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William Waack

 Quando a única saída é o marketing, não existe mais saída


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Crise autoinfligida

William Waack


O Estado de S. Paulo.

23 de jan. de 2025


Desde sempre historiadores tentaram resumir em poucas palavras o fenômeno de decisões políticas (e/ou militares) que levaram a grandes desastres, embora claramente previsíveis. Duas obras de enorme sucesso foram “A Marcha da Insensatez”, de Barbara Tuchman (de Troia ao Vietnã), e “Os Sonâmbulos”, de Christopher Clark (como a Europa “tropeçou” para dentro da Primeira Guerra Mundial).


Não há nada de sonâmbulo na marcha de Lula 3 no caminho da insensatez fiscal, que arrisca provocar uma crise política justamente quando seria menos desejável – isto é, num cenário eleitoral. Ao contrário, o presidente não transmite em privado ou em público qualquer sinal de que entenda a questão fiscal como insustentável.


A principal assessoria econômica do Ministério da Fazenda produz avaliações do seguinte teor: “nós estamos no caminho certo da consolidação, uma consolidação fiscal feita com baixíssimo desemprego, crescimento econômico, distribuição de renda e combate à pobreza. Sempre foi nosso objetivo: conduzir uma política econômica capaz de consolidar as contas públicas ao mesmo tempo que promove o crescimento e a distribuição de renda”.


É prosseguindo nessa trilha que o governo bateu um recorde histórico na terça-feira, quando passou a pagar IPCA + 7,94% para remunerar papéis de dívida de curto prazo. Com números dessa ordem, não espanta que agentes de mercado (sim, esses vilões) considerem que a atual situação política impeça Lula de adotar medidas capazes sequer de estabilizar a dívida pública, quanto mais reverter sua trajetória de crescimento.


Por “situação política” leia-se a cabeça de Lula e o que faz do “Zeitgeist” (espírito de uma época) ou “vibe” ou como se queira chamar o momento político e sua direção. A combinação de descrédito quanto às políticas do governo e o enorme tsunami representado por Trump (do comércio à geopolítica, passando pela guerra cultural) é componente bastante visível de uma realidade política extraordinariamente difícil e desafiadora para qualquer governante.


Realidade tornada ainda mais grave quando tudo é visto sob a perspectiva do marketing, uma ferramenta política capaz de produzir resultados apenas localizados, e da qual agora tudo se espera. Nesse sentido, Lula piorou a tarefa de seu chefe de propaganda política. O que tem a oferecer é mais do mesmo (gasto é vida) e promessas pontuais de “intervenção” para mitigar inflação de preços de alimentos, e seu devastador efeito na popularidade de qualquer governo.


Miopia também é uma boa palavra para se descrever como um dirigente político fabrica uma crise para si mesmo. É o que Lula está fazendo agora. •

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