado brasileiro, especialmente em setores como energia renovável e agronegócio, continua atraente. Por outro, há receio em Wall Street quanto ao cenário fiscal e político, além da capacidade de o Brasil se proteger contra choques externos. A postura de Trump em relação ao Brics também adiciona um componente de incerteza, especialmente para fundos mais avessos ao risco. Ainda assim, investidores que buscam retornos elevados podem considerar o Brasil, desde que haja medidas claras para mitigar instabilidades internas. (Luiz Lanza, E-Investidor)


 


Corrosão de reservas e estresse fiscal deixam estrangeiro em espera – Valor 6/1


Anais Fernandes


A combinação de uma deterioração relativa das reservas internacionais do Brasil com o “estresse fiscal”, alimentado pela comunicação ruim do governo, faz o investidor estrangeiro temer crise de confiança da dívida pública no país, afirma Alex Fustè, economista-chefe do Andbank.


“Hoje, quando falo com colegas em Londres ou em Nova York e tratamos de Brasil, falamos sempre da questão fiscal, quais foram as últimas palavras do [presidente] Lula, o pacote anunciado, a decepção que houve”, conta.


Como a economia em gastos proposta pelo governo no fim de 2024 não é suficiente para avançar na consolidação fiscal e evitar essa crise de confiança, o mercado está à espera de que a equipe econômica coloque algo a mais na mesa, “mas isso parece que não vai acontecer no curto prazo”, afirma Fustè. Por isso, diz, os investidores estrangeiros estão no modo “esperar e observar”.


Segundo Fustè, eles esperam clareza e compromisso constante do governo com o programa fiscal. Para isso, diz, a linguagem é importante. “Os governos têm de ter uma linguagem social, mas devem ter uma linguagem para o mercado de capitais também. Não se pode dar as costas ao mercado, porque o Estado de bem-estar social não pode se pagar sem a sua ajuda”, afirma.


A crise de confiança tem levado a curva de juros, em especial os títulos de longo prazo, a pagar mais taxa, o que afeta, por sua vez, companhias mais alavancadas, diz Fustè, chegando à “economia real”. “É preciso pagar mais pelo endividamento, destinar mais dinheiro ao pagamento de juros e menos a salários, contratações”, afirma. Para ele, dificilmente o Brasil crescerá mais de 2% em 2025.


Veja a seguir os principais trechos da entrevista.


Valor: O Brasil perdeu atratividade para o investidor estrangeiro?


Alex Fustè: No mundo, há investidores globais e investidores focados em emergentes. O investidor global não olha para o Brasil. O investidor especializado em emergentes olha. Esse tipo de investidor, como eu, está observando o Brasil e fazendo uma lista de coisas positivas e negativas. Uma coisa que eu olho muito em um mercado emergente são suas reservas internacionais. O Brasil tem uma posição poderosa, de mais de US$ 350 bilhões. Mas, em relação ao PIB, as reservas estão se deteriorando rápido, e isso preocupa.


Valor: Por quê?


Fustè: O investidor estrangeiro, quando compra dívida em um emergente, compra em dólar. Então, precisamos saber que há dólares para pagá-la. Em relação à dívida externa, as reservas do Brasil também se deterioraram muito. Isso vem caindo por razões estruturais, portanto, é preciso ver mudanças estruturais.


Valor: Em qual sentido?


Fustè: A balança comercial é favorável ao Brasil, mas a balança de rendas é negativa, ou seja, sai mais dinheiro do país do que entra. Precisaria, por exemplo, de um salto na balança comercial com mais exportações e menos importações - o Brasil importa quase todos os bens intermediários e de capital de que necessita -, produzindo domesticamente mais bens de alto valor agregado. Esse é um risco importante para o Brasil, porque, junto com o estresse fiscal, está tornando a situação de reservas pior.


Valor: Como assim?


Fustè: Há um prêmio de risco que sobe porque há menos dólares que respaldam a dívida externa. Se eu adiciono o estresse fiscal, porque o governo não soube se comunicar, é uma combinação perigosa, que faz alguns no Ocidente ou nos países desenvolvidos pensarem em uma possível crise de confiança da dívida, o que leva a curva de juros, títulos de longo prazo, a pagar mais taxa. Ao mesmo tempo, quando sobem os juros, isso afeta indústrias sensíveis, mais alavancadas. É preciso pagar mais pelo endividamento, destinar mais dinheiro ao pagamento de juros e menos a salários, contratações.


Valor: Por um tempo, o estrangeiro pareceu se preocupar menos com o quadro fiscal do Brasil...


Fustè: O investidor estrangeiro só está olhando a questão fiscal. É o mais importante. Há dois tipos de investidores estrangeiros: o que foca em ativos de dívida e o que foca em ativos de equity, bolsa. A maior parte, me atreveria a dizer, é de dívida. E, como investidor de dívida, o mais importante é a evolução fiscal. Hoje, quando falo com colegas em Londres ou em Nova York e tratamos de Brasil, falamos sempre da questão fiscal, quais foram as últimas palavras [do presidente] Lula, o pacote anunciado, a decepção que houve. O estresse fiscal é, hoje, o centro da atenção.


Valor: O que decepcionou mais?


Fustè: A economia em gastos proposta parece não ser suficiente para avançar em uma consolidação fiscal e evitar uma crise de confiança. Então, agora, o mercado está à espera de que o governo coloque algo adicional, uma economia a mais. Mas isso parece que não vai acontecer no curto prazo. O que os investidores estrangeiros pedem é: um, uma consolidação fiscal; dois, clareza no programa fiscal; e três, o mais importante, compromisso constante com esse programa.


Valor: Como transmitir isso?


Fustè: É a linguagem. Os investidores esperam uma linguagem que condiza com o idioma do mercado. Os governos têm de ter uma linguagem social, mas devem ter uma linguagem para o mercado de capitais também. Não se pode dar as costas ao mercado, porque o Estado de bem-estar social não pode se pagar sem a sua ajuda.


Valor: O PIB, que tem surpreendido para cima, não ajuda?


Fustè: O crescimento econômico também é algo que olhamos, e é certo que o Brasil crescendo a 3% parece razoável. Mas, se você considera que a China, o principal parceiro comercial do Brasil, vai desacelerar no ano que vem e os Estados Unidos, segundo maior parceiro, devem aplicar tarifas - e as exportações são muito importantes para a economia brasileira - parece que dificilmente o Brasil vai crescer mais de 2% em 2025.


Valor: Isso deixa o investidor estrangeiro em “modo de espera” em relação ao Brasil?


Fustè: O investidor estrangeiro sabe que há coisas positivas no Brasil. O país tem uma história econômica potente e um peso em nível mundial em setores muito importantes, como alimentos, indústrias extrativas e do agro. O investidor estrangeiro sabe disso, mas hoje, está esperando para ver o que acontece com as tarifas dos EUA e, sobretudo, qual é a linguagem do governo, para ver se ele logra mudar o rumo e evitar dirigir-se a uma crise de confiança da dívida e da moeda. O investidor estrangeiro já viu o peso do Ibovespa no MSCI Emerging Market diminuir. Isso se deve a algumas razões, que é o que observamos hoje, fuga de capitais, dúvidas. Para ter uma guinada, precisamos de mudanças estruturais, que estamos esperando. Enquanto não houver mudanças estruturais, o Brasil não terá peso estável e de longo prazo em um portfólio global, mas uma presença tática, com entradas e saídas. O investidor estrangeiro, quando tem de canalizar capital, olha para os lados e vê quais são as dinâmicas de entrada e saída de fluxo no país. Enquanto elas forem de saída, ele não vai canalizar grande quantidade de dinheiro. Para que o fluxo de saída se converta em de entrada no Brasil, de novo, precisa de clareza no fiscal, um programa respaldado, palavras do governo de compromisso. Linguagem e, depois, evidências de sustentabilidade.


Valor: Quais países emergentes têm se mostrado mais atrativos estruturalmente do que o Brasil?


Fustè: No Andbank, há 5 anos decidimos abrir posição na Índia e no Vietnã. Essa posição, a princípio tática, se converteu em estrutural, porque esses países, mediante agendas reformistas, estão enviando os sinais corretos, seus pesos no MSCI estão subindo. Acontece justamente o contrário do Brasil. Tem uma regra que eu sigo, particularmente, para as carteiras que é que a evolução da dívida sobre o PIB não pode crescer mais de 30% em três, quatro anos. Historicamente, se isso acontece, tem sido um problema. No Brasil, em menos de dois anos, saltou 15%, ou seja, estamos nos aproximando desses 30%. Uma coisa positiva é que a maior parte da dívida do Brasil se financia domesticamente, mas a dívida externa pesa cada vez mais.


Valor: O que isso significa?


Fustè: Significa que o país é mais vulnerável a um choque externo, por exemplo, a um aumento do dólar, como vemos agora. A economia do Brasil está robusta, mas há uma diferença entre a percepção da realidade hoje e a estimativa para o futuro. O que nós vemos é, talvez, uma crise de confiança de dívida e de moeda, sabendo ainda que o Brasil não está tão bem posicionado hoje para absorver um choque externo, que haverá uma política de tarifas dos EUA, que o fluxo de saída de capitais ameaça levantar a curva de juros e afetar os setores alavancados. Todos esses aspectos fazem com que a gente, facilmente, possa pensar que a economia brasileira está bem hoje, mas que não estará tão bem no futuro. Diate disso, o investidor estrangeiro pensa: vou esperar para ver. Nesses momentos de “esperar e ver”, quem já está investido na economia financeira no Brasil, no melhor dos casos, fica parado, e não há uma apreciação dos ativos.


Valor: E no pior dos casos?


Fustè: No pior dos casos, as pessoas se cansam e podem seguir saindo. É um pensamento de: “Opa, talvez seja melhor eu não ser o último a sair”. Essa é a situação.


Valor: O sr. citou o temor por uma crise de confiança de dívida e da moeda. O que quer dizer?


Fustè: Os investidores associam crise de confiança a um salto inflacionário. Em 2016, a inflação era na casa de 10%. Hoje, a inflação está ao redor de 5%, mas, se não melhorar o estresse fiscal, podemos pensar que pode ocorrer o mesmo que em 2016: um salto inflacionário que obrigue o Banco Central a subir os juros. Acabamos de ver o BC subir a Selic em 100 pontos-base (1 ponto percentual). Um investidor estrangeiro não pode estar comprado em dívida, em moeda local, com essa dinâmica. E o BC já prometeu mais duas altas iguais. São juros contracionistas para a economia. Se a economia se contrai, com essa política fiscal, automaticamente todos os índices que citei, de dívida sobre o PIB, de reservas, se deterioram na velocidade da luz. Precisamos de tranquilidade. Precisamos ver que o BC não tem motivos para subir as taxas e contrair a economia.


Valor: O que precisa para isso?


Fustè: A pergunta é simples e a resposta também. O que levou o BC a subir as taxas? Defender a moeda. É necessário que o BC não tenha de defender a moeda. Para estabilizar a moeda, a única coisa necessária é evitar fuga de capitais. Porque uma moeda, o câmbio, não é fixado pelos juros, nem pelo diferencial de taxas de juros. É fixada pelas quantidades relativas de moeda estrangeira versus moeda local. Se sai moeda estrangeira, esse pouquinho que fica, em termos de toda a moeda local, vale muito.


Valor: Na sua avaliação, o BC está agindo corretamente?


Fustè: Se não defende a moeda, sabendo que há uma estrutura fiscal fraca, pode entrar em uma espiral e o câmbio ir não a R$ 6 por dólar, mas a R$ 7, a R$ 8. E isso é um problema grave, porque o Brasil importa muitos itens. Isso gera inflação, e inflação é o pior imposto para a sociedade, porque é muito regressivo. Os governos, às vezes, não se dão conta de que suas palavras provocam fugas de capitais e essa inflação induzida acaba prejudicando mais os mais pobres. É por isso que é importante enviar os sinais corretos. Porque os investidores estrangeiros estão esperando, simplesmente é assim.


 


Defasagem de preços aumenta pressão para que Petrobras reajuste combustíveis / Valores no Brasil estão com diferença estimada em até mais de dois dígitos em relação ao mercado externo, devido à forte alta do dólar- Valor 5/1


Fábio Couto


Os preços dos combustíveis praticados pela Petrobras no Brasil começam 2025 com defasagem percentual expressiva na comparação com o mercado internacional. A diferença é puxada pela alta do dólar nos últimos meses do ano passado. E essa realidade aumenta ainda mais as pressões por reajustes na venda de gasolina e diesel nas refinarias da estatal depois de um 2024 com preços praticamente estáveis.


A consultoria StoneX estima que o diesel operava, na sexta-feira (3), com defasagem de 8,9%, enquanto a gasolina era vendida nas refinarias da Petrobras 12,3% abaixo dos preços internacionais. Nas contas da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), a defasagem seria ainda maior: de 19% no diesel e de 13% na gasolina. E para a XP, os percentuais são de 14,9% e 12,5%, respectivamente.


Como o Valor mostrou na semana passada, a Petrobras só reajustou uma vez o preço da gasolina nas refinarias no ano passado. Foi em julho, quando subiu o combustível em 7,04%. O óleo diesel, por sua vez, não teve mudanças: a última alteração foi um corte de 7,85% em dezembro de 2023. Naquele ano, a estatal abandonou o preço de paridade de importação (PPI) e adotou uma fórmula que passou a considerar parâmetros nacionais para o cálculo, além da cotação do barril de petróleo do tipo Brent e do dólar, “abrasileirando” os preços da petroleira.


De acordo com uma fonte que acompanha o setor, as cotações internacionais ajudaram a Petrobras a evitar mudanças de preços ao longo de 2024, uma vez que, ainda que tenha sofrido com a pressão da alta do dólar, a cotação do petróleo teve pouca oscilação.


Em 2024, o Brent fechou a US$ 74,24 por barril, com queda de 3,74% sobre 2023. No começo de 2025, o petróleo opera cotado na faixa dos US$ 75 por barril. O dólar, por sua vez, continua forte e operou, na sexta-feira (3), na faixa de R$ 6,18.


Os cálculos da StoneX indicam que a defasagem de 8,9% corresponderia a R$ 0,30 por litro, enquanto na gasolina, a diferença de 12,3% ante o mercado externo equivaleria a R$ 0,36 por litro. Caso seja considerada como referência apenas o Golfo do México como origem da importação de diesel, a defasagem no produto vendido pela Petrobras no mercado doméstico seria de 15,9%, ou R$ 0,55 por litro do combustível. O cálculo exclui as importações de diesel russo que tem entrado no país a preços subsidiados.


No caso da Abicom, a defasagem de 19% para o diesel vendido nas refinarias da Petrobras equivaleria a R$ 0,67 por litro abaixo do mercado internacional. Na gasolina, essa diferença seria de 13% ou R$ 0,37 por litro. Segundo a entidade, o câmbio pressiona os preços domésticos.


Thiago Vetter, analista da StoneX, diz que, além do câmbio, a subida da cotação do petróleo Brent a partir de dezembro também influi no cenário. Segundo ele, as atuais cotações do dólar indicam um novo patamar de preços do petróleo, o que suscitaria eventual reajuste pela Petrobras. Vetter avalia, porém, que a estatal já esteve diante de defasagens maiores sem alterar os preços nas refinarias, o que pode indicar que a companhia siga segurando reajustes a curto prazo. “A empresa [Petrobras] pode buscar a estabilidade e só subir [os preços] quando houver uma defasagem maior”, diz.


Victor Arduin, gerente em gestão de riscos para energia e câmbio da Hedgepoint Global Markets, também aponta o câmbio como um dos responsáveis pelo aumento da defasagem e avalia que o cenário futuro não indica arrefecimento da moeda americana diante do quadro fiscal no mercado interno e das incertezas sobre os efeitos de eventuais políticas protecionistas do novo governo de Donald Trump, que toma posse dia 20.


Ele vê também preços mais fracos das commodities globalmente, inclusive do petróleo, o que levaria à menor entrada de dólares no país. Arduin também aponta fatores sazonais, como o inverno no Hemisfério Norte, que pressiona os preços externos dos derivados.


Adriano Pires, sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), avalia que o governo e a companhia tiveram “sorte” em 2024 diante do comportamento mais estável do câmbio e do Brent. Mas com a valorização do dólar, sobretudo em dezembro, a Petrobras deveria fazer reajustes, destaca: “Não é que a empresa esteja, hoje, perdendo dinheiro, mas poderia ter um lucro maior”, disse Pires. Para ele, além dos acionistas e da própria empresa, quem perde com a prática atual de preços da estatal são os importadores, que não conseguem competir com a estatal.


A Federação Única dos Petroleiros (FUP) observou que os preços nas refinarias fecharam 2024 com queda de mais de 20% em comparação com o último dia de 2022, quando ainda era vigente o PPI.


A Petrobras reafirmou, em nota, que, desde maio de 2023, adota estratégia comercial que considera as melhores condições de produção e logística na precificação de diesel e gasolina na venda para as distribuidoras. Segundo a empresa, a estratégia contribuiu para o alcance de resultados operacionais e financeiros no terceiro trimestre, como a geração operacional de caixa de R$ 62,7 bilhões, fluxo de caixa livre de R$ 38 bilhões e lucro líquido de R$ 32,9 bilhões, entre outros indicadores.


“Essa estratégia permite à empresa mitigar a volatilidade do mercado internacional e da taxa de câmbio, proporcionando períodos de estabilidade de preços para os seus clientes, assim como contribui para uma melhor competitividade dos seus produtos frente às principais alternativas de suprimento, considerando a participação no mercado que permita a otimização dos seus ativos e a rentabilidade de maneira sustentável”, disse a Petrobras.


 


Projeções apontam Ibovespa aos 142 mil pontos no fim de 2025, uma alta de 18% no ano / Perspectiva representa alta modesta para um investimento de risco como ações- Valor 4/1


Bruna Furlani / Maria Fernanda Salinet


O descompasso entre o resultado entregue pelas empresas do Ibovespa e o preço mais descontado dos papéis deve persistir em 2025, diante de um ambiente local difícil, na avaliação de especialistas. A razão é que a piora da percepção de risco fiscal nas últimas semanas, somada à contratação de ao menos duas altas de 1 ponto percentual da Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central até março deste ano, devem afastar o fluxo de investidores para a renda variável no curto prazo.


Entre as projeções de 17 bancos e corretoras compiladas pelo Valor, a mais otimista prevê um preço-alvo de 153 mil pontos para o índice em dezembro deste ano, enquanto a mais pessimista aposta em um patamar de 129.900 pontos.


No fim de 2025, a média das projeções de 17 instituições financeiras estima que o índice chegue a 142.182 pontos, o que representaria uma valorização de 18,21% em relação ao fechamento do ano passado, de 120.283 pontos. Já a mediana das estimativas está em 143.200 pontos. Ambas representam uma perspectiva de alta modesta para um investimento de risco como ações, considerando que a Selic, que baliza o CDI, deverá atingir 14,25% em março.


É possível, porém, que as casas alterem suas projeções ao longo do ano, à medida em que forem realizadas revisões nos lucros das companhias, diante de uma Selic muito maior do que o esperado e de uma expectativa de crescimento menor da atividade econômica.


Responsável por uma das projeções que mais se aproximaram do cenário atual, a RB Investimentos manteve a estimativa de 135 mil pontos para este ano devido à preocupação com a política monetária, que deve pressionar os lucros das empresas e aumentar o tamanho das dívidas corporativas, afirma o estrategista da casa, Gustavo Cruz. O profissional pontua que companhias relacionadas ao varejo podem ser especialmente prejudicadas.


“O sentimento agora é que, se continuar nessa toada, as expectativas de inflação vão seguir desancorando e o câmbio em disparada, o que vai exigir juros mais altos. Como o investidor local tem tendência a investir em renda fixa, isso aumentaria ainda mais agora”, destaca Cruz.


O profissional da RB lembra que a percepção do fim de 2023, quando houve um rali no Ibovespa, era de que o governo não deixaria “a peteca cair” no quesito fiscal. “Tudo bem, não geraria o melhor dos resultados, se cumprisse o mínimo, mas nem isso vai acontecer”, afirma, em referência à desidratação do pacote fiscal promulgado no Congresso no final do ano.


“O mais interessante é que não foi um ano ruim para as empresas, que performaram bem e superaram as expectativas com bons resultados”, diz. “Mas a bolsa precifica o que vem à frente, e a preocupação é com o desarranjo das contas do Brasil. É quase como ver o BC forçar a classe política a fazer o ajuste fiscal, caso contrário, os juros podem chegar perto dos 20%”, acrescenta o estrategista da RB.


Outra casa que também está com uma visão mais conservadora para o Ibovespa é o J.P. Morgan. Em relatório, a equipe do banco estima que o índice alcance os 135 mil pontos no fim deste ano.


“A situação fiscal provavelmente continuará a afetar o sentimento e os preços. Mesmo que a gestão fiscal melhore, permanece o receio de que o governo possa ‘abrir os cofres’ antes das eleições de outubro de 2026”, afirmaram os especialistas do banco. “O prêmio de risco refletirá isso e poderá ser um impeditivo para que os preços das ações sejam reavaliados”, completaram.


Já a equipe do Santander preveem um preço-alvo para o Ibovespa maior, de 145 mil pontos. Segundo os especialistas da casa, a projeção leva em conta uma taxa de crescimento nos lucros das empresas de 10% em 2025.


Os analistas do Santander, porém, avaliam, em relatório, que há um risco de que o crescimento do lucro por ação das empresas seja menor devido ao aumento da Selic. Em uma tentativa de “estressar os cenários” considerando uma taxa de juros entre 14% e 16,5% neste ano, o que seria o pior cenário-base da casa, o impacto no lucro das companhias do Ibovespa ficaria entre - 0,2% e -1,1%, o que seria irrisório, na visão do banco.


Alguns setores específicos, no entanto, poderiam ser mais afetados — caso de educação, saúde, varejo e transporte — com um impacto no lucro em 2025 que poderia variar entre - 0,3% e - 33,7%. O setor de educação, por exemplo, seria o mais prejudicado, com um efeito negativo no lucro entre 21,3% (considerando uma Selic de 14%) e 33,7% (colocando como base uma taxa de 16,5%).


A preocupação de que os juros mais altos podem desacelerar a atividade econômica e provocar um impacto negativo nos lucros das empresas também é compartilhada pelo BTG Pactual. A equipe de pesquisa do banco projeta que os lucros consolidados de 2025, com exceção de Petrobras e Vale, serão 2,7% menores do que o previsto há seis meses, ou seja, antes da autoridade monetária adotar uma postura ultraconservadora.


A projeção anterior era que os lucros das empresas domésticas subiriam 1,2% e das exportadoras de commodities recuariam 5,3%. Agora, excluindo WEG e companhias de processadores de alimentos, a previsão de lucros das empresas domésticas caiu 0,8% para 2025.


Entre os setores que registraram maior diminuição nas projeções de ganhos desde junho deste ano estão energia (redução de R$ 6,5 bilhões ou 29%); mineração e materiais (R$ 2,8 bilhões ou 22%) e varejo (R$ 2,4 bilhões ou 16%). Por outro lado, a equipe de análise liderada por Caio Sequeira aponta que os principais motores de alta no período foram alimentos (aumento de R$ 3,7 bilhões ou 41%) e bens de capital (R$ 2,6 bilhões ou 25%).


Embora a alavancagem média das empresas na bolsa esteja relativamente baixa, com o múltiplo de dívida líquida sobre Ebitda em 1,8 vezes, 48% da dívida das empresas domésticas está vinculada à Selic, contra 18% das exportadoras de commodities, diz o BTG. Assim, as empresas mais pressionadas por uma Selic elevada seriam varejistas de alimentos, companhias de eletrônicos e eletrodomésticos, e locadoras de veículos, além de algumas empresas do setor imobiliário, principalmente construtoras de imóveis de alto padrão.


Depois de estimar um patamar próximo do fechamento do ano passado para o Ibovespa, o Inter espera um preço-alvo de 143.200 pontos para o índice em 2025. O especialista em renda variável do Inter, Matheus Amaral, explica que a “pedra fundamental” para a bolsa tem sido o resultado das empresas, que superou as últimas expectativas ao longo do ano passado.


Eventuais revisões, no entanto, não podem ser descartadas após o resultado do quarto trimestre de 2024 e do primeiro trimestre de 2025, segundo Amaral. Em um cenário marcado por pressões inflacionárias maiores, juros elevados e câmbio depreciado, as ações de setores mais resilientes — como seguradoras, concessionárias públicas e exportadoras — são os preferidos do Inter para este ano.


Companhias com grande capacidade de repassar preços em um ambiente mais inflacionário também são citadas com destaque pelos analistas do Santander. Nomes como RaiaDrogasil, Lojas Renner, Iguatemi, Multiplan, Cyrela e Ambev podem se beneficiar ao apresentar produtos diferenciados, competição limitada de mercado, marca e reputação fortes, além de uma demanda inelástica de mercado.


Além de eventuais revisões no lucro das companhias, a bolsa local terá o desafio adicional de voltar a atrair fluxos positivos e significativos de estrangeiros. Na visão do estrategista da RB, o início do ano será balizado pelas medidas que serão implementadas pelo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.


Caso ele cumpra as promessas de campanha de taxar as importações de diversos países, incluindo o Brasil, isso pode determinar o humor do mercado. Para Cruz, o protecionismo de Trump pode fazer com que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) pause os cortes de juros, o que pode ser mais um entrave para o fluxo de investimentos retornar a países emergentes, como o Brasil.


“A bolsa não tem força nem durante os momentos em que há ventos favoráveis do exterior. Se o cenário externo ficar de ‘mau humor’, haverá menos interesse ainda do estrangeiro. Parece que não vamos ter um 2025 bom”, avalia o estrategista da RB.


Para analistas do Itáu Unibanco, o Brasil saiu do radar do capital externo e pode demorar para voltar a ganhar relevância nos portfólios internacionais, caso não trate da questão fiscal com seriedade. Não à toa, a casa cortou recentemente a exposição em bolsa local nas suas carteiras recomendadas para o menor nível em oito anos.


“É a primeira vez desde 2018 que o estrangeiro não vai investir em Brasil. Eu não consigo ver um mês, e precisa ter visibilidade para investir, para os estrangeiros voltarem. O país precisa controlar a inflação e o juro cair”, afirmou Nicholas McCarthy, diretor de estratégia de investimentos do Itaú Unibanco, em encontro com jornalistas em dezembro do ano passado.

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